22 - Você não é Jesus!

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Chego em casa completamente cansada e dolorida. O dia foi o mais louco que eu já vivi. 
Despisto meu pai enquanto ele guarda o carro e vou tomar um banho rápido. Assim que saio, dou de cara com dona Sinu, que me agarra e aperta como se estivesse tentando fazer suco de Camila.

 — Mamãe, tá doendo...

— O que doeu foi meu coração ao saber que você foi feita refém! O que aconteceu, Camila?

Respiro fundo e antes de contar, meu pai aparece.

— É, pode ir contando tintim por tintim de como você foi parar no meio disso, dona Camila. - ele diz com aquele tom de quem acusa. 

Me sento no sofá, de frente pra eles e tento resumir.

— Mamãe, lembra dos sonhos que eu ficava tendo o tempo todo? - ela acena - Com o passar dos meses, desde que eu conheci a Tay e a irmã dela eu consegui ter mais detalhes desse sonho, a ponto de saber quem estava morrendo, onde, como e quase quando. Era a Lauren, irmã mais velha da Tay.

— E daí? Você teve um sonho e foi atrás de perigo? - meu pai

— Depois de um tempo convivendo com os Jauregui eu percebi que são uma família muito querida, que sempre me acolheu e me ajudou. Eu gosto da Lauren, da Taylor, da Clara e principalmente do Michael, que salvou minha vida. Eu odiaria deixar algo acontecer sabendo que posso evitar.

— E como você "evitaria" isso, mi hija? - minha mãe perguntou se sentando ao meu lado

— Se eu sabia onde ela morreria e a roupa que ela usaria no dia, eu poderia fazer ela ir pra outro lugar. Eu fui atrás dela em um... pub em Little Havana-- 

Meu pai fica incrédulo e grita comigo. 
Como se eu já não tivesse passado por coisa o suficiente hoje e não fosse umas dez e meia da noite.

— Alejandro, se acalme por favor, vai acordar a Sofia.

— Me acalmar? Sinuhe, está ouvindo sua filha?

— Deixa ela terminar, Alejandro! Continue, filha.

— Eu entrei e dei de cara com um capanga do Zayn, o cara que morreu. Ele me reconheceu-

— Como ele te reconheceu? Já esteve lá antes? - meu pai pergunta com as sobrancelhas arqueadas.

— Eu fui com a Dinah para esse pub uma vez, totalmente por acaso. Lá brincamos em um touro mecânico, dançamos e cantamos, só isso. Como o Zayn usava aquele local para se esconder, o capanga ficou de olho em todos que passaram. Quando estávamos saindo de lá, eles queriam mexer com a gente, e a Lauren não deixou. Por pura coincidência, ela também estava no pub no dia e viu a gente, por isso foi nos ajudar.

— Camila, Camila. Você está mentindo pra mim. - ele me acusou balançando a cabeça e eu só respirei fundo. Minha mãe o cutucou, pedindo para que se calasse.

— Aí eu pedi pra ele me deixar ver a Lauren e como ele já tinha me visto com ela, ele deixou. Me levou até a sala secreta do Zayn e eles estavam lá. Eu fui falar com ela enquanto ele usava o celular e disse que era pra ela confiar em mim pois eu queria ajudar. Ela ficou muito brava comigo por eu estar lá. Tentamos ir embora mas ele não deixou, disse que não confiava em mim pra mal chegar e já ir embora. Ele achou que eu estava lá pra denunciar ou algo assim. Na mesma hora a Taylor me ligou e ele me mandou atender no viva-voz. Tentei enrolar ele, dando respostas curtíssimas e sendo grossa, pra ela entender que não tava tudo bem. Por sorte ela entendeu e fez alguma coisa pra ajudar.

