A Promessa da Viúva [Simone x Soraya]

XII. O Cravo e a Rosa

A disparada foi digna de uma cena daqueles filmes épicos da década de 60, Soraya correu na direção contrária com tanta ligeireza que apesar do seu porte físico delgado, deixou as marcas das botas fincadas no capinzal. No momento exato da pulada de cerca, com o ganso em seu encalço e quase lhe abocanhando no calcanhar, os braços musculosos de Januário envolveram sua cintura quando ela enganchou o pé na primeira haste de madeira e se apoiou em seu ombro pra tomar impulso e aterrisar do outro lado em segurança. Petruchio ainda bradou sua insatisfação e bateu as asas em fúria algumas vezes.

O susto foi mesmo dos grandes. Seu fôlego estava a mingua e o ar era expulso dos pulmões em lufadas generosas que tão logo saiam, lhe faziam falta.

- Calma! Calma! 'Cê 'tá bem, oncinha. - Ela se limitou a assentir, sua alma ainda não tinha voltado ao corpo.

O perfume forte e enjoado foi a primeira coisa que invadiu as narinas da forasteira. Provocou-lhe até um comichão de tão exagerado que era. Em sua humilde opinião, a visitante indesejada parecia uma perua assada de tão emperiquitada que estava. Trajava uma blusa de cetim azul, uma pantacourt branca e um salto de camurça. Pela cabeça do santo, com o sol rachando daquele tanto e a mulher ainda usava uma tonelada de base na cara. E parecia ter levado uma chinelada de cada lado.

Simone deu um passo à frente, como sempre se colocando numa posição intermediária. Seu olhar fixo nas mãos do peão que ainda não haviam se desgrudado da curva acentuada da mais nova.

A morena pigarreou tentando camuflar sua amolação. Estava mesmo incomodada, também pudera!

O rapaz se arranjou, afastado-se parcialmente como se tivesse sido pego com as calças arriadas, já a diaba loira, percebendo o embaraço e o semblante fechado de Tebet, passou o braço pelo pescoço dele, utilizando o peso do próprio corpo para se escorar.

- Acho que machuquei o pé. - Fez um biquinho.

- Onde está doendo? - O tom trazia um misto de preocupação e algo mais, esse algo sendo responsável por um arrepio na nuca de Soraya.

- No calcanhar, eu acho. - Ela tirou o pé direito do chão, se achegando ainda mais perto de Januário.

Lógico que não passava de uma mentirinha inofensiva, ela não estava sentindo dor, sentia era o bom e velho ranço. E a animosidade do momento era tangencial, apesar de nenhuma das duas querer endereçar a sua causa.

- Vou te levar pra ver o doutor. Vamos, eu lhe ajudo a chegar no carro. - Se adiantou, dando ênfase no pronome pessoal.

- Simone, minha querida, acredito que não precisa disso, a moça me parece perfeitamente bem. - "Que voz de lambisgóia!" Soraya pensou, fincando as unhas no coitado do homem que não tinha nada a ver com sua indignação.

- Vamos deixar que o médico diga, não posso permitir que uma funcionária minha fique sentindo dor. Venha. - A mais velha estendeu e lhe ofereceu as mãos.

- Sua amiga tem razão, patroa. Não precisa se preocupar com essa simples funcionária. O Januário não se incomoda de me levar até o quarto, num é? Uma compressa de água gelada 'tá mais do que bom. - Continuou enlaçada nele, que finalmente segurou no seu quadril.

- Soraya, certo? Uma jovem muito esperta. - Ela olhou da forasteira para o peão deduzindo o que bem queria. - Mas eu não diria que sou amiga da Simone. - Contestou, colocando uma mão astuciosa no meio das costas da morena, que não pareceu estranhar o toque. - Joice Hasselmann, mas me chame de Joice, o sobrenome você não vai conseguir pronunciar. - Apesar de se apresentar, não se deu ao trabalho de firmar um aperto de mãos.

Tebet revirou os olhos, mas foi muito mais um gesto de condescendência do que de aversão.

- Se não é amiga, é o quê? - A mais nova voltou a pregar o pé no chão e, sem perceber, trocou o peso de um para o outro sem dissimular nenhum mínimo desconforto.