Capítulo 2: Memórias

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Elizabeth encarava a xícara de café que estava sob o balcão, com olhos perdidos, demonstrando que sua mente estava longe. O notebook da mulher estava aberto e um caderninho com anotações logo ao lado.

— Tia Liz? — Joui chamou a mulher assim que saiu de seu novo quarto — Eu já terminei de arrumar minhas coisas...

— Ah! Ótimo! — A mulher de cabelos pretos o encarou e abriu um pequeno sorriso. Joui se aproximou e sentou na banqueta ao lado da que a mulher estava sentada. Liz notou que a pontinha do nariz do garoto estava vermelha, assim como seus olhos, indicando que havia chorado, mas não comentou — Eu estou vendo aqui uma boa escola para te matricular! Essa escola é aqui perto, as referências em ensino parecem boas, a estrutura parece ideal... Acho que é a melhor opção. — Elizabeth falou e virou o notebook na direção do menino.

— Parece uma boa escola! Como posso te ajudar? — Joui falou olhando para a imagem da escola que parecia bonita e organizada.

— Joui, você não precisa ser útil o tempo todo — Elizabeth riu fraco — Você pode brincar ou fazer alguma coisa que crianças de sete anos fazem! Deixa essa parte chata comigo.

— Minha mãe sempre me ensinou a fazer as coisas, era para ficarmos juntos sem que meu pai... Achasse ruim — Joui falou envergonhado, se encolhendo um pouco.

— Por isso que você fez o café da manhã naquele dia? Você lembra dela?

— É. E eu queria poder mostrar que estou muito feliz por estar com você, tia Liz. Obrigado por me receber na sua casa.

— Não precisa me agradecer por isso, Joui... — Elizabeth sorriu carinhosa. — O que acha de irmos na escola e depois tomarmos um sorvete?

— Por mim tudo bem! — Joui sorriu animado. — Vou trocar de roupa!

Alguns minutos se passaram e Elizabeth e Joui estavam saindo de casa. Algumas caixas estavam no corredor comum e aquilo foi estranho aos olhos de Elizabeth.

— Eita, parece que vamos ter novos vizinhos, Joui! — A mulher comentou.

— Será que eles são legais? — Joui falou olhando uma das caixas que tinha algumas identificações — Coisas do... Krauser.

— Só espero que não sejam muito barulhentos — Liz deu de ombros — Vem, o elevador chegou!

Enquanto Elizabeth e Joui seguiam seu caminho, ali naquele apartamento caixas estavam sendo abertas por Thiago, que procurava os documentos dos filhos de maneira nervosa, porque realmente não conseguia se lembrar onde tinha colocado aqueles papéis tão importantes. Precisava matricular os filhos em uma escola e o mínimo era saber onde estavam as certidões de nascimento.

Se sentiu frustrado quando não encontrou nada, e apenas criou uma zona maior tendo agora várias caixas abertas e reviradas. Que tipo de pai perdia os documentos dos próprios filhos?

Não se deu por vencido, e sentiu uma ideia iluminar sua mente. Os documentos poderiam estar nas caixas dos meninos. Caminhou até o quarto que ambas crianças dividiam, e quando abriu a porta teve uma surpresa. Mais bagunça.

— Oi pai! — Arthur se aproximou do homem com três colares havaianos no pescoço.

César apenas encarou o mais velho com óculos escuros com um formato de olhos de alien, e usava uma capa roxa de cetim amarrada no pescoço.

— Eu achei que o combinado era que vocês iam arrumar as coisas, não bagunçar elas... — Thiago respirou fundo.

— Pai, a nossa bagunça é organizada. A gente sabe onde tá tudo aqui — César explicou e começou a apontar — Ali tem as roupas do Arthur, ali tem as minhas roupas. Naquele canto tem os brinquedos do Arthur, aqui tem coisas que a gente não sabe o que fazer e naquele outro canto tem os meus jogos de tabuleiro. Os livros estão na caixa ainda.

— Mesmo que saibam onde as coisas estão, precisam arrumar no lugar certo — Thiago falou em tom de repreensão — A certidão de nascimento de vocês tá na mochila?

— Sim, tá na minha, porque o Arthur ia perder a mochila dele — César falou e levou um soco de leve no braço, do irmão. — O que? Não tô mentindo!

