Capítulo 14

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Ao provar da liberdade, todo homem se tornava escravo do desejo de permanecer livre.

Não foi assim com Os Primeiros, os expulsos do paraíso? Após sorverem da fonte do pecado, decidiram fazer o que bem entendessem e, a partir de então, a humanidade jamais pôde voltar atrás naquela escolha.

Eles almejaram o livre arbítrio, e nenhum ser humano seria capaz de renunciar a isso depois de experimentá-lo.

Alexander Blackthorn só conhecia algo parecido com a doce liberdade mundana quando era um garoto inocente que desconhecia os prazeres do pecado. Aquele homem convivera com os anjos pela maior parte da vida e, então, esquecera-se de sua verdadeira identidade: um futuro rei.

Agora que estava livre do jugo dos seres celestiais, Soen imaginava o quão delicioso era o sabor da liberdade para ele.

E Soen recordava, a cada palavra, o que a bruxa da Cidade Baixa lhe dissera semanas atrás.

Mas saiba, Vossa Alteza, que os fios do destino traçados na palma de suas mãos revelam que alguém de seu passado voltará do túmulo e, então, tomará algo que você julga lhe pertencer.

Soen nunca se preocupou muito com isso. Ele chegou a fazer uma breve lista mental de quem poderia ser aquele, mas concluiu que não havia nenhum homem morto que pudesse tomar algo seu.

O problema era que Alexander deixara de ser um menino de 8 anos, e agora parecia, de fato, ser alguém capaz de disputar o trono de Etheia e usurpar de Soen aquilo que ele cobiçava.

Fosse o que fosse, a bruxa estava errada. Não havia nada que Soen pensasse lhe pertencer. Ou era dele ou não era, e o trono em breve seria seu.

Soen tinha abandonado a sua bebida, fitando Alec, que o encarava de volta com uma expressão pensativa, mas não do tipo que refletia sobre a proposta de seu irmão mais novo.

Ele parecia mais inclinado a dizer algo, como revelar um segredo que deveria permanecer oculto. Não demonstrava interesse no trono em si.

Claro, algo como governar um reino inteiro não era o tipo de coisa que se podia desprezar, e Soen notou o instante em que aquela possibilidade cruzou a mente de Alec. Foi apenas um lampejo e, logo depois, as chamas da cobiça se apagaram em seus olhos escuros.

— Não é o momento para essa discussão. Nosso pai está bem vivo e governando, e há coisas importantes que ainda não te contei — então realmente havia algo que ele omitia. — Além do mais, eu duvido que você me cederia o trono tão facilmente.

Ele deu a Alexander um sorriso cortante, indicando que seu irmão estava supondo corretamente.

— Eu não cederia. Mesmo que você seja o herdeiro legítimo e reivindique tal posição, receio que não me acostume com a ideia de não ser o herdeiro, ou que alguém ainda estará acima de mim, mesmo depois que nosso pai morrer. Não planejo permanecer como um peão no jogo de alguém para sempre.

— Todos nós somos peões no tabuleiro de Deus, Soen. Até os reis. Não podemos escapar dos planos que Ele escreveu para nós, mas devo dizer que você é uma das peças mais importantes no momento, acho que deveria se alegrar.

— Eu não sou do tipo que se alegra com algo assim — o humor de Soen azedou. — Francamente, preferiria ter voltado ao castelo sem ouvir isso.

— Falando nisso, devo te acompanhar — Alec sabiamente decidiu mudar de assunto. — A bruxa ainda quer alguma coisa de você, e até que eu descubra o que é, você tem que me prometer que não vai sair andando sozinho durante a noite e que ficará com a gata que lhe dei.

Labe MortemOnde histórias criam vida. Descubra agora