Capítulo 8 - Eu, a Doris e vocês

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Depois da saída repentina de Susan, desço para encontrar a casa silenciosa e vazia. Na sala, me aproximo da porta de entrada a fim de trancá-la. Vejo a chave no chão.

"Ué?!"

Inclino-me e a pego.

"Deve ter caído quando Susan bateu a porta." — pondero.

Antes de encaixar a chave no miolo, testo a maçaneta. Está trancada. Franzo o cenho estranhando.

"Como conseguiu fechar a porta?"

Destranco-a e desço os degraus, caminho na garagem para averiguar o portão. No meio do caminho, encontro outra chave no chão. Pego-a e a avalio.

"É o do portão."

Sigo até ele para me certificar de que está trancado. Testo a fechadura. Está.

Bufo.

"Então se preocupou em trancar tudo antes de sair?"

Essa informação mexe comigo mais do que gostaria. Irritada, volto à sala batendo os pés no chão com mais força que o necessário. Começo a subir a escada.

"Eu só queria um emprego, sabe? — reclamo com Deus. — Se soubesse que tudo isso ia acontecer, não teria ido para aquela porcaria de entrevista!"

Marcho ao subir cada degrau e vou para o meu quarto.

"Onde eu estava com a cabeça quando aceitei a oferta da Susan? Seja como foi ... não é mais uma opção."

Tiro a roupa e devolvo cada peça no seu lugar, no armário. Escolho um pijama de verão, com toque gelado. Assim que desço a camiseta pela cabeça, arrumo meus cabelos em um coque e o prendo nele mesmo. Ajeito os fios do short e dou um laço.

"Preferia mesmo não ter ido à entrevista?" — uma vozinha me pergunta.

Passo a mão sobre os meus lábios, ainda sem acreditar que a tinha beijado.

"Que ódio!"

Fecho as portas do guarda-roupa, sem paciência, e me viro para cama. A jaqueta de Susan está sobre ela. Minha postura mingua. Arrasto os pés no chão, mentalmente derrotada. Deito-me na beirada e fico de costas para a jaqueta.

Fecho os olhos e espero o sono vir.

"Uuh, uuh,..."— faz a coruja, perto da minha janela.

Normalmente, eu adoraria a presença dela ali..., mas, hoje, não é o dia mais indicado para escolher o meu muro e a minha janela. Meu pescoço dói com dois travesseiros embaixo de mim. Puxo um deles para encaixá-lo entre as pernas. Ajeito o outro embaixo da cabeça e suspiro, obrigando-me a aceitar que tudo está deliciosamente perfeito.

"Uuh, uuh..."— insiste a coruja.

"Ela vai parar" — forço-me a pensar.

"Uuh, uuh..."

Abro os olhos desacreditada. Salto da cama e vou até a janela de madeira, com um trinco giratório, ao meio. Destranco e empurro cada lado para fora. Debruço-me sobre o beiral.

Contemplo o pequeno quintal que temos aos fundos, com uma modesta cobertura (edícula), onde ficam: o tanque, a máquina de lavar roupa e um banheiro. Daqui, também é possível ver os fundos dos vizinhos.

Meus olhos vão para minha perturbação noturna. A coruja. Está bem perto da minha janela, no muro ao lado. É pequena e marrom, me olha com aqueles olhos amarelos e passo a odiar por isso.

Susan: A história de uma travesti que se apaixona por uma mulher ((DEGUSTAÇÃO))Onde histórias criam vida. Descubra agora