Capítulo 6 Tesão Platônico

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Durante as terças e quintas, Legoshi tinha sessões de terapia lá na cidade grande. Provavelmente, ele era o único adolescente em toda a Escola Cherryton que fazia terapia, ou que aceita fazer numa boa. Não foi por escolha dele, mas sua mãe e principalmente seu avô sugeriram que ele tentasse isso para ser um pouco mais normal. Legoshi sempre foi muito reservado, muito introvertido desde a infância, tendo só Jack como melhor amigo ao ponto de suspeitarem que ele devia sofrer de algum espectro do Autismo.

Felizmente, não foi nada disso, mas à medida que Legoshi crescia e entrava para a adolescência... e conhecia umas coisas aqui e outras ali... ele tinha tantas perguntas e cada pergunta que ele não tinha coragem de fazer na cara de sua mãe e que talvez faria seu avô ficar vermelho na hora, então nada melhor que um terapeuta pra responder tudo isso!

Por sorte, Legoshi conseguira logo de cara um terapeuta sábio e bem engraçado que estava sempre com devorando um talo de bambu. Um panda gigante e musculoso parecendo um fisiculturista – pelo que dá à entender em suas fotos de pós-malhação no Instagram – chamado Gouhin.

Gouhin é um cara sábio, culto e bem viajado que parece ter todas as respostas para as perguntas mais malucas e indecentes de Legoshi. E o legal é que ele nunca julga, ri sempre e só repreende quando a situação pedir tal coisa e ele também tem uma mente jovem, então Legoshi se sentia mais confortável em falar das suas maluquices secretas com um adulto de mente adolescente o que com um adulto com mente de... enfim, adulto.

E o consultório de Gouhin é um lugar excepcional que traz paz.

Pra começar, nada de divãs, ou poltronas para Legoshi – ele se larga prazerosamente num puff imenso, vermelho e fofo que dá vontade de hibernar o dia inteiro. O chão ao redor dele e de Gouhin é um gigantesco mosaico de pedras que formava um grande Yin Yang rodeado pelos hexagramas do I Ching. Tem incenso perfumado no ar, vasinhos de bonsai por aí, uma janela ampla com uma bela vista do parque bem arborizado em frente ao prédio do consultório. Gouhin sempre toca música de flautas relaxantes para Legoshi em suas sessões e uma coisa que sempre animava o marmanjo logo era um altar lá no canto da sala com a bela estátua folheada à ouro de Nekosama Bosatsu, um lendário monge gato sempre sentado em pose de meditação, erguendo uma das patinhas abertas, com grandes orelhas peludas e uma terceira visão na testa, famoso por ter alcançado a Iluminação depois de ficar preso numa árvore sagrada por muitos dias e reconhecer o sofrimento do mundo.

-E o que o traz aqui hoje, Legoshi?-Gouhin pergunta, de pernas cruzadas em sua elegante poltrona preta e branca, onde ele quase se camufla perfeitamente, enquanto mastiga um talo enorme de bambu.-Você chegou quase 20 minutos adiantado, aposto que tem um bom motivo pra isso.

-Eu tenho sim, Gouhinsan!-Legoshi assente todo sorridente e abobado após um longo gole do seu chá de bambu, o seu favorito naquelas sessões.-Eu comi um garoto hoje!

Prontamente, Gouhin começa a rir e Legoshi ri junto dele e começa a abanar a cauda em seu puff vermelho.

-Ahh, esse garoto ainda vai me matar de rir...-Gouhin comenta aos risos.-E como é que foi?

-Foi ótimo...-Legoshi sorri com uma perversão irrefreável.

-Deve ter sido ótimo mesmo, você não para mais de sorrir.-Gouhin ri novamente, parando de morder seu bambu por um momento.-E me fale mais sobre esse garoto. Ele é lindo?

-Lindo e gostoso!-Legoshi abana ainda mais a cauda.-É o Pinakun! Aquele de quem lhe falei.

-Ahhh, o famoso Pinakun...-Gouhin assente e ri ao se lembrar.-Você não para de falar dele desde que chegou à sua escola.

-Pois é! E agora tenho mais motivos pra falar dele.-Legoshi coloca seu copo de chá de bambu na mesinha baixa ao lado do puff antes de tagarelar sem parar.-Hoje ele recebeu por mim uma encomenda minha do Boulevard dos Livreiros.

Os Quietinhos São Os Mais Terríveis...Onde histórias criam vida. Descubra agora