o passado de presente.

seven

⁂

CALIOPE

o cheiro cítrico é a primeira coisa que sinto ao acordar. eu sei bem de quem é, e quando abro os olhos, percebo que a dona dele está perto demais. tão perto que meu cérebro lento pela noite de sono, meio que para por uns instantes.

os cabelos castanhos estavam jogados em frente ao seu rosto e ela ainda dormia serena. a blusa que ela estava usando, tinha subido um pouco, e agora eu conseguia ver um pedaço da sua cintura. imediatamente quis a puxar para mim e agarrar até que ela me afastasse  com tapas, mas logo depois, o pensamento me deixou assustada e eu finalmente senti a dor de cabeça latejante. o que estava acontecendo comigo?

me levantei devagar, tomando cuidado para não acordá-la, e fui em direção a cozinha, esperando ver leoni por ali.

– bom dia! – ela exclama feliz, assim que me vê.

– bom dia, tia – resmungo, custando a me manter de pé.

– pela sua cara, não tem nada de bom.

não consigo não rir, mas o movimento faz meus músculos doerem.

maldita ressaca!

– dói em todos os lugares. – faço uma careta que simplifica bem como me sinto por dentro.

– eu sei. vou buscar uma aspirina para você.

quando leoni deixa o cômodo, me sento na ilha de mármore e apoio a cabeça nos joelhos, pensando no que havia me atingido agora pouco.

a verdade é que nunca fui boa em lidar com o que sinto. sempre preferi empurrar tudo para o fundo a ver o que está bem em frente aos meus olhos. e dessa vez não seria diferente. eu me lembrava de tudo sobre ontem a noite e ainda não sabia o que fazer com isso.

algo havia mudado? o que haylee estava sentindo em relação a isso? ainda me odiava como eu fingia odiar ela? o que era essa vontade irracional de fazer coisas que eu não deveria desejar com ela?

eram tantas dúvidas que eu queria poder sanar.

– aqui. vai ficar melhor em uma hora – pulo de susto quando vejo leoni vindo em minha direção, e percebo que ela segura o riso.

– obrigada! – sorrio um pouco também, sem conseguir evitar. 

não dizemos mais nada, porém o silêncio nunca é desconfortável com ela. é até bastante familiar.

– bom dia – dessa vez o susto é mútuo.

uma haylee amassada e com os olhos inchados diz, bem baixinho.

eu a acho linda de todas as formas possíveis, mas a minha versão preferida sempre será essa.

eu me lembro de quando podia ver isso de pertinho todos os dias se eu quisesse. ela sorria todas as vezes que abria os olhos e me via ali, contando cada uma de suas sardas, gravando todos os seus traços sem a preocupação de um dia perder isso. eu sabia que meu dia ia ser bom quando ele começava ao lado dela, colada a ela.

não consigo evitar a onda de saudade que me arrebata sem aviso. sentir é algo que não consigo evitar nunca, e essa falta acaba comigo todas as malditas vezes.

sinto meu peito apertar e o choro parar na garganta. quando a olho, seu semblante preocupado me mostrar que ela percebeu. o que não ajuda, porque ela é atenciosa demais para o meu próprio bem.

é quando sinto que preciso ir embora porque já deu. uma noite foi o tempo que precisamos para deixar as coisas mais estranhas do que já estavam.

– eu acho que vou indo. minha mãe provavelmente deve estar preocupada, eu meio que fiquei de avisá-la quando chegasse e não fiz isso ontem, então... – disparo a falar, como sempre faço quando estou nervosa.

– você se lembra de ontem? – pergunta haylee.

a esperança em sua voz, em sua expressão me machucou de forma que eu nunca imaginei que poderia. eu queria poder dizer que sim, porque era a verdade. mas a palavra ficou presa só no meu pensamento.

– de quase nada. – digo sem pensar, pescando a decepção em seu rosto, mas ao mesmo tempo nenhuma surpresa.

– posso te levar se quiser – leoni se oferece, mas eu nego.

nossas casas são bem próximas, não havia muita necessidade. além do mais, ia ser bom andar e pensar um pouco sobre tudo.

– tudo bem, só toma cuidado e avisa quando chegar. – ela vem em minha direção e deixa um beijo casto em minha testa.

percebo de relance que haylee revira os olhos, indicando que tudo de bom que ocorreu ontem a noite, já não valia muita coisa. culpa minha, eu presumo.

me despeço dela com um aceno de cabeça, e nem cheguei na porta quando ouço seus passos rápidos vindos da escada.

talvez seja melhor assim. as coisas continuariam como eram, mesmo que agora eu tivesse tido um vislumbre de como poderiam ser daqui para frente.

é uma pena que a verdade seja tão difícil de encarar.

⁂

- cap bem ruinzinho. espero que sirva.

beijos e até a próxima 💗