Capítulo 5

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"É verdade universalmente reconhecida que um homem solteiro em posse de boa fortuna deve estar necessitado de esposa."
Orgulho e Preconceito - Jane Austen


Alexandre olhava pela janela da casa a charrete se aproximar devagar. Grande e imponente, puxadas por dois cavalos pretos muito bem cuidados. Apenas o melhor para a filha do Barão Antonelli. Ele balançou a cabeça. Perguntou para a governanta durante o café qual era a história da família da morena, recebendo apenas ótimas palavras.

Era uma família clássica do plantio do café, que no pior cenário da escravidão, era a que melhor tratava os escravos, por mais incrível e absurdo ao mesmo tempo que aquilo pudesse parecer – não era o esquema de escravidão, mas pagavam pelo trabalho, castigos? completamente banidos das fazendas e qualquer capataz que fizesse o contrário... magicamente sumia do mapa, as crianças eram educadas em uma pequena escolinha construída nas terras da família.

Após a abolição, a fazenda Antonelli no interior Paulista foi ponto de referência para a qualificação desses trabalhadores para a vida na cidade, uma vez que o governo se importou muito pouco com o que poderia acontecer com eles.

Alexandre sabia como era o mundo, dificilmente encontraria alguém com a visão de Assunção e sua família. Completamente diferente do que ele imaginava, lhe surpreendendo positivamente.

Giovanna, inclusive, trabalhava como professora em uma escola construída por seu pai um pouco afastado do centro, onde filhos de ex-escravos e imigrantes muito pobres tinham a chance de ter pelo menos o básico da educação. O boato era que Catarina tinha exigido que a filha se afastasse dos deveres com a escola para se preparar e ser uma boa esposa para João Schaumann.

Alexandre aguardava no hall quando viu seu mordomo se aproximar para abrir a porta. Lá estava ela, magnífica. Uma camisa em tom vinho, a saia longa e preta, por cima um grande casaco de frio. Os cabelos escuros estavam em um coque, e um chapéu elegante. Augusto o olhou e sorriu, diferente do que ele esperava. O menino veio correndo e o abraçou pelas pernas.

— Ei... — Alexandre sussurrou, puxando o menino para seu colo.

Augusto se agarrou em seu pescoço e nada disse. Alexandre olhou para Giovanna confuso.

— Ele disse que a mãe sempre falou muito do tio... ele sabe quem você é... — ela disse suavemente, olhando com carinho para o menino.

— Muito obrigado, Senhorita Antonelli.

Ela adotou uma postura firme, um nariz empinado que o tirou do eixo.

— Ele não come carne de porco, gosta do leite morno e dorme junto do Pippo.

— Pippo? — Alexandre perguntou confuso.

— O cachorro de pelúcia. — Giovanna desviou o olhar para o Carlos, que deixava as malas de Augusto na porta junto com Paloma.

— Você deve ser Paloma, a babá? — Alexandre perguntou para a jovem, que sorriu e o cumprimentou.

— Sim, senhor.

Giovanna olhou para Augusto com o coração apertado. Sentiria falta de seu menininho. Tão pouco tempo e fez tanta diferença para ela. Olhou para Alexandre, dura como na noite anterior, tentando ignorar o tremor que passou por seu corpo ao ver os olhos dele na luz do dia, brilhando como dois cristais negros.

— Augusto precisa de cuidados, ele passou por dias duros... eu tenho certeza que o senhor será capaz de fazer o mínimo... — ela falou de maneira rude sem conseguir evitar.

Algo naquele homem a fazia perder toda a compostura de boa dama. Ciúme pode ele estar levando Augusto embora? Deveria ser muito fácil ser homem mesmo, chegar e tomar as coisas quando lhe bem favorecem. Ele ao menos seria capaz de passar dois dias com o pobre órfão antes de mandá-lo para o internato?

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