Capítulo 6

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Para entrar na Cidade Baixa sem chamar atenção, Soen teve que se esgueirar pelos arredores das ruínas que um dia formaram a muralha daquele lugar esquecido. A vigilância era responsabilidade das muitas facções de criminosos que se erguiam em regiões remotas como aquela, onde o peso da coroa quase não podia alcançá-los e os próprios soldados corruptos as gerenciavam.

Sendo assim, para evitar ser pego por criminosos que adorariam colocar as mãos em dois príncipes maltrapilhos, ele esperou até o cair da noite. Então, encontrou um ponto onde um homem solitário vigiava uma pequena região remota, cortou-lhe a garganta e limpou o líquido carmesim da lâmina nas vestes do sujeito que ainda se engasgava com o próprio sangue. Em seguida, pulou para dentro da cidade.

Rápido como um gato, Soen se misturou entre os bêbados e viciados em tinta ou ópio enquanto vagava pelas ruas fétidas, cujos ratos roliços se aventuravam livremente pelas vielas sem iluminação, ignorando a presença humana.

— Yen, você ainda está vivo? — ele perguntou enquanto sentia o peso imóvel da bolsa de linho na qual seu primo havia sido novamente confinado.

"Não. Eu morri no momento em que você me colocou aqui."

— Se ainda tem forças para me afrontar, também deve ter energia o suficiente para esperar até o amanhecer antes de encontrar um médico — Soen respondeu. — Você não poderia ser atendido na sua forma de gato, de qualquer jeito. Para onde inferno devo ir agora, afinal?

"Você vai chamar atenção se continuar falando sozinho", Yen alertou. "E procure pela taverna Os Ossos Caídos."

— Que nome de merda — disse ele, partindo em sua busca.

Não foi difícil encontrar a taverna, apesar de o nome na placa caindo aos pedaços estar praticamente apagado. Dentro de quinze minutos procurando, um pequeno fluxo de bêbados o guiou ao caminho certo.

Assim que Soen e seu primo adentraram no lugar, ele sentiu o indescritível cheiro de homens embriagados e suados, além do odor ácido da cerveja, urina e alguns outros excrementos mais desagradáveis. Os homens que ocupavam a maioria das mesas eram todos grandes e com músculos enormes, do tipo mais perigoso possível. Soen esperava que nenhum deles lhe contaminasse com a morte negra ou qualquer outro tipo de doença que mercenários carregassem.

"Você pode me deixar sair agora, Soe. Ninguém aqui vai se importar com um gato", Yen murmurou em sua mente enquanto se agitava no saco jogado sobre os ombros de Soen.

— Não diga besteiras. Você fica muito bem aí dentro, primo — Soen respondeu enquanto se sentava em uma mesa vazia. — Além do mais, não notou o considerável número de ratos lá fora? Tenho certeza de que a causa disso é o súbito desaparecimento dos gatos. Essas pessoas podem agir fora da lei, primo, mas mesmo criminosos costumam ter um pouco de fé. Duvido que as palavras do Papa tenham sido ignoradas por aqui.

— Com certeza há religiosos na cidade, mas nenhum deles se aventuraria nesse lugar tão tarde da noite, Soen — Yen argumentou. — A bruxa que procuramos é responsável por gerenciar a taverna, e ela é muito boa em proteger seus interesses.

Enquanto ignorava os protestos de Yen-gato, Soen não pôde deixar de notar uma das putas feias que trabalhavam naquele tipo de lugar se aproximando entre os bêbados. Ela tinha o olhar fixo nele, mas seu semblante rígido não parecia convidativo.

— Não estou interessado — Soan disse assim que ela chegou perto o suficiente para ouvi-lo. Então ignorou sua presença e se voltou para uma outra mulher que passava servindo bebidas. — Uma caneca de cerveja.

Enquanto ele era servido daquela cerveja com cheiro de mijo e gosto de vinagre, percebeu que a mulher rígida continuava parada atrás dele, analisando-o.

Labe MortemOnde histórias criam vida. Descubra agora