Emancipação

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Mesmo com as taças quase vazias, o cheiro inebriante de café ainda domina o local, Carden disse que o bar fica em um dos cômados do andar inferior, mas o ignorei da maneira mais óbvia possível, não queria ir embora tão cedo.

- O que te trouxe a Oxford?

- Sendo sincera?- ele concorda com um aceno de cabeça. - Emancipação, ou pelo menos o mais perto que possa chegar disso, tanto emocional quanto parental e financeira. - tomo o restante da bebida e encaro o breu que já preenchia a superfície do céu. - Eu meio que estou buscando algo que não sei o que é. - rio sozinha, de certa forma é engraçado.

- Inspirador. - ergue a taça em um brinde invisível.

- É deprimente. - retruco. E realmente é, admitir desejos internos a um desconhecido é totalmente vergonhoso e perigoso, o que um pouco de álcool não e é capaz de fazer? - Falando em depressiasão... - me aproximo e estendo a taça para mais uma rodada. - Por que "professor"?

- Como assim?- me olha em dúvida.

- Por que escolheu dar aulas, pelo que vejo poderia ser e ter qualquer coisa que quisesse. - indico a tudo em volta.

- Como você sabe, sou excelente no que faço, trabalho em umas das mais renomadas universidades do Reino Unido, o que me garante um salário nada mal, não vejo nada depressiativo nisso. - ele sorri para mim com orgulho, procuro em seus olhos algum sinal de que esteja fingindo, mas encontro apenas sinceridade.

- Sua família tem um vinhedo, você é um profissional de destaque em qualquer cargo que decida ocupar, ou se quiser só se aposentar e sei lá viajar pelo mundo isso não seria problema, eu que nem te conheço sei disso, todos sabem. Mesmo que Oxford seja incrível e um sonho para qualquer um, sei que repetir a mesma matéria todos os anos e aguentar jovens bancados pelo dinheiro do papai não é algo agradável para muito dos mestres, e creio que o prazer em humilhar alunos de vez enquando seja um esporte divertido mas não o que te faz permanecer.

Provoco nele uma risada gostosa, parece que realmente me acha um pouco engraçada.

- Minha queria Darcy... - meu estômago esfria com essas palavras. - Você realmente acha que isso é verdade? - me olha nos olhos, e sinto que esses pequenos momentos estão causando em mim uma forte tensão

- É o que vejo. - respondo simplesmente.

- Mas não é o que eu vejo. Já conheci muitos que odiavam estar em uma sala, mas também outros que eram apaixonados por isso, reclamamos, xingamos aluno por diversão - Sorrio com a referência. - Mas amamos o que fazemos, e por isso estou em Oxford.

- Bom, isso é inspirador. - ele agradece com o olhar. - Se for verdade claro. - completo.

- Voltando ao foco. Porque não podia ser livre onde estava?

- Então o foco sou eu? - pergunto em tom malicioso.

Ele não nega, apenas me retribui o mesmo olhar.

- Vamos, responda. - insiste.

- Sinto que é meio vergonhoso dizer isso para você, mas... a liberdade se encontra nos lugares mais longes possíveis de meus pais. - o olho esperando que rie de mim.

- Não possui uma boa relação com eles? - continua sério, me surpreendo por não me tratar como fútil.

- Cidade pequena, pais rígidos, sabe como é né? - ele continua me encarando. - Não sabe. - concluo.

- Desculpa não. - ele ri finalmente. - Mas seus pais são tão ruins assim?

- Não, claro que não. Não são monstros, bom pelo menos não para mim. Eles me magoaram muito, e eu os magoou só pelo simples fato de ser eu. A gente não se entende tão bem sempre, mas eu sempre evitei ao máximo conflitos, mas cansei de tudo e essa é a minha oportunidade de fazer o que realmente quero agora. - Porque estou contando isso para ele??

Paira um silêncio, antes que Carden diga qualquer coisa pego a garrafa de sua mão.

- Não, não, não... - ele tenta me impedir de virar a garrafa inteira em meu estômago, mas me afasto e o ignoro.

A bebida depois do terceiro gole, passa a queimar minha garganta, mas não paro até acabar com tudo o que resta no recipiente. Termino com a expressão contorcida pela ardência causada e lhe entrego a garrafa vazia.

- Você acabou de virar uma garrafa de um dos melhores vinhos do Estado em menos de 3 minutos. - diz abismado.

- Era metade de uma garrafa. - minha voz falha durante a frase.

- Entendi porque teus pais te controlavam tanto.

Me aproximo já meio exaltada por conta da bebida, estou face a face com Cardan, não consigo evitar olhar para seus lábios, sinto em sua respiração um leve odor cítrico e com delicado toque de café, ele também encara intensamente a minha boca, ainda que todo meu corpo comece a deseja-lo profundamente naquele momento, consigo desviar meu olhar para o seu.

- Talvez eu seja assim por que me controlaram. - me viro e entro no escritório. Preciso por minha mente no lugar.

Coffee-Scented WineOnde histórias criam vida. Descubra agora