Os ensaios só começariam na segunda-feira, a maioria dos meninos estava se preparando para o próximo jogo escolar, isso significa que nada de dança e cortejos por hoje.
Eu estava radiante, mais tarde Giselle tiraria as medidas para o meu vestido, depois disso, uma sessão de estudos e comparecer ao ensaio rotineiro para marcar as posições da coreografia.
Pensei que finalmente a vida tivesse me dado um descanso.
- Olívia!
Estávamos quase saindo da sala quando Cordélia me chamou.
- Professora Cordélia - inclinei a cabeça levemente ao chão, Giselle estava ao meu lado e fez o mesmo.
Ela agradeceu silenciosamente com os dentes alinhados e as linhas do rosto que quase não apareciam, ela tinha uma pele de dar inveja.
- Preciso falar com a senhorita - Ela referiu-se a mim e olhou para a Giselle - Está liberada, querida.
Giselle fez uma pequena reverência e nos deixou a sós.
Senti meu ombro ficar um pouco tenso.
- Receio que não possa comparecer a aula de agora, senhorita
Soltei um suspiro, era bom demais para ser verdade.
- Perdão? - Disse educadamente
- Alguém gostaria de conhecê-la - ela pousou a mão em minhas costas e me guiou para fora da sala de etiqueta.
Ao fim do corredor, um pouco mais distante e iluminado pela luz do sol vinha um garoto. De estatura alta e corpo regular, cabelos castanhos escuros e lisos, em seu rosto repousava um óculos retangular e seu nariz era levemente achatado. A pele avermelhada brilhava ao sol.
Minha pupila contraiu, senti todo o cansaço retornar ao meu corpo.
Ele não tinha gingado, mas carregava uma postura bem cuidada e limpa.
Ele estava se aproximando.
Não podia ser, mas era.
- Bom dia, professora Cordélia - Ele inclinou a cabeça como forma de respeito
- Olívia, esse é Erick Carrillo - Ela apontou em sua direção - Representante da turma masculina deste ano, tricampeão nos jogos de xadrez, líder de laboratório e aluno número um de astronomia. Mas para você - Ela pausou a fala - um parceiro - Cordélia levantou as sobrancelhas.
Eu estava congelada, não consegui abrir a boca.
- É um prazer finalmente poder conhecê-la - Presunçoso, ele se aproximou, tomou minha mão delicadamente e depositou um beijo nela, ainda mantendo os olhos fixos nos meus.
Eu devo ter transparecido meu terror, Erick segurou uma risada.
- Deixarei vocês a sós. É desejo de Patrícia, e de Ágatha, sua mãe, que conheça seu parceiro antes do baile e da coroação. Me deem licença.
Erick despediu-se dela educadamente sem dizer uma palavra e me fitou.
Eu estava a um passo de explodir, queria morrer, queria me enterrar no fundo da terra, queria pular a janela e me esconder nas árvores do jardim.
Tentei manter meu equilíbrio.
Ele colocou-se ao meu lado e apontou para o corredor. Começamos a caminhar.
O perfume dele era tão forte que chegava a causar dor de cabeça.
Eu tive outro pesadelo essa noite, foi a mesma sensação de estar presa e não conseguir respirar. Quando me levantei da cama e olhei no espelho, reparei em como estava começando a ficar com olheiras e o quanto a minha pele estava feia. Tentei fazer o máximo para esconder toda aquela bagunça.
Quando a aula de etiqueta terminou, por um momento achei que estivesse livre dessa situação. Por hoje eu não queria pensar em nenhuma dessas questões e apenas seguir a rotina, os exames estavam próximos e eu precisava rever toda a matéria.
Minhas costas estavam doendo e parecia que a minha mente estava nublada, já se passavam das oito horas, mas eu ainda me sentia cansada. Precisei passar um pouco de pó debaixo dos olhos, por sorte funcionou.
Eu não sei quando foi a última vez que eu me senti leve, sem responsabilidades. Desde que cheguei nessa escola muitas coisas foram colocadas em cima de mim. Às vezes eu sentia como se estivesse carregando uma mochila cheia de pedras, elas ficam pesadas a cada aniversário. Com Erick ao meu lado, sinto como se tivesse acabado de colocar uma pedra maior ainda.
Precisei estabilizar os pés para não cair enquanto caminhava, torci levemente o pescoço.
- Você não me disse seu nome.
Eu mantive minha postura e tentei me manter neutra, relaxei as sobrancelhas e respirei fundo, jogando fora todos os pensamentos que estavam me atrapalhando.
- Preciso dizer?
- Olha, estamos nos conhecendo, geralmente o nome é uma das primeiras que contamos ao outro.
Ele estava zombando comigo, apertei as palmas das mãos enquanto cruzamos o andar.
- Planeja ficar o passeio inteiro me ignorando, Olívia? Que falta de educação, só porque eu venci você naquela partida de xadrez.
- Você derrubou o meu cavalo.
- Ele estava em um lugar péssimo, não entendo como não percebeu aquilo.
- Acredito que é porque faço o dobro das suas atividades escolares e não tenho o maior tempo do mundo para jogar um jogo de estratégia. Diferente de você, eu não realizo apenas as aulas obrigatórias, preciso liderar, coordenar, ajudar, ensinar e ainda manter uma rotina para os meus estudos pessoais. Infelizmente - disse sarcasticamente - eu não tenho tempo para encarar as estrelas, entende?
