Uma festa que acabou na despensa.

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Acho que eram cinco horas da manhã quando escutei minha mãe levantar no andar de cima. Virei de lado e peguei meu celular para conferir as notificações: nada. Bloqueiei a tela e voltei a escutar os passos dela enquanto se arrumava. Eu me perguntava como ela conseguia manter essa rotina tão desgastante, porque eram apenas 6 horas diárias de sono, todas seguidas de uma ressaca que durava ao longo das próximas 8 horas de trabalho, para então ela finalmente chegar em casa no final da tarde e garantir a ressaca do próximo dia. Para mim era incompreensível uma pessoa nesse estado tentar cuidar de outra com depressão, nós duas não tínhamos direito nenhum de exigir algo uma da outra. Mas, na cabecinha dela funcionava, na cabecinha dela estava tudo bem porque ela estava cuidando de mim. Eram essas coisas que me deixavam frustrada, ela fingia que tudo estava bem enquanto o caos acontecia ao seu redor e ela nunca fazia nada para impedi-lo. No fim das contas eu quem tinha que cuidar de tudo.

Assim que escutei a porta da frente bater anunciado a sua saída, eu me sentei na cama e fiz o planejamento do meu dia. Primeiramente eu pensei que café da manhã e música clássica ajudariam no meu humor, então foi isso que fiz. Me levantei e fui até o banheiro escovar meus dentes e em seguida desci as escadas até a cozinha a fim de verificar a despensa. Me peguei pensando naquele diálogo, no meu nome estampado naquela página. "Meu nome é Bruna". Não poderia ser coincidência. Na carta, F dizia que eu iria descobrir a verdade. Talvez essa fosse a minha história, alguém queria me contar o que aconteceu. Assim que passei pelo arco da cozinha, o gato da minha mãe  virou-se em atenção. Ele jazia sob a mesa de jantar ficou me encarando pelo o que parecia horas, ou anos, me julgando, como se tivesse algo errado comigo. Era sinistro. Procurei ignorá-lo, e segui com meu propósito inicial. A dispensa se apresentou desanimadora, então tomei uma nota mental para pedir algumas coisas na próxima compra. Peguei dois ovos na bancada de mármore e um pacote de farinha de trigo. Com leite e açúcar eu faria panquecas. Eu sempre acreditei que um dia não começa direito enquanto não tiver um bom café da manhã. Em seguida coloquei La Stravaganza de Vivaldi para tocar e peguei o livro da caixa para ler, pois já não me aguentava de curiosidade.

Capítulo 02 do livro

Algumas semanas se passaram desde a nossa última apresentação e infelizmente não conseguimos mais nenhum tipo de trabalho depois disso. A suposta competição na escola que nos ajudaria com a publicidade, também não teve novas atualizações. Mas eu passei os últimos dias investindo em composição e escrevendo novos acordes para a banda. Nesse meio tempo resolvi passar um tempo na casa de Ingrid, pois fazia muito tempo que não fazíamos isso e eu sentia sua falta. Estávamos no quarto dela pensando em ideias de roupas para a festa que pretendíamos ir mais tarde. O local estava mais bagunçado do que de costume, com diversas peças de roupas espalhadas por todos os lados, cosméticos e maquiagem jogados nas camas, e sapatos que nos faziam tropeçar a cada segundo. Ingrid estava com seus cabelos loiros presos naquele típico penteado da princesa Leia em Star Wars e um delineado de gatinho rosa nos olhos que a deixava parecendo delicada.

— O que acha desse? — ela perguntou erguendo um vestido preto de pérolas brilhantes com mangas até os cotovelos e um detalhe em V no decote. Era bonito, mas não para a ocasião. Fiz cara feia e ela o jogou em uma pilha de roupas ao lado da cama que tomava proporções cada vez maiores.

— Estava pensando em usar prateado — eu disse ao lembrar de ter visto um conjunto em uma loja três dias atrás de promoção.

— É uma das minhas cores favoritas do momento, estou tendo ótimas inspirações em visuais cyberpunk, até decidi sair com um gamer semana passada.

— O que tem a ver e como isso vai te ajudar? — questionei realmente curiosa.

— Bom você sabe, eles entendem disso, é coisa de nerd.

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⏰ Última atualização: Dec 05, 2022 ⏰

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