CAPÍTULO 34

275 46 15
                                    

Honor dormia quando Livie se levantou da cama. Ela foi até o quarto onde seus filhotes dormiam e ficou a porta. Honest também estava ali, ele dormia de roupa mesmo, talvez por causa dela, talvez por ter chegado tão cansado que não tirou as roupas para dormir. O quarto tinha três camas, Livie entendeu que os trigêmeos estavam dormindo ali. Lily dormia numa cama, Sheer dormia com Proud, o bebê agarrado nos cabelos dele, em outra.
"Sem sono?" Nove disse atrás dela, Livie se virou. Ele estendeu um copo de leite, ela aceitou.
"Você não dorme?" Livie sabia, mas perguntou.
"As vezes eu me deito e fecho os olhos, mas, não, eu não durmo. Sempre tive inveja de Seis. Ainda que achasse que dormir como ele dorme o deixasse vulnerável, eu queria muito dormir."
"Não o deixa o vulnerável, Sheer disse que já deram um tiro nele, ele não acordou." Ele ergueu as sobrancelhas.
"Fizeram mesmo isso?" Ele fechou a cara.
Livie riu.
"Sim. E se reclamar com alguém vão chamar você de frouxo. O próprio Silent vai fazer isso." Ele sorriu.
"Eu matei dois enfermeiros que cuidavam de nós, Seis ficou em pânico. Ele se afastou de mim, ele não falava direito e não entendia como as coisas funcionavam na instalação que vivíamos." Livie e Nove foram para a cozinha, ele ligou o fogão, ela se sentou.
"Ainda não limpei os coelhos, mas há carne de gato selvagem aqui, você gosta?" Livie sentiu uma grande vontade de comer carne de coelho.
"Demora muito para limpar?" Ela perguntou, ele riu.
"Espere aqui." Livie se recostou na cadeira. Lily estava de volta. Tudo estava bem. Os seus bebês estavam bem, e o plano era ficar com seus filhotes longe de Honor. Mas...
Ela não conseguiria. Havia algo nela, algo que no desespero por não saber onde Lily estava, despontou em sua mente, em sua alma: sua necessidade de Honor. Eles ficaram num estado de puro medo e terror nos dias em que Lily sumiu e isso deu a Livie a certeza de que Honor era sua fortaleza. Honor era o lugar onde sua alma habitava em paz, calma e feliz.
"Oi, mamãe." Lily apareceu na cozinha, Livie abriu os braços para ela.
"Vovó acaba de acordar. Ela vai ficar bem, todos nós vamos ficar bem." Livie aumentou a força com que abraçava Lily.
"Você foi tão corajosa! Mas devia ter contado. Não faça mais isso, Gatinha!" Lily assentiu. Ela puxou uma cadeira para perto da cadeira de Livie e se sentou. Livie a abraçou.
"Você está grande, está se tornando uma mocinha. Estou orgulhosa da fêmea que você é." Livie disse.
"Eu vou crescer agora, mamãe. Não há mais motivo para ser uma filhotinha. Tudo o que eu vi se concretizou, algumas coisas igualzinho eu vi, outras bem diferentes, mas ainda assim os resultados foram os mesmos. Eu vou crescer." Ela disse. Livie não entendeu, mas a abraçou.
"Às vezes eu acho que eu não cresci. Que eu continuo aquela menina que entrou nesse lugar correndo e mordeu a orelha do seu tio." Lily riu.
"O tempo é superestimado, mamãe. Veja o vovô e todos da geração dele que ficaram presos. Eles não sabiam quanto tempo havia se passado até serem libertos. Não havia noite ou dia lá. E eles ficaram lá. Sem interações familiares, sem estarem em comunidade, vivendo dias, meses e anos sem perceber. Acho que nós todos temos de viver e só." Livie beijou o topo da cabeça dela. O jeito que ela falou, sua postura e os olhos dela estavam diferentes.
"Quando você diz crescer, está dizendo que vai abandonar todo o seu jeitinho infantil? Por que a melhor época na vida de qualquer um é a infância, querida. Não pule essa etapa." Livie disse, Lily afastou sua cadeira e a encarou.
"Isso é uma coisa humana, mamãe. Humanos tem um desenvolvimento mais lento e o momento desse desenvolvimento acontece na infância e precisa de carinho, amor e cuidado para que esse desenvolvimento seja satisfatório. Mas nós somos diferentes. Principalmente nós da segunda e terceira geração. Nosso desenvolvimento físico e mental é muito rápido. E esse tem sido o erro dos pais aqui. Achar que somos como humanos e que um macho de dez anos não pode acasalar, por exemplo." Livie ficou séria.
"Lily, você não vai acasalar com Sunny agora." Ela sorriu.
"Não será agora, mas não será com Dezesseis anos, será antes." Livie ia contestá-la, mas ela viu a determinação e a certeza nos olhos de sua filhote. Havia até uma certa dureza neles.
Livie suspirou.
