9 - Estalo

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Estalos, sons de fibra, tecidos, tendões rompendo-se, ossos quebrando e sendo mastigados. Um rosnado constante a cada respiração expirada da besta monocular.

Albo estava tremendo, congelado, quase chorando. Via, com o canto do olho, querendo não ver, mas ainda assim, hipnotizado pela enorme crueldade ali disposta.

Observou o processo todo. O corpo que olhou era o de um anão. O ciclope o pegou junto com outros corpos, mas soltou o resto e passou-se a devorar apenas o cadáver enânico.

O anão falecido repousava sem vida nas mãos da besta, e por coincidência do destino, encarava Albo, mesmo morto.

O ciclope segurou-o pelo torso com apenas uma mão, e com os molares no canto da boca, esmagou o crânio do corpo, lentamente rachando-a, até que a estrutura rompeu e amassou, com sangue e cérebro esguichando no canto de sua boca, fazendo os olhos esbugalharem e saltarem pra fora, jorrando uma mistura de carne putrefada e pus.

Em seguida, puxou a cabeça esmagada para fora, e arrancou-a do resto do corpo, deixando um pouco da coluna vertebral pendurada. Mastigou a cabeça e engoliu-a, provocando um som perturbador do alimento descendo o trato digestivo da criatura, para finalmente cair em sua barriga, ecoando.

A ânsia de vômito veio quando viu os vermes pularem pra fora do pescoço decepado, e quase vomitou. Fechou os olhos, evitando fazer barulho. Viu uma luz materializar-se na sua frente e sentiu um calor no seu corpo, percebendo o medo ir embora.

Pensava claramente, e não tinha tempo para entender como que ele não estava travado de medo, precisava escapar dali.

Esgueirou-se de costas para a parede e andou de lado, porém, no primeiro passo que ele deu, o ciclope parou a mastigação e olhou na direção dele.

Não tendo uma visão direta da quina da parede em que Albo se escondia, o ciclope largou sua mão aberta na direção, e Albo agachou-se justo na hora em que os dedos do tamanho do seu braço bateram contra a parede, deixando uma rachadura ali.

Sim, ciclopes são inteligentes, mas não são surdos ou idiotas. No máximo não conseguem diferenciar algo perto de algo longe sem um devido contexto, mas seu olfato e audição aguçados compensam o faltante.

Não lhes falta força nem resistência. A alta velocidade surpreendeu Albo, que esperava algo mais lento porém potente.

O ciclope arrastou a mão de volta para seu alimento e pôs-se a comer corpos novamente.

Não contando com uma má audição do ciclope, o aventureiro teve uma idéia. Deu passadas largas e  levemente barulhentas, mas as fez sincronizado com o som de mastigação, para que se confundissem com os sons mórbidos.

Passo após passo, o som de mastigação constante, o estalar aterrorizantemente crocante dos ossos mascarava os passos de Albo, permitindo que ele pudesse se esgueirar para mais perto da criatura, e virar para o corredor de onde ela veio.

Não tirava os olhos da besta, de maneira nenhuma. Seu pai havia uma vez lhe dito que nunca se tira os olhos do inimigo. Não se imaginava lutando contra aquela besta. Como alguém poderia? Tal abominação aos seus olhos só poderia ser derrubada com grandes maquinações, muita magia, ou muito veneno.

Agora conseguia ver as costas do ciclope, corcunda, com os ossos de sua coluna salientes na pele, quase que perfurando-a.
Vestia trapos sujos, mas ainda assim conseguia ver as partes íntimas da criatura.
Suas pernas não eram maiores que seus braços, e seu torso era grande, mas perdia um pouco em altura por ser corcunda.

A medida que se distanciava da criatura e do poço com corpos, tinha uma dificuldade maior em enxergar o ambiente, até que entrou na profunda escuridão, e tateando a parede, sem descolar o olhar do ciclope, encontrou o que parecia ser uma porta de ferro.

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⏰ Última atualização: Jun 14, 2024 ⏰

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Tellúris - O conto de AlboOnde histórias criam vida. Descubra agora