— Não fala assim do seu irmão, César — Thiago suspirou e entrou no quarto, tentando não pisar nas coisas espalhadas. E pegou a mochila do filho mais velho, vendo ali os documentos das duas crianças — Vamos, eu preciso matricular vocês em uma escola.

— A gente passou por uma no caminho pra cá — Arthur comentou distraído enquanto remexia na caixa com sua mãozinha curiosa — Olha, César! A máscara do Batman! Coloca em mim.

O garoto de oito anos ajudou o irmão mais novo.

— Sim, acho que pode ser nela mesmo... Calcem um chinelo e vamos!

[...]

— Ah, entendo! E como é a forma que vocês lidam com problemas entre alunos aqui? — Elizabeth perguntou para a mulher que estava do outro lado da mesa com uma postura formal.

— Nós tentamos-

— Olá, boa tarde! É aqui que eu faço a matrícula dos meus filhos? A secretária mandou eu entrar aqui... — Thiago entrou na sala, interrompendo a diretora.

— Oh... É aqui mesmo. Eu estava fazendo a matrícula aqui com outra mãe, mas o senhor pode ir preenchendo a documentação — A mulher falou puxando uma prancheta debaixo da mesa, esticando na direção do homem.

Thiago entrou se desculpando e pedindo licença, se sentando na cadeira ao lado de Elizabeth.

— Como eu ia dizendo, tentamos criar uma relação amigável entre os alunos, resolvendo da maneira mais pacífica possível. Mas o seu filho não parece do tipo que se envolve em problemas! — A mulher deu uma risada polida.

— Bom, então acho que podemos assinar os papéis — Elizabeth concluiu por fim, vendo Joui concentrado em pintar um desenho que havia sido entregue pela diretora da escola.

— Ótimo! Aqui estão os papéis — A mulher pegou mais uma prancheta e entregou nas mãos da mulher de franja e cabelos curtos.

Elizabeth mexeu em sua bolsa, tirando de lá uma caneta preta, e destampando. Assim que começou a escrever, sentiu um leve tapinha em seu ombro.

— Será que você poderia me emprestar uma caneta? — O homem que estava ao seu lado pediu e Elizabeth respirou fundo.

— Você veio matricular seu filho numa escola e não trouxe nem uma caneta? — Elizabeth fez a pergunta de maneira genuína, não notando que aquilo podia ter saído grosseiro.

— É... eu esqueci — Thiago sorriu amarelo.

— Aqui — Elizabeth retirou uma outra caneta da bolsa, entregando ao homem bonito que estava ao lado dela.

— Obrigado! — O homem agradeceu e começou a preencher o formulário.

Assim que ambos terminaram de preencher os dados, devolveram as pranchetas. Elizabeth não quis esperar muito, então apenas se despediu rapidamente da mulher e saiu da sala.

Thiago se despediu apressado da diretora e correu atrás da mulher de cabelos pretos, para lhe devolver sua caneta.

Conseguiu alcançar a mulher e a criança que a acompanhava com uma postura de dar inveja quando já estavam passando pelo parquinho da escola.

— Ei, senhorita! Sua caneta. Obrigado — Thiago ofereceu a caneta para a mulher.

— Ah... pode ficar. Vai que você precisa! — Elizabeth brincou.

— PAI! A GENTE PODE ALMOÇAR NO MCDONALDS? — Arthur gritou dentro da janela de plástico transparente assim que viu o homem.

— EU SOU O REI DO MUNDO! — César falou alto no topo do tobogã e desceu por ele, caindo de bunda no chão. — YEEES!

— ESSA FOI MUITO BOA, CÉSAR! — Arthur gritou e desceu pelo pequeno tobogã caminhando até o pai — Hein, pai, a gente pode? A gente pode? A gente pode?

— Podemos filho, podemos — Thiago concordou antes que o menino continuasse eternamente lhe fazendo aquela pergunta. Quando o homem olhou pra frente de novo, viu que a mulher bonita já levava o filho embora.

Na cabecinha infantil de Joui, tinha achado aquelas crianças bem legais.

Vizinhos da Má Sorte [Lizago]Onde histórias criam vida. Descubra agora