Admit

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Aonung não estaria na cozinha se não estivesse sozinho em casa. Ele havia caçado uma ave pela manhã e coletado algumas especiarias na floresta, e picava ervas para o tempero, sabendo que Ronal não aprovaria que ele cozinhasse.

Aproveitou que a mulher se ocupava em uma reunião e usou o tempo livre para preparar algo para o banquete após os rito de iniciação, o assunto mais comentado do momento entre os aldeões. A iniciação era uma série de testes que ocorria apenas uma vez ao ano durante as marés altas, mas que, por decisão do conselho, foi antecipado para aumentar o contingente de guerreiros devido as ameaças de conflitos com o povo das cinzas.

O ambiente estava repleto de aromas deliciosos, resultado dos esforços excepcionais de Aonung. Havia um fogão onde a lenha queimava pelas brasas, apesar de ser costume consumir apenas alimentos crus. Haviam poucos recursos no recife, então só utilizavam o fogo em ocasiões especiais, mas Aonung lembrou de ouvir Neteyam e Lo'ak comentando de como sentiam falta de comer alimentos cozidos com frequência, então tratou de providenciar a lenha sem que ninguém soubesse.

Enquanto suas mãos habilidosas misturavam o tempero ao corpo da ave, ele não conseguiu evitar que um sorriso se formasse em seu rosto ao imaginar a expressão no rosto de Neteyam.

Espalhou as folhas na panela para refogar, empolgado, sabendo que aquilo o surpreenderia porque ele nunca esperaria algo do gênero. Neteyam, por ter completado dezoito anos naquele ano, participaria da iniciação para ser reconhecido pela tribo como guerreiro. Aonung já conhecia bem os testes e havia se preparado durante a adolescência, não era nenhuma novidade para ele, mas para Neteyam não era o mesmo. Ele seria submetido a provas feitas para navi's com corpos e habilidades muito diferentes dos dele, para as quais ele não foi preparado, e em um ambiente também nada favorável. Então caso ele falhasse, o que era o mais provável para Aonung, ao menos teria como confortá-lo sem ter que pensar ou encontrar as palavras certas para consolá-lo, já que ele não era nada bom nisso.

"Quem não fica feliz comendo uma comida deliciosa como essa?" Ele espremeu uma fruta ácida. Vendo o suco cair sobre a carne que já dourava na panela, sentiu a boca salivar e lambeu os lábios, para depois abrir um sorriso de satisfação.

Aonung escondia sua paixão pela culinária, e mesmo que tivesse começado a cozinhar como uma maneira de expressar seu afeto pelos que amava, evitava até que sua irmã soubesse para evitar uma conversa sobre o assunto. Durante anos, ele mal tocou nos utensílios culinários com medo de ferir mais alguém, e esperava do lado de fora da cozinha quando alguém estava cozinhando. Também era incentivado a acompanhar as atividades do Olo'Eyktan, então quase sempre não se alimentava em casa. Ele preferiu evitar fazer algo que gostava, tanto pela desaprovação de Ronal, quanto pela angústia do passado, e apenas cozinhava escondido para si próprio quando estava cansado de comer as mesmas coisas todos os dias, ou para se divertir como fazia quando era criança.

Era um hábito privado que ele mantinha. Não costumava compartilhar com ninguém e nem em ocasiões específicas, como festas e comemorações, até ter a súbita vontade de agradar Neteyam para caso ele falhasse nos testes.

"Não tem consolo melhor que esse." Ele sorriu orgulhoso. Jogou o caldo no fundo da panela para cima da carne com a colher, e fechou os olhos para sentir o delicioso aroma.

"Tem sim."

Aonung reconheceu a voz e o tom malicioso e seu sangue gelou. Virou para trás de supetão, com os olhos arregalados. Droga! Pensou.

"O que é isso aí?" Neteyam deu alguns passos na direção dele, com o olhar curioso voltado para a panela.

Ele agiu rápido, segurando o fôlego. Bateu a tampa na panela com mais força que o necessário, e olhou para ele como alguém que fosse pego fazendo algo errado. Pensou por um milésimo de segundo, e então abriu um sorriso dissimulado, porém doce.

𝐀𝐖𝐀𝐊𝐄  •  neteyam x aonungOnde histórias criam vida. Descubra agora