Capítulo 1 - Lembranças Agridoces

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3 meses haviam se passado desde a partida de Ava e a saída de Beatrice da Ordem. Era insuportável para Bea estar naquele convento sem a presença de Ava, ainda mais levando-se em conta de que foi pela Ordem que Ava se sacrificou e sumiu por aquele portal. As últimas palavras de Ava, "eu te amo", seguiam na mente de Bea e maltratavam seu coração com tanta dor e saudade. "Eu devia ter dito isso para ela antes dela partir... ela se foi sem saber que eu a amava também", pensava com frequência, e aquele aperto no peito por vezes a fazia chorar por muito tempo na cama à noite, até ser vencida pelo sono de cansaço e desalento.

Beatrice voltou para o bar na Suíça, lugar para onde Ava sempre quis voltar com ela, e Beatrice se arrependeu fortemente por não ter cedido àquele desejo de Ava. Voltou para o lugar onde passaram mais tempo juntas, próximas, felizes. O lugar onde Ava trabalhava com um sorriso no rosto, sorriso que iluminava todo o ambiente. E que agora Beatrice nunca mais veria. Ainda assim, aquele era o lugar certo para viver todos os dias com as doces lembranças de Ava.

Ela estava em todo lugar daquele bar. Quando alguém quebrava um copo, quando alguém ria um pouco mais alto, quando alguém pedia uma cuba libre ou dançava saltitante nos eventos da noite. Mas a saudade apertava mais forte mesmo era quando alguém pedia um shot de limão, o lemon drop... o mesmo shot que as duas tomaram juntas na noite em que dançaram alegremente e se divertiram juntas. Juntas. Cada shot de limão daquele bar era uma pequena punhalada no coração de Beatrice. Um lugar tão cheio de memórias agridoces.

Bea mergulhou de cabeça no trabalho da administração do bar. Trabalhava dia e noite, não queria pensar em mais nada. Queria só esvaziar a cabeça de tudo que a machucava. Envolvia-se em tantas tarefas que acabava não tendo tempo de pensar em mais nada. E então, certa tarde, enquanto Beatrice conferia o livro de contabilidade em uma das pontas do balcão, seu coração doeu tanto que ela quis chorar.

Uma moça entrava no bar e, contra a luz, era pouco mais que um vulto. Conforme ia entrando, a luz se ajustava e Beatrice começou a reparar em detalhes. Uma moça de jeans claro surrado, tênis, camiseta vermelha curta que deixava à mostra parte da barriga e a cintura fina, boné... até o jeito de andar lembrava o de Ava, e Beatrice quis com todo o seu coração que fosse Ava voltando para ela. Mas não podia ser, a moça tinha os cabelos compridos, até a altura dos seios, os braços um pouco mais fortes e definidos do que ela lembrava sobre Ava. Bea tentou de todas as formas tirar aquela esperança do peito. "Ava se foi, não vai voltar". Respirou fundo e tentou voltar à sua concentração ao livro de contabilidade, mas foi em vão. A moça vinha em sua direção, não havia forma de se concentrar.

De cabeça baixa, com o boné e parte dos longos cabelos escondendo o olhar, a moça caminhava em direção ao lugar onde estava Beatrice. Bea não pôde evitar que o coração batesse mais rápido. Pensou que o destino tinha pitadas de crueldade para sua vida, fazendo-a reviver Ava daquela forma tão vívida. A moça parou a poucos metros do balcão e Bea ficou paralisada. Não podia acreditar no que seus olhos viam.

A boca rosada e de desenho suave, o nariz pequeno, perfeito e levemente empinado, o rosto de traços delicados e joviais. Aquela bela moça levantou os olhos em direção a Bea. Olhos castanhos, escuros, quase pretos, brilhando como duas pedras de ônix, as sobrancelhas levemente arqueadas, com aquele olhar cativante de um filhote. Olhou dentro dos olhos de Beatrice e sorriu meio de lado.

— Oi, Bea.

O coração de Beatrice parou por alguns segundos, seus joelhos falharam e ela achou que desmaiaria ali mesmo. E bem quando estava quase indo ao chão, sentiu aquele braço que rapidamente a segurou pela cintura, impedindo que caísse. Bea olhou novamente para aqueles olhos, não podia acreditar. Abriu a boca para falar e sua voz quase não saiu.

— A-Ava?

 Ava apenas sorriu, com os olhos cansados, mas mais brilhantes que nunca por estar vendo Beatrice tão de perto de novo. Bea voltou a respirar e passou seus braços ao redor de Ava. E naquele momento não mais conseguiu segurar sua vontade de chorar.


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