Ⅱ - Maori

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Ao pular da janela, a garota colidiu com os galhos da árvore logo abaixo, o impacto lhe causando arranhões e hematomas. Quando finalmente alcançou o chão, caiu de joelhos e mãos no solo, sentindo a dor se espalhar por seu corpo. Respirou fundo, lutando para segurar um grito, e levantou-se com esforço. Estava assustada, mas sabia que não podia perder tempo. Caminhou com cautela até encontrar uma cabine telefônica enferrujada e abandonada.

Ela discou o número que sua tia havia anotado no velho pedaço de papel, junto ao nome "Ervé". O telefone começou a chamar, e seu coração acelerou. No terceiro toque, uma voz masculina atendeu com impaciência e desconfiança.

— Como conseguiu esse número?

Ela engoliu em seco, tentando encontrar palavras.

— Ahn... Olá... Eu... — começou, com a voz trêmula.

— Quem está falando? — a voz do outro lado da linha soava inquieta.

— V-você não me conhece... Minha tia... disse para procurar você. Eu... — sua voz vacilou, as lágrimas ameaçando cair. — Não tenho para onde ir, senhor.

Fez-se um silêncio pesado.

— Você é... Ervé? — ela perguntou, quase implorando por uma resposta.

Ouviu o homem suspirar do outro lado da linha, claramente irritado, como alguém que preferia não ser encontrado. Mesmo assim, algo dentro dele não o deixou ignorá-la.

— Onde você está? Sabe dizer?

— Acho que estou na praça central... Não tenho certeza. Minha tia não me deixava sair muito.

— O que você vê ao redor?

Ela olhou em volta, procurando por algo familiar.

— Tem uma placa... Está desbotada, mas acho que diz "Restaurante Familiar Tanno".

— Me espere aí. Mas tente se manter escondida. Se algum Eleven aparecer, suba numa árvore.

A linha ficou muda. Ele havia desligado.

Ela, com sua ingenuidade e inocência, sentou-se em um banco de concreto, o frio penetrando por suas roupas rasgadas. Algumas pessoas passavam, lançando-lhe olhares desconfiados. Ela sabia que chamava atenção por estar com uma bandagem no olho esquerdo — que pegara na gaveta junto ao papel com o contato de Ervé — cobrindo sua estranha anomalia. No entanto, o que parecia atrair mais os olhares era a expressão frágil de alguém que não pertencia àquele mundo devastado.

Entre os transeuntes, uma menina magra a encarava de longe. Ela começou a se aproximar devagar, seus olhos fundos e cansados se destacando contra a pele suja e as roupas em trapos. Seus passos eram hesitantes, mas seus olhos não se desviavam dela. A garota parecia farejar o ar, como um animal que detecta algo no vento. Parou a poucos metros, observando-a como uma presa.

Então, fechou os olhos, respirou fundo mais uma vez e, sem dizer nada, começou a se afastar.

Foi nesse instante que algo perfurou o silêncio. Um tiro.

O som do disparo ecoou pela praça, e a garota fugitiva assistiu, paralisada, à menina à sua frente cair de joelhos, suas mãos pressionando a cabeça enquanto gritos de dor escapavam de seus lábios. O sangue jorrava de sua cabeça, escorrendo até o chão. A garota gritou, mas seus gritos logo cessaram, e ela caiu morta.

A garota assustada não conseguiu se mover. Sentia-se quebrada por dentro, incapaz de compreender o que acabara de acontecer. Seus olhos ficaram fixos no corpo imóvel, e ela lutou para entender o que aquela cena significava.

Um homem apareceu ao seu lado, surgindo como uma sombra que ela não havia notado até então. Ele guardou a arma no casaco de couro preto, sem sequer olhar para o corpo no chão. Seu porte era imponente: cabelos longos e desarrumados até os ombros, olhos escuros e um rosto que carregava um misto de frieza e cansaço. Vestia um casaco preto aberto, deixando à mostra uma camiseta de tecido fino e escuro, calças jeans desgastadas e coturnos robustos.

— Você... — ela começou a dizer, confusa e assustada.

— Sim, sou eu — ele disse com impaciência, seus olhos avaliando a garota rapidamente. — Vamos.

Ela ainda olhava para o corpo da menina morta, tentando compreender o que acabara de acontecer.

— Por que a matou? — a pergunta escapou de seus lábios antes que pudesse pensar.

O homem bufou, visivelmente irritado com a pergunta.

— Está brincando, não está? — sua voz soava sarcástica, mas ao olhar para ela, percebeu que a garota realmente não entendia o que estava acontecendo. — Ah... ela era uma Eleven. Sabe, aqueles monstros.

— Mas... ela não parecia um deles — ela disse, olhando para o corpo inerte. — Ela não ia me fazer mal.

— Tá de sacanagem? — ele revirou os olhos. — Ela estava farejando você. Não me viu porque estava concentrada no seu cheiro.

Ela balançou a cabeça, ainda negando.

— Eu senti... alguma coisa diferente quando ela chegou perto de mim.

"Essa Eleven era diferente, não morreu instantaneamente com o disparo... Será que eles estão evoluindo?" Ele se questionava com essa nova observação.

O homem a olhou com curiosidade e, por um momento, a pressa deu lugar à confusão.

— Sou Ervé, líder da minha organização — ele disse, sem mais rodeios. — Agora, me diga: quem é você?

— Você é o líder dos rebeldes? Foi por isso que minha tia mandou eu te procurar?

— Responda minhas perguntas. Qual o seu nome, de onde veio, e quem é a pessoa que me forneceu o contato?

A garota hesitou antes de responder.

— Minha tia é Leslie Xang. Ela cuida de mim desde sempre, mas... ela ficou para trás, na nossa casa. — Sua voz tremeu, lembranças confusas invadindo sua mente. — Alguns homens invadiram a nossa casa... chamavam minha tia por outro nome, Xiao Fang, acho. Uma garota entrou no meu quarto e disse que, se eu fosse com ela, não atiraria. Eu estava com tanto medo... — Lágrimas escorriam por seu rosto, e sua voz quase sumiu. — Minha tia disse para eu fugir e te procurar.

Ervé a observava atentamente. Conhecia bem Xiao Fang. Sabia que havia muito mais naquela história do que aquela garota entendia.

— Tudo bem — ele disse, com uma calma forçada. — Confio na Xiao. E ela sabe se cuidar. Você pode vir comigo. Haruna vai cuidar dos seus machucados e te dar roupas limpas.

— Obrigada, senhor — ela disse, fazendo uma reverência tímida, ao mesmo tempo porque sua tia usava um nome falso.

— Não me agradeça ainda. Tenho muitas perguntas, mas precisamos sair daqui.

Ervé ofereceu o braço para ela. Ela hesitou por um momento, mas logo aceitou. Eles começaram a caminhar rapidamente, e ela teve dificuldades para acompanhá-lo. O silêncio que os envolvia era quase sufocante.

De repente, Ervé a olhou de soslaio, quebrando o silêncio.

— Você ainda não me disse uma coisa.

— O quê?

— Seu nome. Você tem um nome, não tem?

Ela parou por um momento, seu olhar perdido no céu que começava a escurecer, o vento balançando seus cabelos negros.

— Meu nome é Maori.

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