— E então? - minha mãe

— Então ele disse que eu teria que matar uma pessoa se quisesse sair de lá viva. - meus pais arfam - Nos levou para uma sala no porão com um homem pendurado e disse que eu tinha uma bala para matar ele. Se eu errasse, morria. Lauren me ajudou a mirar e me instruiu a atirar nele. Foi o que eu fiz, atirei no Zayn e então conseguimos fugir de carro. Eles nos perseguiram até que conseguiram nos pegar, e foi aí a história de ser feita refém que vocês ouviram...

— Eu não sei nem o que dizer. - minha mãe suspirou me abraçando.

— Eu sei. Essa família é só encrenca. Camila, você não é Jesus para querer salvar todo mundo. Isso quase custou sua vida!

— O amor molda as pessoas, e eu amo aquela família.

Discutimos mais um pouco até que consegui ir pro meu quarto. Penso em ligar para Dinah mas lembrei que estou sem celular. Respiro fundo e uso meu notebook para deixar uma mensagem para ela, dizendo que aconteceu muita coisa e preciso contar para ela. Aposto que a Taylor já contou mesmo assim.

Tento dormir pois afinal o dia foi tenso e traumático. Eu definitivamente quero terapia agora.

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São 9h da manhã, não fui para a escola.

Estou no meu quarto, existindo. Ouço a campainha tocar mas nem me mexo.

— Oi Kaki - Sofi entra em meu quarto, esfregando os olhinhos. 

— Oi meu amor. Como você está? - a pego no colo e fungo seus cabelinhos cheirosos

— Eu tô com fome. Você tá dodói? - ela cutuca meus pontos no rosto.

— Meu amor, nunca mais faça isso, ok? Dói muito. Eu caí e acabei me cortado, nada de mais. Que tal tomarmos café? 

Ela se anima e então desço as escadas, a segurando. A campainha toca mais uma vez e mudo a rota para a porta.

— Oi. - Lauren diz sem jeito.

— Oi! - digo animada em vê-la

— Oie - Sofi se intromete 

— Meu amor, por que não vai lá na cozinha e pega uma banana pra Kaki? - ela desce de mim e vai saltitando até a cozinha. - Como você está? Quer entrar?

— Não, não, não. E encontrar o seu pai? Valeu, vou passar. Eu só vim te trazer uma coisa.

— O que?

Ela dá alguns passos para o lado e pega uma cesta de café da manhã. Sorrio imediatamente com isso. Arregalo os olhos ao notar a presença de um celular de última geração dentro dela

— Isso é uma lembrancinha pelo que fez por mim ontem. Eu meio que devo minha vida a você.

— Ao seu pai, isso sim. - respondo rápido, olhando a cesta - Entra aí, meu pai não está.

Ela hesita mas entra.

— Casa bonita.

— Igual a mim.

— Sim.

— Kaki, não achei banana. Uau, o que é isso? - Sofi se anima com a cesta.

— Você quer, amor? Pode comer o que quiser. - coloquei a cesta sobre a mesa.

 — Bom dia, meninas. - minha mãe aparece na cozinha. — Você é a filha do Michael Jauregui, não é? - Lauren diz que sim com a cabeça - Eu reconheceria esses olhos verdes em qualquer lugar. Fique à vontade!

— Lauren - ela volta sua atenção a mim - como está a Taylor? Contou pra ela?

— Contei tudo, mas aposto que ela vai querer ouvir a sua versão mesmo assim.

— Posso pegar isso pra mim? - Sofi diz com o celular em mãos.

—Claro que não! - peguei de sua mão e ela me chamou de chata - Não precisava comprar um celular novo pra mim...

— Claro que precisava, o seu virou pó. O mínimo que posso fazer é isso.

Sorrio para ela, que pisca para mim.

— Toma - Sofi lhe entrega um biscoito integral e Lauren sorri - Você não tem cor, precisa comer coisa gostosa.

Acabo rindo de sua fala ao ver Lauren desfazer seu sorriso para dar lugar à uma expressão de incrédula.

Eu vi você morrerOnde histórias criam vida. Descubra agora