Seu sorriso ergueu-se de um lado, ele me encarou e logo em seguida colocou a mão na testa dramaticamente.
- Ai, minha nossa como ela é ocupada - Disse virando o rosto pro outro lado - Sabe Via, às vezes...
- Não me chama de Via!
Disse por impulso. Ele se assustou pela repreensão repentina e interrompeu seu andar. Fazia muito tempo que ninguém me chamava por esse apelido, eu preferia não me lembrar daquela época.
Ele ergueu as mãos na lateral do corpo em sinal de rendição.
- Foi mal.
Um silêncio constrangedor instalou-se ao nosso redor. Olhei para as janelas absorvendo o calor do dia, ouvia nossos pés sobre o chão e os pássaros cantarem sutilmente.
- Perdoe-me, não foi minha intenção - Disse me desculpando e olhei para o seu rosto.
Erick era bonito, não podia mentir, mas ele era insuportável.
Seus olhos eram castanhos escuros, com pálpebras duplas e cabelos sedosos e finos, muito finos. Ele usava alargadores de bronze que ficam disfarçados com seu tom de pele, no septo tinha uma argola fininha e suas sobrancelhas eram preenchidas.
Ficamos um bom tempo perambulando pela escola, quietos, suportando a presença um do outro.
- Não me leve a mal, você não foi escolha minha. Recebi a notícia ontem, não sabia que elas estavam com pressa para que isso acontecesse - Apontei para nós dois.
Ele suspirou e sua feição ficou mais séria que antes.
- Quem te deu a notícia? - Erick me perguntou.
- Patrícia, minha orientadora.
Ele fez uma careta.
- Sua orientadora é a Patrícia, meu Deus, agora tudo faz sentido.
Tentei não revirar os olhos.
- Os meninos têm orientação? - perguntei levemente curiosa.
Descemos as escadas. Durante a troca de aula alguns alunos passaram por nós, encarando curiosos pela aproximação repentina.
Giselle e Camile com certeza estariam soltando fogos se me vissem desse jeito.
- Sim. Lembra do Fritz?
Eu franzi o cenho tentando resgatar uma memória muito antiga.
- Aquele Fritz? - Perguntei com apenas um em minha mente.
Ele soltou uma risada.
- Aquele que caiu na lama tentando agarrar uma das crianças no fundamental - Erick relembrou - Ele não mudou muito, cinco fios de cabelo na careca e gordinho.
- É errado falar assim de um funcionário, não acha? - Chamei sua atenção.
- Eu só estou descrevendo sua aparência da forma mais fiel existente.
A criança que ele tentou pegar na época era a Eva, tínhamos dez anos. Eu tinha uma vaga memória desse dia, não me lembro o motivo desse acontecimento, eu assisti pela janela durante a aula de línguas.
Era estranho conversar com ele, não havia nada de comum nessa situação a não ser o fato de estarmos no pódio acadêmico.
Fomos para o jardim, estávamos andando na estreita calçada de pedras que se formava logo depois da entrada principal. O dia estava fresco, o sol iluminava todo o lugar e a arquitetura clássica esbanjava o amarelo dourado.
Respirei fundo inalando toda a natureza à minha volta.
- Olívia - Eu olhei em sua direção, não éramos tão diferente de altura, chegava na altura de sua nuca. - Nenhum de nós escolheu estar aqui, ok? - Ele fez um gesto apontando para si e depois para mim - Mas acredito que é a nossa escolha saber lidar com isso.
Ver ele todos os dias, ter aulas com ele, dançar ao seu lado e no final subir naquele altar...
Eu espantei o pânico que veio junto com esses pensamentos.
- Aliás, não é tão ruim olhar as estrelas. - Ele Disse tentando aliviar o clima.
Suspirei.
- O que você quer saber sobre mim?
- Sei lá - Ele deu de ombros - Me conta do que você gosta.
Eu não tinha nada em mente, precisei pensar um pouco. Erick percebeu e franziu as sobrancelhas.
- Nossa, você mudou bastante desde o fundamental.Nota da autora
Oi amores, tudo bem? Faz tempo que não nos falamos, espero que todos estejam bem e tenham sentido falta de Garotas do Éden.
Minha rotina tem sido bem corrida esses dias, tenho tido nem tempo para mim mesma por isso dei uma sumida. Semana que vem tenho prova, sábado tenho um evento do ballet e ainda preciso do ingresso para o show da Taylor (prioridades ok)
Enfim, como eu sei que às vezes o wattpad n comunica todos capítulos, aviso que antes desse temos mais dois capítulos recentes!!
Estarei postando no instagram tbm algumas artes e rascunhos dos personagens, acho que é interessante compartilhar o processo criativo.
Bjs bjs, aguardem para mais!
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𝐆𝐚𝐫𝐨𝐭𝐚𝐬 𝐝𝐨 É𝐝𝐞𝐧 - Saga Moëbius
FantasíaGarotas do Éden é uma ficção distópica ambientada em uma realidade em que adolescentes estudam em um colégio interno para tornarem-se pessoas perfeitas. Porém, as coisas começam a dar errado quando Eva descobre um novo mundo em que as pessoas podem...