3- O quarto

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          Keyo acordou com a claridade entrando pela janela e iluminando o quarto empoeirado. O bichano estava deitado ao lado da cama, no chão, cochilando. Keyo sentiu a barriga doer: ele não comia a quase um dia. Mas, e agora? Iria comer oque? Ele estava prestes a levantar da cama quando ouviu um barulho de pessoas conversando, não na rua, mas sim em baixo dele. Nessa hora, keyo ficou imóvel. Até o bichano acordou e ficou atento.ele escutou com muita atenção as vozes:
   -....acha que vamos ter dinheiro suficiente está semana?- disse uma voz meiga e feminina.
   - Acho que sim - responde uma voz grave e masculina - você sabe que é difícil acontecer oque aconteceu ano passado, não sabe?
   - Sei... Mas está acontecendo com muitas lojas da região ultimamente.
   - Fique tranquila querida - confortou a voz masculina - logo irei arrumar o dinheiro. Agora... Eu preciso que vá lá em cima buscar o papel da escritura pra mim.
          Nessa hora, keyo ficou imóvel. "Lá em cima" significaria ir aonde ele e o bichano estavam. Ele desceu da cama o mais silenciosamente que pode, passando por cima do bichano e indo à portinha pela qual entrou. Keyo tentou empurrar a porta de todos os jeitos possíveis,mas em todos, fracassou. Ele olhou para a o outro lado do quarto, em direção as janelas. Bem no canto, colado junto a parede, tinha um alçapão. Em questão de segundos, o alçapão abriu com tudo, com a porta dele batendo no chão. E de lá saiu uma garota, a mais linda que ele já viu.
          Ela não tinha percebido a presença de keyo, apenas subiu, e seguiu para um móvel pequeno, paralelo ao alçapão. Ela abriu uma gaveta e ficou mechendo, procurando alguma coisa. De supetão, ela olha pro lado e seus olhos cruzaram instantâneamente com os de keyo. Os papéis que estavam em sua mão caem lentamente.
   - Não ...espere.- disse keyo se levantando com os olhos fixos na garota.
          Ela tinha os olhos verdes que nem grama, e seus cabelos eram pretos e ondulados, caindo delicadamente de sua cabeça até suas costas. Ela usava um vestido marrom, com detalhes brancos, que cobria seus peitos e ia até o pé.
   - Quem é... você?- ela perguntou olhado keyo com a confusão estampada em seu rosto.
          Ele ficou em pânico, e tentou novamente empurrar a porta, que continuava intacta.
   - Não é assim- ela riu - você tem que puxar, não empurrar.
   -C...claro.- disse keyo puxando a porta, a qual abriu como um passe de mágica.
   - Você....entrou por aí?- ela perguntou
   - Sim.
   -Você por acaso.... tem um lugar pra ir?
          Ele pensou por um instante, e depois respondeu:
   - Não.... Eu sou... refugiado- ele respondeu olhando pro chão.
   - Meu deus.... Como está vivo? Você sabe oque fazem com refugiados ilegais?
   - Sei- mentiu.
   - Eu sou Lilian- ela disse chegando mais perto dele e estendendo sua mão.
   - keyo - respondeu apertando a mão dela.
   - já comeu?
   - Não- respondeu ele envergonhado.
   - Fica aqui, vou pegar alguma coisa pra você.- ela se virou e desceu pelo alçapão.
          Keyo imaginou o pior: iam velo, chamar os soldados e ele ia ser levado e sabe-se lá oque fariam com ele. Mas hoje era seu dia de sorte. Um tempo depois ela subiu com um pão na mão:
   - Desculpe - ela disse lhe entregando o pão - é tudo que tenho.
   -tudo bem- respondeu ele dando uma enorme mordida no pão.
   - Que gatinho bonitinho. Qual o nome - ela perguntou se abaixando pra fazer carinho nele.
   - Felino- keyo respondeu a primeira coisa que veio à mente.
   - Você é bem criativo - ela riu - mas preciso ir agora, se não meu tio vai desconfiar.
Ela se levantou, pegou os papéis que estavam no chão e foi em direção ao alçapão. Antes de descer totalmente, ela disse:
   - Eu volto mais tarde.... Não sai daí.
   -Ok- ele responde já sentado na cama com Felino.
          Ela desceu e fechou o alçapão. Keyo pode ouvir algumas coisas que Lilian e seu tio estavam conversando, mas não parava de pensar o quão feio ele estava: seus cabelos, de loiro já estavam escuros de tanta sujeira. Sua pele clara estava escurecida de graxa e poeira. Seu macacão estava todo surrado e rasgado e seus sapatos também. Um deles não tinha nem sola.
          Ele se levantou e foi em direção a janela, e ficou um bom tempo olhando a rua lá em baixo, vendo as pessoas e carroças passarem. Quanto tempo demoraria pra sair desse buraco?
 

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