O Lótus e o Tridente

Adoração

Kiri abriu os olhos, sua visão um pouco turva e sem foco, mas forçou seus olhos para que pudesse enxergar alguma coisa que não fossem borrões, piscou algumas vezes, olhando ao redor, não reconheceu o quarto, não reconhecia nada... Seus olhos se demoraram no par de olhos escuros e ansiosos da garota que permanecia atenta no pé da cama, sentada na beira, segurava uma bandeja de chá nas mãos.

Kiri piscou mais algumas vezes. 

-Por favor, não faça muito esforço, você precisa repousar. -Sussurrou a garota.

-Onde... -Kiri sussurrou com dificuldade, engoliu em seco, levou a mão à garganta. 

-Procure não falar muito. -Recomendou. -Aqui, beba este chá, vai melhorar sua dor de garganta. 

Kiri hesitou por alguns segundos mas aceitou o chá que a garota estendia na direção dela, se ajeitou na cama e bebericou cautelosamente o chá.

O sabor era divino, dentro dela o chá fez despertar memórias há muito esquecidas, um chá que ela costumava tomar no templo de sua senhora... Mas aquele não era o templo dela. 

-Onde eu estou? -Kiri sussurrou, o chá fazendo seu corpo vibrar, ela bebeu um grande gole.

-Está segura, finalmente. -Respondeu a garota, que mantinha a mesma expressão ansiosa no rosto de coração, Kiri semicerrou os olhos, deu um pigarro.

-Eu... Não me lembro deste lugar...

-Creio que você nunca tenha entrado aqui antes... Pelo menos não enquanto eu estive aqui em vidas anteriores. -Respondeu a garota. -Eu não teria esquecido de alguém como você por aqui. 

-Eu tenho tantas perguntas... -Kiri esfregou os olhos com a mão, baixou o chá, colocando-o entre as coxas. -Onde eu estou? Quem é você? Por que minhas mãos estão tão esqueléticas...

-Está no território do Clã das Matas. -Respondeu a garota, Kiri arregalou os olhos, prendeu a respiração. -Me chamo Niyati. E você está bem debilitada, pois ficou tempo demais sendo refém de uma criatura.

-A minha senhora. -Kiri a interrompeu, ofegava, tentando acessar suas memórias, mas tudo parecia muito embaçado e embaralhado em sua mente. -A Senhora das Armas... Ela...

-Ela quem foi resgatá-la, ela está bem, se quer saber. -Niyati respondeu, sua mão pousou gentilmente sobre o tornozelo de Kiri. -Você quer que eu lhe conte tudo o que aconteceu? Não quer comer algo antes? 

-Por favor, me conte... A última coisa da qual me lembro é de andar pela floresta à noite e ser arrastada por algo extremamente forte e assustador... Depois disso só há uma vasta escuridão em minha mente.

-Há mais ou menos três semanas, Shankar foi até o território do Clã das Lâminas para notificar a queda do falso deus... -Niyati começou. 

Kiri ouviu tudo enquanto Niyati a ajudava a se alimentar, enquanto ela penteou seus cabelos, vestiu-a com roupas limpas. 

-Ela venceu aquele demônio sozinha? -Kiri sussurrou quando Niyati finalmente terminou de contar tudo. 

-Sim, a Filha da Serpente lhe amparou, mas a vitória foi de Jaya. 

Kiri esboçou um sorriso, perdida em algumas lembranças do passado, a grande serpente de alabastro no jardim, sua visita anos depois... Suspirou, nostálgica. 

-Elas estão aqui? -Kiri ergueu os olhos para olhar para Niyati.

-Estão descansando. -Niyati respondeu. -Estão todos aqui... O Príncipe da Lua, Shankar, Jaya, a Filha da Serpente...

-Niyati... -Kiri chamou, seus olhos fixos nos dela. -Eu já conheço você, não é? 

-Pensei que nunca fosse se recordar... -Niyati sorriu para ela. -Já fazem quatro mil anos...