"Mas e o fato de que Nove tem noventa anos? Você não acha que já que vamos viver mais tempo que os humanos, deveríamos acasalar só bem mais velhos, com pelo menos uns trinta ou quarenta anos?" Livie perguntou, tentando mostrar que essa antecipação da maioridade parecia errada para ela, Livie.
"Você vai completar vinte e cinco anos e já está acasalada, já tem quatro filhotes até." Lily retrucou, Livie riu.
" Eu e honor ainda não acasalamos." Livie disse, Lily a encarou.
"Vai ser o acasalamento mais lindo de todos os tempos!" Ela abriu um lindo sorriso. Livie passou na mão na barriga.
"Quatro filhotes!" Livie disse. E era até pouco se fosse considerar o tanto de filhos que Vengeance e Valiant tinham.
"E dois de um pai e dois de outro. E os pais são irmãos!" Lily completou e Livie riu.
"Mas eu não desejo isso para ninguém. Honor ainda tem muito receio de Pride. E isso é ruim. Muito ruim. Ele sempre se sentiu meio deslocado, e eu sempre achei que dentre todos os seus irmãos, Pride era o mais próximo. Eles dividiram o mesmo quarto." Lily balançou a cabeça.
"Na verdade, o mais deslocado sempre foi o papai. A sede de sangue o afastou muito de sua família. Tio Honor sempre teve a vovó, tio Noble sempre teve o vovô. Os gêmeos, as florzinhas e os leãozinhos sempre se bastaram." Livie viu que sempre teve uma visão errada sobre Pride.
"Pobre Pride." Lily acenou.
"Tio Sim ama muito o papai e é muito amigo dele, mas o tio Sim sempre teve a mão cheia com o tio Cam e o tio Hon." Livie bufou.
"Ele não se cansa de estar metido em tudo?" Lily riu.
"É o modo como ele lida com a sua cabeçona, como diz o tio Cam." As duas riram.
"Que bom que estão rindo. Eu limpei os coelhos, mas me dei conta de que o tempero delicioso da última vez foi feito por Harry. Eu só coloquei sal." Nove apareceu com uma vasilha, Livie salivou.
"Não importa, cozinhe logo isso!" Nove olhou para Livie e riu.
"Sim, senhora."
"Eu não sou felino, mas estou gostando muito de morar aqui no alto. E por isso, bom, vocês já vão se mudar? Eu preciso arrumar um lugar para mim." O cheiro de carne encheu a cozinha, Livie não prestou muito atenção a pergunta dele, mas Lily sim.
"O gatinho tímido não vai se importar se você morar aqui com a gente. Você é padrinho de Pólux." Ele se virou e encarou Livie.
Livie abriu a boca, mas ela não sabia o que dizer, então fechou de novo.
"A casa é de Honor, tem de perguntar a ele." Era o mais fácil de se dizer.
"Você pode construir um quarto no sótão. Papai projeta e você constrói. Mas tem de ficar no time do vovô quando eles jogarem." Ele baixou os olhos. Um silêncio tomou conta da cozinha, a carne ficou pronta, Nove serviu. Livie aproveitou para encher a boca de carne e não ter de falar nada.
"Quando você diz vovô..." Ele perguntou, Lily sorriu.
"Vovô é o meu avô Valiant, pai dos meus dois pais. Meu outro avô é o meu avô Vengeance. E agora vou poder chamar o tio Dus de vovô também. Ele será o vovô rabugento." Ela encheu a boca de carne, seu rosto estava muito feliz, seus olhinhos brilhavam.
"Carne de coelho? E de gato selvagem? Tem alguma carne de algum animal que não seja fofinho, por favor?" Honest entrou na cozinha.
"Eu tentei seguir o rastro de um alce, nas me disseram que é muito difícil achar um no inverno." Nove disse.
Honest o olhou, direto, entendendo algo nas palavras dele, que Livie não entendeu.
"Nossa! Está muito bom." Ele começou a comer.
"Sabe, sem querer diminuir seu esforço, Nove, mas os de Harry estavam mais gostosos." Livie disse.
"Mais gostoso que isso?" Honest perguntou.
"Só tem sal aí." Nove disse, modesto.
Honor começou a roncar no quarto, Nove apertou um ouvido, Livie riu.
"Ele vai roncar até alguém o virar de barriga para baixo." Honest disse, todos olharam para Livie.
"Eu não tenho forças para virá-lo, vou acabar acordando ele. E o ronco dele é tão bonitinho!" Ela não queria era parar de comer.
"Eu me sacrifico pelos seus ouvidos, Nove." Honest disse, saiu da cozinha e logo voltou.
"Ele está mesmo cansado." Livie limpou a boca.
"Ele só vai acordar amanhã a noite. Que tal conversarmos mais um pouco?" Honest perguntou.
Nove passou a lavar as louças, Lily beijou Livie e estendeu os braços para Honest. Ele a pegou no colo a abraçando apertado e fechando os olhos. Livie o ouviu sussurrar que amava Lily no ouvido de sua filhote.
Lily saiu da cozinha, Nove acenou e também saiu.
"O que foi, Honest?" Ele suspirou.
"Não sou Honest." Ela o olhou e mergulhou nos olhos frios e distantes de Simple.

FILHOTES DE VALIANT - HONOROnde histórias criam vida. Descubra agora