4 - O subchefe e Fabiele

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Desde cedo, eu sabia que a vida tinha um jeito estranho de me desafiar. Cresci correndo pelas vielas, brincando com outros moleques da minha idade, que assim como eu, muitas vezes não tinham nem um pão em casa para comer. Essa favela sempre foi o meu lar, um lugar onde as histórias tristes são tão comuns quanto as marcas de bala nas paredes de tijolos ou madeiras envelhecidas. Aqui é o lugar onde você aprende a se virar desde pequeno, porque a vida, na grande maioria das vezes, não te dá muitas escolhas.

É foda você ver sua mãe chorando escondida por não ter um prato de comida para dar ao filho e essa era a minha realidade. Minha mãe, uma mulher forte e determinada que foi abandonada grávida pelo pai que queria que ela me abortasse e na época ela fugiu de São Paulo pra cá para me proteger e recomeçar sua vida. E durante a minha infância, ela trabalhava como diarista, mas o que ganhava nem sempre era o suficiente.

A nossa realidade era igual a de muitas famílias aqui da favela, incluindo da molecada que cresceu comigo, o qual muitos não estão mais nesse mundo, e isso é foda de lembrar.

Eu queria dar uma vida melhor pra minha coroa e desde muito novo, percebi que precisava fazer coisas que a maioria das crianças não deveria fazer para conseguir dinheiro e aos poucos, fui entrando em um mundo que parecia oferecer aquilo que a minha realidade negava. Foi assim que, ainda muito novo, dei meus primeiros passos no submundo do crime.

Um crime pequeno aqui, outro ali, um assalto a alguém que passava num local mais deserto, depois outro contra um pessoal que tava numa parada de ônibus e assim, eu mergulhava cada vez mais fundo em um mar de ilegalidade, alimentando uma sensação de poder que a vida cotidiana jamais me daria e mesmo sendo totalmente errado, isso me satisfazia.

Pouco tempo depois, fui pego e passei um tempo numa instituição para menores infratores, devido a um assalto que pratiquei a um supermercado. Quando ganhei a liberdade, saí de lá sem ter conquistado a tal ressocialização que eles tanto falam por aí e então entrei para o tráfico, onde comecei como fogueteiro, depois fui vapor e mais pra frente soldado, até chegar na gerência de segurança e atualmente, com 26 anos de idade, sou o subchefe, cargo ao qual fui promovido após a prisão de PH, por ser o homem de maior confiança do Cristiano. Mas, pra chegar onde cheguei não foi fácil, foi correria total e cada degrau que subi na hierarquia do crime, foi fazendo meus corres com dedicação e disciplina, pois eu queria dar uma vida melhor pra minha coroa que no começa chorava, implorava pra eu não me envolver, mas não teve jeito, acho que esse lance de perigo sempre esteve nas minhas veias e aqui estou, podendo dar a minha mãe tudo que ela merece. Meu passado no crime moldou minha jornada e definiu o meu presente.

Naquele maldito dia da invasão em que essa comunidade virou um inferno, um mar de sangue se formou entre as vielas e eu não arreguei, troquei bala sem dó, até tiro na perna tomei, mas isso aí faz parte desse meio e sem dúvida nenhuma, aquela foi a maior e mais sangrenta invasão já enfrentamos até hoje. Mas eu tô aqui firme e forte, e se precisar, tô pronto pra outra. Infelizmente muita gente morreu, incluindo alguns soldados do nosso bonde e por esse motivo, muita coisa foi reformulada no esquema, novos homens entraram pro movimento e alguns dos melhores soldados foram promovidos a novos cargos de confiança, naquele esquema de pirâmide da hierarquia.

No comando do PH, essa comunidade estava crescendo e isso tem que continuar, tem que fortalecer o progresso e aumentar o faturamento cada dia mais. Manter o foco no lucro, agindo sempre na disciplina.

Quando o Payú soube que seu pai caiu no privado, ele entrou em parafuso, surtou legal, precisou de vários homens pra segurar o cara. Claro que ele foi preparado desde muito novo pra assumir esse papel de líder, mas ele não esperava que fosse tão logo.

Doce pecado do morroOnde histórias criam vida. Descubra agora