Desprezo

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Marília:


Cá estou eu, mais um dia em uma obra pesada. Céus! Como estou cansada. Azar o meu, hoje ainda é terça-feira. Temos muito trabalho pela frente.

Estava suja de tinta e suada. Minhas mãos doíam e minha cabeça pegava fogo pelo Sol de quase quarenta graus. Mas persisto.

- Ae loirinha, chegou o motivo do seu infarto. - Murilo me zoa.

Rio sem entender o que ele disse. Eu realmente estava concentrada no que fazia. Modéstia parte, mesmo sendo uma mulher jovem, sou uma ótima pintora! Sem contar nas casas que já construí. Todos amam meu trabalho. Me sinto honrada por isso.

Olhei para trás, e então entendi a fala de Murilo: a ruiva saia da sua range rover branca com seus cabelos ao vento. Como ela é linda!

Mas eu não tenho chances... Nem me comparo ao seu namorado que acaba de sair também do mesmo veículo: Senhor Zor. Ele pega sua mão e sai exibindo ela como um troféu. Se sente poderoso. Isso me entristecer.

Ela me olhou. Lembrou de mim. Fechou a cara e me chamou até o escritório. Feliz pelo mínimo, peguei minha toalhinha e limpei meu rosto, indo até o banheiro e lavando as mãos. Até poderia me arrumar um pouco, mas, de qualquer forma, eu continuaria toda lambuzada de tinta.

Vou até sua sala e, antes de dar o segundo toque na porta, ouço sua autorização. Entrei e sua secretária saiu. A olhei sorridente, até um pouco ofegante pelo trabalho braçal. Ela me olhou fria e seria.

- Sim, senhorita? - Digo me aproximando, mas ela levantou sua mão pedindo-me para parar onde estava. Obedeci.

- Qual o seu problema? - Começou, e com seu tom mais frio e preconceituoso, continuou: - Onde achou meu endereço pra mandar aquelas flores ridículas? Me esqueça! O que tivemos no passado, ficou no passado!

Aquilo me quebrou. Abaixei minha cabeça olhando minhas mãos, respirando fundo.

Eu realmente precisava esquecer o que aconteceu entre nós no colegial. Pra ela foi só uma transa. Pra mim, a melhor noite da minha vida. Sabe do meu amor e mesmo assim pisa com seu salto alto nele querendo-o cada vez mais.

- Senhora, eu... - Ela me corta.

- Escuta bem, Marília: - Ela se aproximou de mim, encostando-se em sua mesa, olhando-me com desprezo. - Eu não vou me deitar com você. Olha pra mim...! Veja como eu sou e agora olhe pra você. Eu tenho um namorado rico enquanto você é uma pobretona que vive pintando e emassando por aí. Não estamos mais no mesmo nível. Eu jamais me sujeitaria a deitar-me ao seu lado. Olha suas mãos... Não servem nem pra me fazer um carinho.

Ela tinha razão...

Eu nunca teria chances com ela nesta condições. Agora ela está em alta sociedade, e eu continuo contando os centavos para comprar um pão. Minhas mãos jamais serviriam pra lhe fazer um bom carinho em seu rosto tão lindo. Estão cheias de machucados, unhas sujas de cimento. Eu não tenho nada a oferecer. Não tenho nada além do meu amor e cuidado. Mas pra ela o amor tem cores diferentes em forma de um papel valioso, cartões sem limites e finais de semana em shopping caro.

Eu não tenho nada que a atraia para mim.

Magoada. Quebrada e devastada. Me encontrava desse jeito. Mas, após por um sorriso no rosto segurando as lágrimas nos olhos, eu a olhei.

- Você não gostou das flores? Eu comprei aquelas que você tanto amava quando estudávamos. Você dizia que eram lindas e que seu sonho era recebê-las. Eu gastei metade do meu salário nelas... - Rio baixo magoada.

Um Louco | Mailila Onde histórias criam vida. Descubra agora