As trovejadas despojadas por entre as nuvens cinzentas, aglomeradas no céu tempestuoso, pareciam mais fortes a medida que Dean forçava a entrada do edifício com um mastro de ferro, haja vista que a maçaneta quebrada pelo lado de dentro impedia o acesso mais fácil que tinham. O mais velho concentrou sua força nas pernas, atingindo o pé em cheio na madeira, abrindo a porta.
Ao entrarem, Ameer puxou a faca larga da cintura, mais parecida com uma adaga, entrelaçando em seus dedos, na perfeita altura para defender-se, enquanto a outra de suas mãos segurava a lanterna cedida pelo parceiro, que também continha uma, iluminando o local. Eram inúmeras portas por um corredor escuro que seguia longe.
Coçou as ventas ao sentir a poeira invadir e o cheiro de mofo investado no lugar subir, de forma que Ameer tossiu ao ver a luz da lanterna acompanhar a dança da poeira no ar.
— Pega isso. — Dean estendeu uma arma a Ameer. — Disse que meu pai te ensinou a atirar e essa sua faca de cortar pão não vai ajudar.
— Era do meu pai. "M.K." são suas iniciais e estão cravadas aqui. — Ela lhe dirigiu, recebendo um pedido de desculpas ligeiro. — Tudo bem, apenas prefiro continuar assim, com ela. Acha que o garoto ainda está vivo?
Dean olhou de relance para Ameer, que o encarava na busca de palavras para o seu próprio conforto, mas ela sentia-se melhor em saber que o rapaz não faria isso, apenas se sentisse que era uma possibilidade verdadeira de aparecer. A sinceridade de do Winchester era uma de suas belas virtudes, ao menos em grande parte dos momentos, boas ocasiões ou não.
— Eu não sei. — Respondeu.
Após alguns minutos, e de forma repentina, Dean não deu continuidade a sua caminhada. Ele a encarou fixamente, torcendo os lábios. Ela, que não se sentia intimidada, mas incomodada com os gestos, estatizou o andar junto do mesmo, esperando que de seus lábios saíssem algo proveitoso, e não coisas impróprias para o momento em que estavam.
— Eu posso te fazer uma pergunta? — O homem possuía face confusa.
— Não que já não esteja fazendo, mas pode fazer outra. — A mulher sorriu brevemente, logo desfazendo visto que parecia ser sério.
— Por que você parece estranha comigo? Não vejo fazer isso com o Sam.
— De que jeito estranho eu pareço agir com você, Dean? — Ela curvou as sobrancelhas. — Sam é o meu paciente, atenção é o mínimo que ele deve ter de mim agora.
— Você fica estranha quando eu estou muito perto, não é difícil perceber isso. Na vez da testa, um bom exemplo. Você parece me odiar em alguns momentos, mas não acho que queira fazer isso todo o tempo, doutora.
Ameer abaixou a cabeça, movimentando os cabelos soltos em negação. Ela sorria por entre os fios. Dean sabia o que estava fazendo, e ela sabia o que ele queria com isso. Ameer se dispôs a caminhar outra vez, olhando por entre os pequenos vidros nas portas, conferindo se não havia ninguém. Dean queria vê-la reagir da mesma forma que reagiu a fala da irmã no orfanato mais cedo.
— Eu sei o que está fazendo. — Ele a seguia, conferindo as portas a sua esquerda. — Se quer saber, eu estou atraída por você. Sua complexidade me fascina, torna seu corpo mais bonito a medida em que o vejo.
O loiro surpreendeu-se com as palavras desta. Não imaginou que facilitaria as coisas ao ponto de lhe dizer o que sentia. Esperava que pudesse provoca-lá e fazê-la o querer, como já sabia que queria desde que ele havia matado o metamorfo que a confundia.
— Está admitindo que gosta de mim?
— Gostar é uma palavra que teve o significado alterado há muito tempo, Dean. — Eles se achegavam ao fim do corredor, com o caminho aberto para os dois lados. — Se está pensando em algo romântico, pode esquecer. E não, não vamos fazer isso que está pensando apenas porque me atraí por você.
— Por que não? A atração é recíproca.
