Capítulo 35

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Novembro, 1907

João lia concentrado quando escutou a movimentação na casa com a chegada de Giovanna. Ela sempre movimentava tudo, assim como movimentava o seu coração. Ele se levantou da poltrona prontamente, arrumando sua roupa enquanto esperava ela aparecer na biblioteca. Foi quando ela entrou com um sorriso lindo e o mordomo atrás de si carregando uma caixa.

Ele prontamente se aproximou para ajudar o funcionário e quando a caixa foi posta sobre a mesa de centro na frente do sofá, João olhou para ela sorrindo.

— Que bom que está aqui. — ele falou com carinho.

— Eu queria entregar pessoalmente porque acho que vai gostar. — ela falou contente, juntando as mãos em ansiedade.

— E o que eu fiz para merecer?

— Seu aniversário é semana que vem. — ela falou como se fosse óbvio. — O presente chegou antes e eu queria te entregar logo.

João sorriu, começando a desfazer o laço rapidamente. Giovanna o olhava ansiosa, o rosto com um misto de pânico e algo que ele não sabia dizer. Tirou a tampa da caixa e o conteúdo o surpreendeu. Era uma tela de pintura grande, com pincéis e todos os tipos, tintas, lápis. Ele olhou para aquilo por alguns segundos antes de olhar confuso para ela.

— Eu... eu sei que você ama artes de todos os tipos, e disse que queria iniciar em uma nova vertente... então pensei que seria uma boa ideia te dar um quadro, assim você pode começar a pintar. — ela falou rapidamente. — Dizem que é terapêutico também.

Sem se conter, João segurou o rosto dela entre as mãos, lhe dando um beijo rápido nos lábios. Se afastou tão logo se aproximou, se socando internamente por essa atitude tão impulsiva. Ele não era assim, mas Giovanna arrancava o pior dele – ou o melhor.

— Desculpe, por favor. — ele falou rapidamente, se afastando dois passos. — Eu não sei o que me deu na cabeça, se quiser me dar um tapa eu sei que será bem dado.

Giovanna o olhou surpresa também, mas balançou a cabeça.

— Não precisa se martirizar, estamos prometidos, esqueceu? — ela falou com um meio sorriso. — É inevitável, um dia teremos filhos.

João riu nervoso, ajustando a gravata que ficou subitamente apertada com aquele comentário. Olhou novamente para seu presente e sorriu honesto.

— Isso é incrível, Giovanna. Melhor do que eu poderia esperar.

— Gostou mesmo? Minha mãe disse que eu deveria te dar algo mais...

— Másculo? — João sugeriu. — Meus pais pensam a mesma coisa sobre minha paixão infinita pelas artes, dizem que extrapolo... creio que jamais me dariam algo assim, preferem que eu estude as pinturas apenas nos livros.

— Então gostou mesmo? — ela falou sorrindo.

— Gostei, e quero estrear pintando você.

Giovanna riu.

— Vamos com calma, Velázquez. — ela ironizou com o nome do pintor favorito dele. — Primeiro tem que aprender a misturar as tintas, depois veremos.

— Temos tempo, não temos?

Giovanna o olhou séria. Em meses ela aceitou o destino que seria casar com João e passou a se contentar com a convenção. Não era de sua natureza, mas ela estava cansada demais para lutar. João partiria para os estudos logo, e ela sabia que o tempo sozinha, o tempo longe, a faria repensar esse casamento mil vezes. Por hora, porém, ela gostaria de tornar as coisas as mais fáceis possíveis para ela, e para João também.

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