Capítulo 12 - Pontualidade britânica

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Eu estava encarando o meu relógio de pulso pelo que parecia ser a enésima vez. Caminhando de um lado para o outro na esperança de que os ponteiros andassem tanto, ou até mais rápido, do que eu. O barulho de um carro passando na rua, a sineta de uma bicicleta que se aproxima veloz, pedindo passagem aos pedestres, passos apressados na calçada... Tudo parece ser o preambulo de sua chegada. Resolvo ligar para avisar onde a estou esperando, mas chama e chama e ninguém atende. Retorno ao meu ritual afim de aplacar os pequenos insetos que teimam em sobrevoar o meu estomago, de lá para cá, e de cá para lá, bem em frente a entrada do Museu Nacional. Experimento uma sensação inquietante pouco vivenciada por mim nesses 25 anos de existência. Por fim, encaro o relógio novamente, agora o do meu celular:

16h40min e nenhuma mensagem dela ou ligação perdida.
"E se algo aconteceu? E se ela não vier?"

Volto a buscar o rosto familiar entre as muitas pessoas na rua naquele horário. O rosto que busco tem uma brancura incomparável aos rostos que normalmente se vê em Bangkok. Mais incomparável ainda são os lábios que concentram resquícios de sangue, mais e menos em alguns pontos, de forma bem difusa. Fecho os olhos e respiro fundo. O calor e umidade dessa cidade transforma qualquer espera ao ar livre em uma tarefa torturante. Refaço outro ritual que já havia de tornado hábito naquele dia:

16h50min. "Acho que ela não vem mais."

Experimentando um misto de complacência e frustração, decidi visitar o museu da mesma forma, não só para não perder viagem, mas por quê o lugar era lindo e me fazia sentir mais próxima da história e da cultura do meu país. Fazer esses passeios pela cidade, também me trazia boas recordações. Sempre que vinha aqui na infância com meu pai, eu sentia que conseguia me conectar com ancestrais remotos e com um passado que eu não vivi. Pessoas que nunca conheci e que viveram realidades que eu mesma tinha dificuldade de conceber, me despertavam muita compaixão. Como era possível?! Nem eu sei. Mesmo assim mexia muito comigo. A história contada pela ótica das pessoas comuns possui outra textura, já parou pra pensar nisso, meu amado leitor? Ainda que só, visitar esse local sempre valia a pena. Decidi por começar pelo que era um espetáculo a parte, os jardins. E eu tomaria o tempo que fosse preciso para aquela visita. Seria um deleite aproveitar minhas tardes livres para redescobrir os encantos que aquela cidade escondia tão bem. Contornei as construções, primeiramente pelas largas varandas do Buddhaisawan Hall, e então segui para os jardins onde ficava o Mangkhalaphisek Pavilion, uma área descampada e gramada. O sol começava a dar a sua tão esperada trégua diária naquele horário, quando, de repente, o aroma floral e adocicado tão característico de ervilha-de-cheiro com bergamotas, trouxe consigo uma voz conhecida e ofegante que pronunciava o meu nome de forma enfática:

- Freen!! – Senti sua mão agarrar meu cotovelo, de modo semelhante ao da primeira vez que nos vimos, há poucas semanas.

Ligeiramente assustada pelo toque incomum na minha cultura, meu corpo estremeceu em reflexo, ao mesmo tempo que os familiares insetos com suas asas delicadas, ameaçavam batê-las na boca do meu estomago. Me virei de supetão para encarar aqueles olhos castanhos, alguns poucos tons mais claros que os meus. O sangue que costumava colorir apenas os seus lábios, se pronunciavam também nas suas bochechas, Rebecca se encontrava ligeiramente curvada, a mão que não me tocava, se apoiava em uma de suas coxas enquanto ela recuperava o folego. Fiquei assim, encarando-a de cima. Assistindo a vermelhidão de suas maçãs se dissipar lentamente.

- Você é... – Ela fez uma pausa para recuperar um pouco do ar que lhe faltava. - ...uma pessoa difícil de encontrar.

Desviei o meu olhar para o caminho atrás dela e comecei a achar graça na possibilidade dela correndo toda aquela área para me alcançar. Mas assim que me lembrei do quanto ela havia me feito esperar, o meio sorriso que começava e se formar em meus lábios sumiu.

O Preço do SalOnde histórias criam vida. Descubra agora