21 - Você foi muito corajosa.

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— Mas o que? - ouço o capanga gritar surpreso enquanto solta meu cabelo. 

Abro os olhos e vejo Zayn caído no chão, com muito sangue em sua cabeça. Lauren olha para mim e logo depois, mais um tiro. Dessa vez, o capanga foi atingido no braço.

— Coloque as mãos pra cima imediatamente! - uma voz masculina grita com autoridade. Viro meu pescoço para a ponte que fica acima do túnel, a tempo de ver um policial com a arma apontada para nós. O capanga tenta correr e é atingido por um tiro nas costas, fazendo-o cair imediatamente. Alguns segundos depois, duas viaturas chegam até nós e o policial desce para nosso encontro. 

— Um deles está morto, senhor. -um policial diz ao cobrir Zayn com um daqueles cobertores metálicos. - O outro está ferido gravemente e já está sendo levado ao hospital.

Lauren se levanta e se joga nos braços do policial maior, que efetuou os disparos. — Obrigada, obrigada, obrigada. - ela chora em seus braços enquanto um outro policial me desamarra.

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Estamos no hospital, recebendo pontos por nossos cortes. Lauren em seu braço e eu no rosto.

— Você foi muito corajosa. - ela diz me olhando com um sorriso no canto dos lábios.

— Ai! - gemo ao receber o último ponto. - Obrigada, mas você que foi a heroína.

O responsável por fazer os pontos nos dá instruções sobre os cuidados que devemos tomar com a cicatrização e nos entrega receitas prescritivas de analgésicos. Após isso ele diz que precisa falar com meus responsáveis e sai.

— O que você quis dizer quando disse que já sabia que eu iria morrer?

— É uma história longa, Laur. Você nem acreditaria, pra falar a verdade. 

Ela sorri brevemente. — Tenta.

Respiro fundo e tento resumir. — A vida toda, tipo, desde meus dez anos, por aí, eu sonhei com a mesma cena. Era sempre a mesma coisa. Tinha um carro, uma pessoa em pé e outra ajoelhada. A pessoa em pé matava a pessoa ajoelhada, na mina frente, enquanto eu era obrigada a assistir. Conforme os anos foram passando, eu fui ganhando mais detalhes. Tanto dos personagens quanto do local onde tudo acontecia.

— Certo.

— Quando eu conheci você e sua irmã, parece que tudo ficou pior, mais forte, entende? Era como se cada vez que você e eu tivéssemos alguma interação o sonho ficasse mais real. Quando você me tocava eu sentia choque, quando estava perto de você eu sentia meu coração acelerar-

— Isso só quer dizer que você é apaixonada por mim. - ela me interrompe com um sorriso no canto dos lábios.

— Pode ser, isso aconteceu depois. - falei sem pensar e ela ergue as sobrancelhas - ENFIM, até que os meses foram passando e eu fui tendo detalhes específicos sobre o acidente. Eu sabia que aquele carro estaria envolvido desde a noite do baile, porque me trouxe nele. Sabia onde seria porque... não sei, só sabia. Não, na verdade, quando nos encontramos no pub eu achei tudo muito familiar. Além disso, quando eu estive em seu quarto pela primeira vez eu vi um casaco xadrez e apaguei. Depois daquilo, todas as vezes que eu sonhava, a pessoa a morrer estava com o casaco.

— Assustador.

— Até o dia em que discutimos naquele beco e você me beijou.

— Também não foi assim! - ela quis se defender

— Foi sim! Nesse dia eu tive a maior revelação e vi que era o seu rosto. Você morria com o rosto coberto de sangue e eu tinha que assistir isso tudo até alguém me matar também. Você pode perguntar para a Taylor ou para a Dinah, eu sempre sonhei com essas coisas.

Ela absorve em silêncio. 

O policial que nos salvou aparece na porta. — Toc toc. Estou atrapalhando?

