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"(...) Nunca fui beijada assim. Minha língua afaga timidamente a dele e as duas se unem numa dança lenta e"

A porta se abre do nada. Tenho um sobressalto e escondo o livro rapidamente debaixo das minhas cobertas, enquanto meu pai entra no quarto - sem bater novamente - com uma xícara de chá nas mãos.

"O que você estava lendo?"

"É... biologia." fico tensa tentando encontrar a desculpa. " Nada muito interessante."

Meu coração acelera. Deus, se ele tivesse visto que eu estou lendo 50 Tons de Cinza, certamente ele teria um AVC.

"Fiz isso pra você."

Ele me entrega a xícara fumegante com o líquido amarelado dentro.

"O que é isso?" pergunto

"Camomila. Não quero que tenha pesadelos novamente."

"O chá não vai resolver meus pesadelos pai, mas obrigada."

Assopro contra a xícara e a nuvem de vapor sobe entrando nas minhas narinas, não tinha cheiro de nada. Tinha um gosto indecifrável, nada que eu tenha experimentado antes, mas se iria ajudar a me deixar dormir em paz eu já amava ele.

"Fui visitar a mamãe hoje." digo entre um gole.

"É, eu vi você saindo hoje cedo antes de tomar café."

Ele senta na beirada a minha cama, apoiando as mãos perto da minha perna. Eu tinha certeza que ele estava tentando alcançar o livro. Coloco a perna por cima dele antes que seus dedos o toquem.

"Ela apertou minha mão."

Ele ergue as sobrancelhas fingindo parecer surpreso. Mas ele nunca estava realmente.

"Sempre me pergunto se ela pode me ouvir." digo tomando mais um gole. "Prefiro acreditar que sim e você?"

"Eu também querida. Eu também." ele diz sem entusiasmo.

Dou um sorriso, ansiosa pela nova visita que eu iria fazer a ela amanhã e contar tudo sobre o maluco do Harry. Normalmente nunca havia coisas novas para contar.

Papai abaixa a cabeça e coça o pescoço. Ele não gostava de falar muito sobre a mamãe, sempre ficava desconfortável e cabisbaixo. Ele sofreu muito na época do acidente dela, talvez até mais do que eu. Na verdade bem mais do que eu. Acho que por eu ter mais fé do que ele minha dor era menor. Papai a amava tanto que me assustava e sofria em silêncio por saber que não que não podia fazer nada por ela. Isso só deixava ele mais deprimido e distante de mim. Ele sempre dizia que daqui ela só iria para um lugar mais longe ainda de nós. Então ele preferia não visita-la, acho que para amenizar a dor e não dar esperança a ele mesmo sobre ela.

Acho que ele passava todo seu tempo livre pensando na mamãe. Seus momentos de silêncio durante o jantar eram sempre muito longos, seu olhar ainda eram sempre tão vagos quando saiamos pra algum lugar qualquer e eu sabia que seus pensamentos eram ela, sempre ela. Ele deveria tentar imaginar assim como eu como seria se ela estivesse ali. Ela sempre deixava tudo mais alegre por onde ela passava e onde ela estava.

Eu tinha pena dele as vezes. Por ele nunca conseguir sair de dentro desse poço, por viver sempre se lamentando ao invés de estar ao lado dela como eu fazia.

"O que foi pai?

"Apenas pensando." ele olha para mim dando um sorriso, seus olhos fundos de cansaço.

Dou de ombro e tomo mais um gole derradeiro do chá.

"Quando pretendia me contar que Harry Woodwock veio até aqui?"

After Midnight Onde histórias criam vida. Descubra agora