2. Cena De Microonda

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   (Tradução: jantar de micro-ondas)

   Roier e Bobby andavam lado a lado até sua casa. Não era muito longe, alguns quarteirões e eles estariam na fachada de seu apartamento. Era um caminho comum para os dois, que faziam completamente a pé. Todos os dias era Roier que buscava o menino na escola e, por não ter carro, eles caminhavam para o lar. Ele até poderia pagar um Uber, mas Roier gostava de compartilhar aquele pequeno momento junto de Bobby. Era um momento que Bobby falava todas as coisas que havia feito na escola e Roier contava sobre clientes chatos. Ele sentia que era o momento que se ligava a Bobby.

   Naquele dia, entretanto, Bobby não abriu a boca. O menino de macacão jeans estava emburrado pelas coisas que tinham acontecido. Ele só queria voltar no tempo e ter dado um soco mais forte naquele pivete. Bobby também não falava por medo de lembrar Roier do que ele havia feito. Mesmo com apenas seus 8 anos, ele sabia muito bem como escapar de sermões. E ele nem precisou se esforçar muito, já que o mais velho estava perdido em pensamentos.

   O mexicano estava se lembrando de minutos atrás, quando conheceu um certo alguém. Um homem de cabelos castanhos meio longos, com a franja da frente completamente branca e a feição cansada. Aqueles olhos azuis enfeitiçaram Roier como nenhum outro homem havia feito. E aquelas cicatrizes, uma cortando o meio do nariz e outra subindo do maxilar à bochecha direita, o instigaram ainda mais. O que era aquela mecha branca? Estilo? O que havia acontecido para ter essas cicatrizes? Quem era este homem que fez seu coração errar uma batida?

   Roier se lembrou do modo irritado que Cellbit protegia o seu menino. Como ele parecia maior quando estava brigando por ele. Era cômico ver o garoto tão magricela se impor de maneira tão brava. Era estranho comparar aquele Cellbit com o que viu na recepção. Há poucos minutos de bater no peito e encarar aquele problema, Cellbit parecia um gatinho envergonhado pelo espirro tão fininho. Roier riria dele, se não tivesse achado tão adorável as bochechas do castanho se avermelharem.

   Se lembrou, principalmente, da conversa que haviam tido na frente do portão da escola. O caminho até ali havia sido silencioso, pareciam não querer que ninguém escutasse o que tinham a dizer.

   — Me passa seu número.  — Cellbit falou abruptamente, já com o celular em mão.

   — Ay, nenhum cafezinho antes. — Roier brincou, vendo as bochechas do outro ficarem rosadas.

   — Não é isso, idiota. — Cellbit abriu o aplicativo de mensagem e deu o celular para Roier com a adição de um novo contato já aberta. — Temos que unir esses dois, então preciso do seu número.

   — Sì, sì. Entendo. — Roier piscou com um dos olhos, fingindo não acreditar que esse era o real motivo. Colocou seu número e adicionou o seu nome como Roier Guapito com um coração rosa ao lado. — Aqui.

   — Obrigado. Vou falar com meus irmãos e vamos marcar algo. — Cellbit nem sequer olhou para a tela do celular, só o colocando de volta no bolso. Roier não se frustrou com o fato. Com certeza poderia desfrutar de sua reação em outro momento. — Quando está livre?

   — Quando você quiser. — Sorriu galanteador. Bobby, já não aguentando mais, deu um chute na canela de Roier. — Ai! Micoso miserable.

   Roier segurou sua canela enquanto ouvia as crianças darem risadas. Olhou para cima, tentando buscar algum tipo de ajuda no outro mais velho, achando-o com a mão escondendo o sorriso em seus lábios. Não pode deixar de notar o quanto isso era fofo no rapaz, deixando de lado a irritação pela dor.

   — ¡Para de coquetear! Quiero mi casa. — Bobby disse de maneira irritada. Roier olhou instintivamente para Cellbit, querendo notar alguma reação ao que seu protegido dissera. Ele ficou até meio vermelho achando que o outro entenderia espanhol. Mas Cellbit não esboçou sequer uma reação, o deixando mais aliviado.

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