— Claro que não, senhor. - eu respondo gentilmente ao homem que salvou minha vida.

— Como vocês estão? - ele entra no quarto e abraça Lauren. Achei estranho.

Antes que eu pudesse responder, um enfermeiro aparece na porta. — Senhor Jauregui, o responsável por Karla Camila está aqui fora.

Olho para Lauren, que sorria enquanto abraçava o homem. — Nunca te contei, né? Esse é meu pai.

— Michael Jauregui a seu dispor, madame. - ele aperta minha mão e meu queixo cai. - O dever me chama.

— Seu pai é o capitão da polícia de Miami? - perguntei incrédula assim que ele saiu para falar com meu pai.

— É isso aí. - ela sorri e se levanta da cama onde estava sentada. — Vamos?

Saímos do quarto juntas e pela primeira vez, o arrepio que sinto perto dela é somente pelo hospital ser gelado.

— Por que aquele casaco xadrez estava no carro se sua irmã disse que estava no cesto?

— Aquele carro era da equipe do Zayn. A gente usava quando tinha uma "missão". Quem era da equipe tinha que usar um casaco xadrez, mas isso foi só no começo. Ele quis tentar uma coisa de gangues estilo GTA San Andreas. - ela ri e eu finjo que entendi sua referência.

— O fato de ele ter morrido te deixa livre?

Ela murcha por alguns segundos. — Eu não sei. Ele era o cabeça de muitos esquemas e o traficante mais procurado de Miami. - meus olhos se arregalam. - Eu no começo me envolvi com ele por rebeldia, mas depois eu quis me infiltrar e juntar informações pro meu pai.

— E ele não descobriu? Seu pai, no caso.

— Camz, acho que sim. Digamos que não é a primeira vez que ele salva minha bunda.

— Mas, se ele era o principal de toda a cidade, por que se esconder em um barzinho no centro?

— Você suspeitaria? 

— Touché.

— Se fosse em uma boate badalada com dançarinas e seguranças na porta, todos suspeitariam. Aliás, sinto muito pelo seu rosto. - ela passa seus perto dos pontos.

— Eu sinto muito por sua barriga. - ela levanta um pouco sua camisa, me dando uma visão de seu corte. "Tanto faz, não estragou nada aqui dentro" ela diz como se não fosse nada. — Oi papai. - digo hesitante ao ver meu pai se aproximar.

Ele me abraça forte e diz o quanto estava preocupado comigo. Olha brevemente para Lauren, que estava sem jeito e dispara — Toda vez que venho buscar minha filha aqui você está no meio.

— Pai! - o repreendo ao notar que isso deixou Lauren sem graça.

— Não vai mais acontecer, senhor. - ela diz de cabeça baixa.

— Eu espero que não, você não é boa influência pra minha filha, vive se metendo em confusão.

— Temos um problema? - senhor Jauregui apareceu com as mãos na cintura

— Eu estava apenas dizendo para essa jovem delinquente que ela não serve para ser amiga da minha filha. Aposto que não vem de boa família, para estar agindo assim.

Me afasto do abraço dele, com raiva. 

— Essa "jovem delinquente" é minha filha, senhor Cabello. - meu pai endireita a postura

— Ela estava trabalhando como agente infiltrada para derrubar o maior traficante de Miami. Ela foi muito corajosa e me protegeu o tempo todo! Eu não sabia que ela era agente dupla e tentei ajudar ela a sair dessa vida. Ela sempre me disse pra ficar fora disso, que eu não entendia o que estava acontecendo e ela estava certa. Ela foi esfaqueada pra me proteger, papai. Ela é sim uma boa influência e vamos continuar nos vendo, até porque ela é irmã de uma das minhas melhores amigas.

Sutilmente segurei a mão dela.

— Vamos embora, Camila. Em casa conversamos.

Respirei fundo, já sabendo o que estava por vir.

Eu vi você morrerOnde histórias criam vida. Descubra agora