Parte 1 - Um Sacrifício Involuntário

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"Lembrem-se: as primeiras impressões nem sempre estão corretas..."

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Havia guardas recrutadores nas ruas, observando todas as partes, e todos estavam com novas armas de fogo de aparência letal. Prontos para qualquer ataque ou qualquer tipo de resistência.
Em um beco pouco iluminado, uma mulher tentava aquecer uma criança no frio. Uma mãe que tentava a todo custo não deixar que a gripe levasse sua filha de 3 anos. A criança estava abraçada ao dorso de sua progenitora, as bochechas da menina estavam coradas, os cabelos negros e longos escorriam pelos ombros , quando um garoto apareceu. A princípio, aparentava ser um garoto normal, mas seu corpo era magro e suas vestes não passavam de trapos, seus olhos eram fundos e sem brilho algum - vazios. Seu rosto era pálido, seus lábios eram como um risco em seu rosto.

Cher ami? - a mãe perguntou - Está perdido?

O garoto não esboçava qualquer expressão. Silêncio.

O garoto permaneceu sem emitir qualquer som. Ele se movia lentamente, cada passo trazendo-o para mais perto. Quando ficou a poucos metros de distância, a mulher viu seus olhos mudarem. O que antes era vazio agora se transformava em algo sombrio. Fome. Ele farejou o ar como um animal, e um sorriso grotesco apareceu em seus lábios rachados.

A criança começou a chorar, pressentindo o perigo, e o garoto, ou o que restava dele, aproximou-se ainda mais.


― Huuh... Sinto o cheiro... Do seu sangue... - disse ele com uma voz rouca, as cordas vocais desgastadas pelo tempo.

Os olhos da mulher se encheram de lágrimas, mas ela sabia que o desespero não a salvaria.

― Será... - começou ele, em um tom calmo e paciente - ...que vocês são saborosas?

Aiuto! - a mulher gritou.

O garoto sorriu. Um sorriso largo e assustador.

Ayúdenme! - ela gritou novamente sem sucesso. Ninguém viria. Ninguém naquele lugar se importava.

Mostrando dentes, agora, afiados e brilhantes. Seus olhos escureceram-se e a íris ficou branca. Um Eleven. Rapidamente, a mulher empurrou a menina para trás de uma casamba de lixo. Virando-se para ele enquanto tirava de dentro do casaco velho uma faca que guardava consigo.
Com o instinto de protetor de uma mãe, engolindo seco todo seu medo, ela segurou a faca apontando na direção dele desafiando o mesmo para um combate.

Dio, ti prego, salvaci... - Ela sussurrou, pedindo proteção divina... - Você não vai se alimentar hoje!

E quando ela piscou, o garoto avançou sobre ela com velocidade animalesca, rosnando como um lobo, mas antes que pudesse alcançá-la, o som de um disparo ecoou pelo beco. Ele parou bruscamente, seus olhos refletindo a surpresa de uma dor repentina. Sangue escorria da parte de trás de sua cabeça, e ele desabou no chão aos pés da mulher. O sangue jorrava entre os fios de cabelo atrás de seu crânio. Ela olhou em volta e viu os recrutadores. Guardas sombrios, suas expressões eram de puro desprezo. Como se aquela mulher fosse um lixo não descartável. Eles não estavam lá para salvá-la, apenas para manter a ordem, ou o que restava dela. Um deles ergueu sua arma, indicando que ela deveria se aproximar. A menina, agora chorando em silêncio, correu para sua mãe e abraçou sua perna. Ela estava assustada e as lágrimas escorriam em suas bochechas em meio aos soluços.

A mulher permaneceu paralisada encarando os homens. Vestiam-se com uniformes militares. Ela então apalpou os cabelos da filha sem tirar os olhos deles.

― Venham conosco. Não tente fazer gracinhas, ou morreram aqui e agora.

Calmatevi, querida, eu vou te proteger. - ela disse. - Andiamo.

A mulher, sem escolha, segurou a mão da filha. Sentia que algo pior estava por vir, mas não podia mostrar seu medo. Não para sua filha.

Quando se aproximaram dos guardas, um deles ergueu o queixo da mulher com força, examinando seu rosto.

― Hum... Uma estrangeira e sua cria mestiça... - comentou com desdém.

Ela tentou falar, mas antes que pudesse dizer qualquer coisa, um tapa violento a fez cambalear. A dor pulsante em sua face não era nada comparada ao pavor que sentia por sua filha. Ela se manteve de pé, firme.

― Fique calada, bastarda! Você nem devia estar aqui! - ele esbravejou.

― Não seria mais fácil jogá-la para eles e levar somente a pirralha? - outro sugeriu.

― Vamos levá-las, mas primeiro... uma diversão - um dos guardas sugeriu, e seu sorriso macabro congelou o coração da mulher.

O líder ainda segurando seu queixo, analizando seu rosto fino. Ela permaneceu em silêncio desviando o olhar.

― Irá servir.

Eles a empurraram para o chão, enquanto um deles segurava sua filha. A menina gritava desesperada, mas os guardas não pareciam ouvir. Ao invés disso, o som da risada deles pairava. A mãe foi jogada de bruços, e o líder dos guardas começou a apalpar seu corpo de maneira nojenta, como se ela fosse apenas um objeto.

Maledetto... - ela sussurrou, tentando não perder o controle. - Luridi codardi...

O líder, irritado com suas palavras em outra língua, a puxou violentamente pelos cabelos e a arrastou para a rua, onde os Elevens perambulavam.

― Vaca! - seu desprezo por ela era evidente. Enquanto a arrastava, a ideia insana que seu companheiro dera mais cedo se acendeu na mente dele, como se tivesse se lembrado de algo.

Ela mal teve tempo de registrar o que estava acontecendo quando sentiu a faca atravessar suas costas. O sangue começou a escorrer, quente e viscoso, e seu corpo enfraqueceu enquanto era arrastada para a rua, onde alguns Elevens próximos retorciam as narinas como lobos sentindo o cheiro do sangue e começaram a se aproximar. Os guardas usaram a mulher como isca, distraindo os monstros enquanto carregavam sua filha para dentro da van, desaparecendo na noite. Ela, deixada para morrer, ouviu os rosnados dos Elevens se aproximando. Seu corpo mal respondia, mas em sua mente só havia um pensamento: sua filha. As criaturas começaram a cercá-la, e, em seus últimos momentos, a mãe sentiu a escuridão tomar conta, enquanto o sacrifício involuntário se cumpria.

A primeira mordida rasgou seu abdomen.

Funcionou.

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