Capitulo XIII - O Teste

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MINHA ÚLTIMA VIAGEM A CAIXA DE LEMBRANÇAS TEM UM DESTINO IMPORTANTE. Um momento onde a felicidade se lembrou de nós e decidiu passar para dar um oi. Logo num período em que a esperança estava prestes a ir embora.

Lembro que depois da notícia que recebemos sobre a dificuldade que enfrentaríamos para ter um filho, vi a fé de Yelena crescer, e ela depositou parte dela nas pequenas bulas de remédios que, junto comigo, se tornaram suas frequentes companheiras.  Foi longo o período de reposição hormonal, em que tivemos que lidar com os efeitos adversos que tiravam o  sono de Yelena, mudavam seu humor de feliz para muito triste e, volta e meia, traziam uma ansiedade que nunca existiu.

As vezes Yelena parecia até outra pessoa, mas... Em contra partida, foram dos efeitos desses mesmos hormônios que se sucederam as melhores noites de prazer que tivemos. Aquelas em que não só nos uníamos celebrando o amor, como fazíamos dos nossos corpos páginas de poemas em braille, e nos líamos na ponta dos dedos e na ponta dos lábios, respeitando todos os sinais de pontuação.

Lembro que passávamos o resto das noites nos questionando se tanto amor foi o suficiente para enfim concebermos a bênção que tanto esperávamos. E depois de oito anos tentando, enfim essa bênção chegou, em forma de duas linhas em um teste de farmácia, causando em Yelena um misto de emoções inexplicáveis:

A princípio ela gritou, eu corri preocupado para ver o que era e a encontrei sentada sobre o vaso sanitário, boquiaberta, olhando pro objecto em sua mão, incrédula. Ao perceber minha presença, se levantou eufórica, saltou pra o meu abraço e quando minhas mãos a acolheram sua alegria foi se transformando num chiado único que se estendeu por segundos, até que, por fim, o choro soou.

— Deu positivo, amor... — Ela sussurrou.— Finalmente deu positivo, olha.

Colocou o teste bem à frente dos meus olhos, com uma empolgação que se intensificou ao ver minha reação.

— É sério? — Questionei emocionado, com os olhos já pesando de emoção. Ela assentiu com um sorriso contido, lágrimas escorriam rosto a fora.

Nos abraçamos novamente, mas, mais do que uma comemoração, aquele abraço representou para nós o fim dos dias de sofrimento, dias em que vi Yelena no seu pior, pelos múltiplos fracassos que tivemos. Foram oito anos de tentativa, em que o resultado era sempre o mesmo. Dezenas de testes com uma linha jogados ao lixo, e com cada um deles, um pouquinho da minha esperança também.

Mas em contrapartida, Yelena jamais perdeu a esperança. Se abalava a cada fracasso, e no dia seguinte já aparecia renovada, disposta a mais uma tentativa. A regeneração de suas forças me remetia à época em que tentávamos fugir para o rio, ali onde tudo começou. Onde num dia recebíamos palmadas e prometíamos não mais  tentar fugir, e na manhã seguinte lá vinha  Yelena, correndo na minha direção, dizendo que tinha um novo plano, e que dessa vez daria certo.

No fim éramos pegos novamente, porém ela nunca desistiu.

Foi essa persistência característica que forçou as Cegonhas a marcarem uma data para nos visitarem, e trazerem ao nosso lar o pedacinho de vida que mudaria tudo. Um pequeno ser que logo se tornaria a razão da nossa existência, e entorno dele girariam todas as nossas decisões. Sua alegria seria a nossa alegria e suas dores nos machucariam mais ainda. Seus medos seriam nossas preocupações e suas conquistas nossa fonte de orgulho.

Sei que não sabíamos se estávamos prontos, mas quando vimos o positivo no teste um amor novo nasceu em nós, e para nós isso era o suficiente. Seguimos nos pendurando nesse amor até que quatro meses depois, ao descobrirmos o sexo do bebê, nos vimos diante do primeiro teste de "capacitação" que foi: Escolhermos juntos um nome para ela. Algo que até soava simples, mas foi um bicho de sete cabeças.

Até Que MorramosOnde histórias criam vida. Descubra agora