Prólogo

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2009


Odiar a escola é algo muito comum entre adolescentes, mas ele não odiava da boca pra fora, ele o fazia de todo coração.
As vezes desejava explodir o lugar, tirando somente as pessoas que gosta.
Que são poucas, visto que ele quase não tem afinidade com muita gente.

A saudade da França bate todo dia. Lá ele tinha amigos, gostava do colégio e, claro, falava uma língua que domina. Seja o inglês ou francês.
Bom, não é que ele não fale português, ele fala, mas não tão bem. A gramática é um terror.

Futuro do pretérito imperfeito, que droga é isso? Ele nem sabe dizer.
Porquê seu pai tinha que inventar de vir para um país que nenhum de seus filhos conseguiriam viver de boa?
Após quase sete anos no país, ele consegue conversar, mas ainda é ruim. O básico da língua portuguesa que escutava os pais falando antes de vir para cá, não era o suficiente.

Está começando mais um ano letivo, no mesmo colégio que os outros anos, só há uma diferença.
Foi chamado na diretoria no primeiro dia.

É, ótimo dia.

- Então, Snodiny. Com autorização dos seus pais, tomei a liberdade de conseguir um aluno pra te ajudar esse ano.- A diretora, Eliana, começa a falar assim que o garoto se senta à sua frente.- Porém, será uma via de mão dupla. Ele voltou a estudar esse ano, né? Teve que parar por motivos pessoais e agora voltou. Ele é péssimo em exatas. Meu ponto é: uma mão lava a outra. Tudo bem pra você?

Balançando a cabeça devagarinho, ele concorda. Estava com a mochila preta sobre as pernas. Não iria negar, claro que não. Isso podia ser útil, não somente para si.

- Tudo sim. Pode ser bom, eu agradeço.

- Não precisa agradecer, estamos aqui para te ensinar e ajudar.

A conversa com ela não dura tanto, logo eles saem dali. Indo em direção ao local onde o novo amigo de Ravi estaria.
O adolescente segura a alça da mochila com força. Se já era difícil fazer uma amizade normalmente, quem dirá uma forçada.

Os dois entram na biblioteca da escola e é ali que Ravi o conhece.

Uniforme igual ao seu, os cabelos cacheados estão cortados baixinhos e a barba está começando a crescer.

- Bom dia, Michel. - Assim que a diretora o cumprimenta, o outro rapaz os olha. Ele está abaixado perto dos livros de literatura, segurando dois exemplares: A Divina Comédia e o Pequeno Príncipe. - Esse é Ravi, o garoto que falei mais cedo.

Michel fica de pé, é mais alto que Ravi, com certeza uns vinte centímetros maior que ele. Olhos verdes esmeralda, pele parda, quase caramelo e um sorriso bonito. Muito bonito, na opinião de Ravi.
Colocando os livros na estante, estendendo a mão para o colega, ele sorri.

- Oi, prazer em conhecer você. - Ravi aperta sua mão. - Muito legal conhecer um japonês.

Ravi revira os olhos, é, ele odeia isso. As pessoas não se lembram que existem muitos países na Ásia.
A diretora sorri, sua parte está feita, então ela somente sai dali.

Ravi tem os cabelos pretos, liso como todos asiático, pele clara e os olhos pequenos. A boca é bem desenhada e ele não é tão alto - Ainda -, tem um corpo bem definido, pois ele faz aulas de dança há anos.
Não é tão diferente dos asiáticos que vemos por aí.

- Prazer em conhecer você também. - Ele afasta a mão, a colocando de volta na alça da mochila. - Não sou japonês. Nem pareço um.

O rapaz moreno franze as sobrancelhas.

- Chinês? - Ele tenta novamente. Virando um pouco a cabeça, em dúvida.

Ravi olha para a prateleira de livros, tocando com a ponta dos dedos um exemplar de O Crime Do Padre Amaro. Ele detesta esse livro.

- Oh, mon Dieu! Sabia que existem mais países na Ásia? Não só esses e não, também não sou coreano.

Sua resposta é até calma, visto que isso sempre acontecia. Quando não faziam piada sobre ele ser parente do Jackie Chan.
Pegando outro livro que há ali, literatura brasileira, ele se prepara para ir para perto de sua sala de aula.

Michel o segue, claro.

- É o que, então?

É, seria um grande ano. Ele se vira para o mais alto, olhando em seus olhos - Talvez, somente talvez tenha achado a cor linda.-, ele solta um sorrisinho.

- Tente descobrir, Mon Cher.

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