Todas As Estrelas Que Eu Vi Em Seus Olhos

☆ prólogo ☆

⭑ Musiquinhas do capítulo:

⭑ All Along the Watchover - Jimi Hendrix
⭑ Ain't no Sunshine - Bill Withers

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Cansado. Era isso o que todos os meus nervos denunciavam, estava extremamente cansado. Meus dedos estavam doloridos pelas horas seguidas de prática com Escanor - minha guitarra que apelidei carinhosamente por ser quase um membro a mais em meu corpo. Guardei-a cuidadosamente em sua capa e olhei pelas longas janelas da sala de música. Já escurecia e eu mal vi o tempo passar. O Sol se escondendo preguiçosamente no além, alguns últimos raios indo diretamente para meus olhos.

Abri um dos bolsos da mochila de Escanor, retirei alguns Band-Aids para as bolhas que começavam a brotar nas pontas de meus dígitos judiados, aplicando-os cuidadosamente na pele. 

Coloquei alguns instrumentos da sala no lugar, em seus respectivos apoios; guardei algumas partituras nas pastas do armário no fundo da sala junto com algumas palhetas perdidas pelo chão no potinho das preciosidades esquecidas - a maioria era realmente esquecidas, com donos que tinham palhetas demais para se importarem com uma perdida. Joguei no lixo bolinhas de papel e embalagens de doces que se revelavam a cada novo lugar que eu mexia. Alinhei as carteiras e os porta-partituras naquela organização metódica que sempre me proponho a fazer quando uso a sala do professor Choi por mais tempo. Fechei o piano e me escorei em cima dele por breves segundos, confirmando se estava tudo em seu devido lugar. 

As paredes de cor creme guardam suportes de instrumentos que são pendurados ali, o armário velho de madeira escura tem uma porta que insiste em ficar aberta e as dobradiças fazem uma barulheira extravagante de um nheeeeck tenebroso a cada alma que decide encostar em sua parte defeituosa; sorte dele ficar bem no fundo da sala. As carteiras estão simetricamente posicionadas, não vejo mais nenhum lixo no chão e as janelas estão fechadas, as cortinas cinzentas e meio puídas, imóveis. Concluo por fim que, sim, está tudo certinho. 

Suspirando e estalando alguns ossos, eu me direciono até Escanor - que estava encostadinha na parede - coloco uma alça de sua capa em meus ombros e sigo até a porta da sala enquanto tateio os bolsos de minha calça jeans, procurando a chave reserva que o professor Choi me deu. 

É que minha paixão por guitarra começou nos meus 14 anos quando vi um vídeo do Jimi Hendrix dedilhando as cordas numa habilidade indescritível, como se aquilo fosse a coisa mais fácil do mundo... Ele me conquistou. No meu aniversário de 16, quando gastei toda a paciência (que já não era muita) dos meus pais pedindo por uma guitarra, eles me deram, com muito custo e relutância, uma Stratocaster. Fiquei tão feliz que dormi abraçado a ela naquela noite, semanas depois a apelidei de Escanor. Desde então, pratico todos os dias como se minha vida dependesse de música e talvez dependesse mesmo. Não consigo mais ver minhas tardes livres sem os acordes, sem as melodias aleatórias que dedilho sem pé nem cabeça por horas a fio. 

Creio que o professor Choi notou a minha crescente paixão e obsessão na música que ele simplesmente simpatizou comigo e me deu até uma cópia da chave da sala de música. 

Trancando a porta, vejo uma movimentação pela minha visão periférica e decido olhar para saber quem é que se aproxima. 

- O que tanto fez aí dentro? - Yuna carregava uma expressão nada satisfeita no rosto bonito enquanto seus saltos emitiam estalidos no chão polido dos corredores.

- Sério, Yuna? Eu, um estudante de música, claramente com a minha guitarra nas costas, dentro de uma sala de música... O que eu poderia estar fazendo? - um revirar de olhos longo e doloroso irrompeu de mim. Não era de hoje que ela estava tendo essas atitudes bizarras de me seguir e vigiar tudo o que faço, sem contar qualquer mínima coisa que ela não goste é motivo de briga.