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Será que pedir uma vida sem conflitos é pedir muito? Além de estar com raiva e triste por causa dessa discussão idiota, ainda tenho que aguentar a fome. O que consigo fazer sem problemas, mas não vou descer para a cozinha tão cedo. Ao me sentar na cama, percebo que deixei uma mensagem de Levi sem resposta.
— O que faz por aí?
— Meio puto. — Respondi. Não demorou um minuto para ele responder.
— Eita, o que houve?
— Acabei discutindo com meu pai, o que poderia ter sido evitado se minha mãe não tivesse inventado mentiras sobre mim.
— Que merda, sinto muito por isso.
Suspirei, sentindo meu estômago roncar.
— Infelizmente, já estou acostumado. Deixei o jantar para trás e voltei para o quarto. — Deitei-me na cama, e logo ouvi minha mãe batendo na porta com tanta força que parecia que a porta poderia cair.
— Kevin?! Você não vai comer? — Ela bateu novamente.
Abri a boca para responder, mas a fechei ao ouvi-la dizer:
— Ingrato, fica com fome então, imbecil.
Escutei-a descer as escadas, fechei os olhos e enchi os pulmões de ar, soltando pela boca. O que eu fiz para merecer tanto desgosto? Pensei, mas não havia resposta. Voltei a minha atenção para a conversa com Levi.
— Você está sem comer desde que horas?
Eu realmente não havia comido nada o dia todo. Agora entendo por que estava com fome.
— Bom, não comi nada hoje, só comecei a sentir fome agora. — Sorri meio sem graça ao enviar a mensagem.
— Porra? Você tá maluco? Quer morrer é?!
— Só se for de desgosto.
— O que você tá fazendo agora?
— Perguntou ele novamente.
— Apenas deitado... Por quê?
— Tá afim de fugir um pouco daí?
Refleti. Já estou bem encrencado depois de discutir com meu pai. Sair de casa sem permissão "de novo" seria arriscado. Embora eles nunca descobriram que eu faço isso, se um dia acontecer, eu tô fodido. Mas não vou parar por causa disso; eu não estava bem ali deitado, e sair um pouco seria uma ótima opção para esfriar a cabeça.
— Agora?
— É, agora! Consegue?
— Meio arriscado, mas vou tentar sair sem que me vejam. — Fui direto, sem questionar.
— Estarei te esperando no calçadão. Levantei-me e vesti uma calça, colocando um tênis. Apesar do calor, permaneci com a regata branca que estava vestindo. Não tinha chance de descer pela escada e sair pela porta da frente.
Como meus pais ainda estavam acordados, sair pela janela era arriscado. Eu conseguia sair de casa pela janela do meu quarto até chegar no chão, mas hoje isso estava fora de cogitação. Pensei, então, tem a última alternativa: o porão. Abri a porta do meu quarto e tirei a chave com cuidado, trancando a porta. Olhei em volta; a porta do quarto do meu irmão estava fechada. Desci a escada com cuidado, vendo minha mãe na cozinha lavando a louça, enquanto meu pai dormia na poltrona da sala. Aproveitei o momento e desci rápido, caminhando até a escada do porão.
Abri a porta com cautela. Para abrir a porta do portão, havia uma chave que sempre ficava exposta na parede; peguei-a e abri a porta com muito cuidado para não fazer barulho. Ao trancar a porta, olhei para cima para me certificar de que ninguém estava me observando. Quando me senti seguro, corri até o calçadão. A noite estava quente, mas a brisa do mar trouxe um frescor que aliviou o calor do meu corpo. Encontrei Levi encostado no balaústre.
— E aí.
Disse ele, sorrindo, exibindo suas covinhas.
— Valeu por me tirar daquele inferno. Mais um minuto e eu surtava.
— Não precisava agradecer. — Ele me deu um tapinha fraco no ombro.
Estava de bermuda preta, tênis e sem camisa. Vestiu sua camiseta de cor verde escura quando começamos a caminhar.
— Para onde vamos?
— Eu não faço ideia, mas vamos fazer uma prioridade agora. — Disse ele.
— E qual seria a "prioridade"? — Perguntei, parando de andar.
— Você comer alguma coisa. Deveria estar desmaiado por ficar o dia todo sem comer.
Zombou ele. Sorri e voltei a caminhar. Fomos até uma pizzaria próxima, onde pedimos uma pizza e dois copos de refrigerante.
Só porcaria. Ao pegarmos a pizza, caminhamos mais um pouco até algumas pedras que davam para ver toda a praia lá do alto. Nunca tinha vindo para esse lado da praia e, por ser a primeira vez, gostei. Nos sentamos e começamos a comer, enquanto conversávamos, olhando para o mar, que estava tão escuro que a única coisa visível eram as luzes dos navios no horizonte.
— Vem cá, seus pais não te viram saindo? Levi perguntou, pegando outra fatia de pizza.
— Eles nem desconfiam.
Sorri enquanto tomava um gole de refrigerante.
— Você é maluco! E se eles forem ao seu quarto e não te virem lá?
— A porta está trancada, e eles não vão lá ver se estou vivo. Só vão lá para me cobrar algo ou para brigar. Portanto, estou de boa. — Disse, levando a pizza à boca e mastigando.
— É foda essa situação que você passa. Sinto muito mesmo, mano. — Ele me olhou, franzi a testa.
— Tá tudo bem. A única coisa que estou lutando para fazer é sair daquela casa.
— E pretende fazer isso quando? Tem ideia de quando?
— O mais rápido possível, para ser mais preciso. Mas vou ver isso outra hora. Quanto mais eu penso na situação em casa, mais quero ir embora. Por isso, às vezes, prefiro passar o dia fora de casa do que dentro.
— Vamos começar a sair para você não ter que ficar aturando essas merdas.
Levi tentou me motivar.
— E quais lugares vamos? — Perguntei.
— Bom, sexta-feira vamos a uma festa. O resto da semana a gente vai desenrolando o que fazer, mas vou estar aqui para te arrastar para os lugares.
— Me arrastar? Só não vai me arrastar para o mal caminho. — Brinquei.
— Então você tá fodido. Eu sou o mal caminho. — Ele sorriu, e isso me fez sorrir também, trazendo uma sensação de conforto e ânimo.

Se eu Ficar? Parte 1 - DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora