Charlotte Delgado
Giro a chave na marçaneta, empurrando a porta lentamente até ela abrir por completo. Os raios solares invadem o interior empoeirado do corredor, o cheiro de casa não habitada invadiu minhas narinas, me fazendo segurar um espirro.
Dei o primeiro passo para dentro, sentindo a nostálgica sensação de estar em casa. Tudo ainda estava exatamente como deixamos após o funeral da mamãe, desorganizado. Ascendo as luzes da sala, podendo ver a decoração alegre que havia naquele cômodo. As fotos da família ainda estavam todas no mesmo lugar, em cima da lareira.
Um livro que nunca terminei de ler ainda estava acomulando partículas de poeira em cima do sofá, o marca páginas ainda guardava a página setenta e sete, exato capítulo em que parei a leitura. Puxo as cortinas, deixando o sol tomar conta do cômodo antes escuro, dando luz ao ambiente. Agora pude ver com clareza, uma fotografia em um porta-retrato com o letreiro "memories" gravado em letras de forma sobre ele. Admiro a foto com um sorriso melancólico no rosto, acariciando a imagem de meus pais logo atrás de mim e meu irmão.
Lembranças de quando ainda estávamos juntos invadem minha cabeça. É tão triste lembrar dos momentos felizes com uma pessoa morta. Eu sinto o meu coração, ou o que restou dele, doer cada vez mais em que insisto em relembrar o passado. Deixo a sala para trás, subindo as escadas para o segundo andar, onde ficavam nossos quartos.
Um quadro grande de toda a família roubou minha atenção. A moldura branca pendurada na parede da escada me fez parar e admirar a fotografia em família mais perfeita que já tiramos. Eu me lembro de quando ela foi tirada. Eu tinha dez anos e era aniversário do Caleb, mamãe pediu a minha ajuda para fazer um bolo de chocolate - era o sabor favorito dele - para podermos comemorar em família. Papai estava gravando tudo, registrando o momento segundo ele. Mas o meu irmão chegou mais cedo da escola e estragou toda a surpresa, ele quis nos ajudar nos preparos mas acabou inundando a nossa cozinha com farinha de trigo e achocolatado. Foi o instante exato em que o papai apertou o botão e fotografou, eternizando o momento para sempre.
Eu não sei por quanto tempo fiquei ali, parada naquela escada. Eu me via cada vez mais imersa em meu passado, em minhas memórias, em minha dor. Ela se tornava cada vez maior e mais presente, como se aquilo crescesse ainda mais dentro de mim cada vez que eu revivo uma memória nova.
Deixei a fotografia para trás, adentrando o meu antigo quarto. Estava tudo uma bagunça e cheio de poeira, mas ainda estava do jeito exato que deixei quando sai por aquela porta, apenas com o ensencial para iniciar uma nova vida em San Francisco. O anel que minha mãe me deu quando completei quinze anos ainda estava no porta joias, mas eu tratei de colocá-lo em meu dedo anelar assim que o vi.
Perdi totalmente a noção do tempo dentro daquela casa. Me afogando em memórias antigas, no meu passado. Me martirizando com a dor do luto, destruindo o pouco que me restou de sanidade mental. Quando me dei conta já era tarde da noite e pessoas chamavam meu nome no andar de baixo.
- graças a Deus, você está bem - Helena diz ao me avistar
Estou encolhida no canto do quarto, bem perto da janela. O rosto inchado e avermelhado, os braços abraçando as próprias pernas e a cabeça deitada sobre os joelhos. Helena andou rapidamente em minha direção, se sentando ao meu lado enquanto sua irmã, Laila, fechava a cortina do quarto e ascendia a lâmpada.
- os garotos estão loucos atrás de você, Charlotte. - me olhou, notando algo errado. Ela suspirou, puxando minha cabeça para seu ombro - tudo bem, a gente vai pra casa.
Helena me abraçou, alisando meu cabelo com a mão esquerda enquanto me abraçava com a outra, tentando me acalmar.
- oi, é achamos ela, estava na casa antiga. - Laila dizia ao telefone - não precisa, Helena e eu levamos ela, é a nossa melhor amiga....tudo bem, tia Melissa, chegamos em alguns minutos.
Ela desligou o telefone, o colocando no bolso do casaco outra vez. Laila se abaixou em nossa frente, me olhando com um olhar sereno e extremamente calmo.
- Chaz, você está aqui desde a hora em que Helena e Sarah te deixaram na porta? - fungo, balançando a cabeça em afirmação. - e não comeu nada desde o lanche na escola? - nego, ela suspira - a sua tia ligou, os meninos chamaram ela quando deu onze da noite e você não chegou em casa.
Franzo o rosto, passando a mão em baixo dos olhos na tentativa de enxugar as lágrimas.
- e que horas são agora?
- são duas da madrugada, Lottie. - Helena responde
Me espanto, afastando a cabeça do peito de minha amiga. Eu realmente chorei por doze horas seguidas? Caleb deve estar super preocupado comigo.
- a gente vai te levar pra casa agora, ta bom? É tarde e você precisa descansar um pouquinho. - me estendeu a mão, dando um sorriso tranquilo - você vem?
Agarrei sua mão, tomando impulso para conseguir me levantar. Me sentia exausta, os olhos quase que se fechavam sozinhos e por alguma razão o meu corpo estava doendo.
(...)
Laila estacionou o carro em frente a casa de minha tia, que agora também é minha casa. Vi quando tia Melissa abriu a porta rapidamente e correu em nossa direção. Helena abriu a porta do carro para mim, segurando em minha mão para que eu pudesse descer.
- vamos, você está gelada - sussurrou enquanto me ajudava a sair
Melissa e os garotos rapidamente nos encontraram e Caleb passou os braços pelos meus ombros, me firmando ao chão.
- oh, Deus! - exclamou o garoto - no que estava pensando, Charlotte? Sair e não nos avisar, e ainda por cima na noite mais fria do ano - murmurava enquanto me levava para dentro.
- eu a deixei na porta de casa às duas e meia, pensei que já estivesse de volta - ouvia Helena dizer para Stiles - me desculpe, senhora McCall.
- ela não comeu nada desde a escola, tentem alimentá-la, tudo bem? - Laila diz - Chaz, nós voltamos amanhã para ver como se sente.
Dei um meio sorriso, sendo levada para dentro por Caleb e Scott. A rua deserta foi deixada para trás e finalmente adentramos a casa, me senti aliviada por não ter o cheiro de mofo e poeira por todo lado.
-desculpe - foram as únicas palavras que saíram de minha boca naquele momento.
A dor do luto precisa ser vivida, se você reprime esse sentimento ele se torna maior, uma enorme e volumosa bola de neve que cai em cima de você e te sufoca até a morte. Estou sendo sucofada pela minha própria dor e isso é aterrorizante.
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𝗠𝗘𝗠𝗢𝗥𝗜𝗘𝗦 | 𝐃𝐞𝐫𝐞𝐤 𝐇𝐚𝐥𝐞
Fanfiction(𝗠𝗘𝗠𝗢𝗥𝗜𝗔𝗦) onde Charlotte Delgado vive várias aventuras sobrenaturais ao lado do primo e melhor amigo, Stiles e Scott. Sobrinha de Melissa, a garota volta para Beacon Hills na companhia do irmão mais novo após o terrível fim do pai, Ian Delg...