Capítulo 16

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Julho, 1912

O que Rodrigo sempre imaginou para um mês de casado era muito amor, adaptação e descobertas. O que ele recebeu junto desse pacote foram semanas de dores de cabeça, estresse no trabalho e comentários maldosos nas ruas. Nenhuma dessas coisas fazia ele duvidar de seu amor por Alessandra, mas ele sabia que fazia ela se questionar se não levou o nome dele para a lama.

Pois cá estava seu amigo, na véspera de seu casamento, lendo alguns documentos e papeladas em um processo contra a filial brasileira da companhia de trem. Ainda que fosse administrada por ingleses, a linha férrea tinha muitos nomes brasileiros e moralistas, que questionavam o trabalho de Rodrigo simplesmente por sua escolha de esposa.

Alessandra tinha os braços cruzados e os olhos apreensivos.

— Eles podem mesmo demitir Rodrigo? — ela perguntou, olhando o advogado nos olhos.

— Não, não podem. — Alexandre respondeu.

A mulher suspirou de alívio, o polegar girava a aliança de casamento no dedo, um sinal claro de nervosismo que Rodrigo já tinha aprendido muito bem. Ela caminhou para se sentar ao lado do marido, que segurou sua mão com carinho.

— Alessandra, o seu casamento com Rodrigo te ajudou muito a não virar uma mulher marginalizada pela sociedade... mas infelizmente as pessoas ainda põem o seu caráter a prova... eu estudei alguns meios de limpar sua imagem, mas nada honesto me vem a cabeça. — Alexandre disse de maneira direta.

— Nada honesto? — Rodrigo perguntou para o amigo. — No que pensou então?

— É um pouco baixo... — o advogado respondeu em um sussurro, olhando para os papéis que tinha nas mãos.

— Diga, Alexandre... no que pensou? — Alessandra perguntou aflita.

Os olhos focaram nos amigos na sua frente.

— Pensei... que pudéssemos usar Willian... para limpar o seu nome.

— Como isso?

— Dizendo que ele abusou de você. — Alexandre falou direto.

Alessandra deixou um suspiro de choque escapar de seu corpo. De tudo que tinha passado por sua mente, aquela era a última coisa que pensou que Alexandre fosse lhe sugerir. Rodrigo olhou chocado do amigo para a esposa e então de volta para o amigo.

— Alexandre, que ideia é essa, sabe que não foi assim que aconteceu, Caio não é fruto de um abuso. — Rodrigo falou sério, até um pouco nervoso com a suposição.

Em um mês de casados, Rodrigo aprendeu um pouco mais sobre a história da esposa e consequentemente do pai de Caio. O homem era honesto, trabalhador, dono de uma pequena fortuna que infelizmente se perdeu após sua morte. Alessandra sempre deixou claro que as intenções de Willian tinham sido as melhores desde o primeiro momento e que ele nunca tomou liberdades que ela não quisesse.

Isso eles queriam passar para Caio da melhor maneira possível. A ideia de que seu pai foi um homem integro e que com seu sangue e a educação que receberia de Rodrigo seria igualmente um grande homem.

Jogar isso no lixo agora não lhes pareciam tão apetitoso.

— Eu sei, Rodrigo. — Alexandre suspirou derrotado. — Eu não quero ofender a memória que tem do homem, Alessandra. Que Deus o tenha, também não quero difamar sua alma.

— Então por que sugeriu isso, meu amigo? — o engenheiro questionou, Alessandra já perdida em seus pensamentos.

— Infelizmente a sociedade tende a ser menos dura quando a mulher é vitima de uma covardia... dizer que Willian abusou de Alessandra parecia mais viável, e que por isso foi obrigado a propor casamento na época.

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