Ao sorriso de Dean estampar o próprio rosto de maneira em que estava claro suas segundas intenções, ouviram um grito torturoso. Parados por entre as duas escolhas de passagem que possuíam, os parceiros se entreolharam sem saber o que fazer. O grito fora ouvido uma vez mais, como se partes do corpo estivessem sendo dilaceradas, levando Ameer a tomar uma decisão por eles.
— Vamos nos separar. Se não acharmos nada, voltamos nesse mesmo ponto. — Dean passou a mão na cabeça por um instante. — Não temos tempo para discutir isso, anda!
Dean assente e se dispõe a correr, segurando pelas paredes, em sua podridão, abrindo portas seladas com chave, ou pelo sobrenatural, com a força das pernas em as chutar. Ameer fez o mesmo, com a diferença de que todos os locais estavam arreganhados para ela, como um convite que a mesma não soube recusar, isso se quisesse encontrar os pequenos desaparecidos antes do pior.
Quando o Winchester mais velho percebeu o truque feito pelo djinn para os separar como gaivotas tontas, era demasiado tarde. Ele deixou a lanterna das mãos cair enquanto voltava em tamanha velocidade, superando a que viera ao parar ali. Ameer entrou em uma das salas, avistando um corpo pendurado, tendo o rosto iluminado pelos trovões vindos da fresta da ventana no alto. A chuva caía.
— Ameer, saia daí, é uma cilada!
A morena se virou para a voz que a chamava em desespero. Ao ver Dean achegar-se a porta, a mesma fora fechada com brutalidade, revelando a figura que se escondia por detrás da mesma. Era uma mulher, de cabelos prateados e olhos cor de avelã. Ela se aproximava em passos lentos, mas não de Ameer, e sim do corpo que estava pendurado. Ameer empunhou a faca, apontando-a em ameaça. Não sabia identificar o rosto e nem saber se a terceira presença estava viva.
— Me disseram que você e seu amigo viriam. — A prateada lhe disse. — Não se preocupe com ele, tem alguém lá fora para que possam brincar, da mesma forma que vamos fazer aqui, mas será apenas eu e você.
— Quem te disse que estaríamos aqui? — Ao Ameer ditar, a mulher passou os dedos nos braços pendurados, passando a língua pelos mesmos. — Responda, criatura nojenta!
— Nojenta? Chama de nojento algo que fazemos para a nossa própria sobrevivência?
Ameer apertou mais a arma para sua defesa entre os dedos, movendo a cabeça para estralar o pescoço. Dean, do lado de fora do cômodo, incessantemente buscava por abrir, mas seus sons apartaram-se quando decidiu buscar por outros meios teus.
— Se tem algo que nós temos diversas maneiras de fazer é como sobreviver. Sempre se acha uma saída, e eu não acho que a única que vocês tenham seja se alimentando de crianças inocentes.
— Não se preocupe, não vamos estar nos alimentando apenas de órfãos quando pegarmos vocês, caçadores imundos.
Arabescos cobriram os membros da criatura mulher, que se atirou sobre Ameer, que desviou, fazendo com que a outra se apoiasse na parede atrás da morena. O rosto da djinn se virou enraivecido e Ameer avançou com a faca de prata, cortando a palma da mão desta quando avançou com as mãos abertas.
A criatura a estapeou no rosto, atirando-a para o outro lado da sala com um único movimento de seus pés descalços. Ameer cambaleou, mirando o corpo estendido, percebendo ser de Miles, o primeiro dos desaparecidos a ser reportado. O trovejo afora fez-se um clarão mais forte, quando Ameer se agachou pouco, mas a rapidez com que veio para cima dela fora avassaladora, tomando a morena pelo pescoço, levantando-a sob a parede suja de vermelho. A faca de Ameer estalou contra o chão e seus olhos reviraram enquanto os lábios manifestavam dor.
— Apesar de tudo, caçadora, lhe darei boa vida antes de morrer.
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A Cirurgiã da Morte (DW)
Fiksi PenggemarSam está doente. Ameer, uma médica conhecida pelo acaso, pode ajudar. Dean desgosta da ideia, mas fará o que puder para salvar a vida do irmão. Juntos, Ameer e Dean irão atrás da cura. As personalidades podem não se combinar, mas a cirurgiã da morte...