5 - Gravação do clipe

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Amanda

A minha vida e a da minha irmã já tinham mudado tanto desde a separação dos nossos pais e depois da morte da mamãe, mudou mais ainda. Os primeiros meses após sua morte foram como um nevoeiro denso que se instalou sobre mim e Laurinha. Todo dia era uma batalha contra a tristeza e ainda é, nossa mãe faz falta em todos os momentos e minha irmã foi poupada de alguns detalhes de como tudo aconteceu, pois já basta a dor de lutar com a ausência repentina em nossas vidas.

Nossa vida virou completamente de cabeça para baixo e precisamos sair da casa onde estávamos morando pois não teríamos como pagar o aluguel e então fomos morar com minha madrinha e a Fabiele, que nos acolheram de braços abertos, compreendendo que precisávamos de tempo para nos adaptarmos à nova realidade e agora mais do que nunca, rala são nossa família. Fabi e eu costumamos dizer que somos irmãs de mães diferentes e aos poucos, Laura e eu estamos nos adaptando a viver na comunidade, que tem sim coisas ruins, mas não é tudo que falam por aí.

Enquanto não consigo emprego, me inscrevi na oficina de dança da associação da comunidade. A associação tem projetos muito bons para crianças e adolescentes, projetos esses, financiados em grande parte pelo tráfico, óbvio. Mas pelo menos é algo bom sendo feito para quem precisa. Laurinha também está participando, porém as oficinas dela são música e informática e em meio a tanta tristeza que vivemos nos últimos meses, ao menos essas oficinas nos fazem bem.

Eu sempre tive vontade de fazer dança e quando era criança, amava participar das apresentações da escola, mas meu pai, que era um pouco conservador, não permitia e aqui na comunidade, encontrei a oportunidade de colocar meu corpo em movimento. Diana gostou bastante de estarmos participando, mas eu já disse a ela que vou continuar na oficina somente até conseguir emprego.

Entrar para o grupo de dança ajudou muito no processo do luto, pois eu achei que fosse enlouquecer sem minha mãe ao nosso lado e hoje, após quase três meses de dança, quando danço, não sinto apenas a perda, que óbvio ainda me causa muita tristeza, mas sinto a alegria de estar viva, de explorar a força que existe dentro de mim.

Temos uma apresentação marcada para logo e quando eu estiver me apresentando, será como uma homenagem à minha mãe que sempre me apoiava a seguir meus sonhos. A dança me trouxe de volta à vida, e embora a dor da perda ainda esteja comigo, agora ela caminha ao lado da cura que a dança me proporcionou e sei que quando eu tiver que sair do grupo para trabalhar, vou sentir muita falta.

Fabi veio me esperar no final da aula para irmos assistir à gravação do clipe do T5 e confesso que fiquei empolgada com a possibilidade de ver ele de pertinho. Eu sei todas as suas músicas.

Conforme fomos nos aproximando do local onde a Fabi disse que seria a gravação, que era bem distante da nossa casa, havia muitas pessoas.

Todas elas querendo ver o T5, óbvio, e quando o vimos, ficamos eufóricas, mas não podemos chegar mais perto, os seguranças não permitiram. Lá ficamos assistindo tudo durante algumas horas, o funkeiro tatuado que adoramos, usando muitos cordões de ouro, cantava as músicas com algumas garotas com corpos maravilhosos dançando ao seu redor. E nos momentos que ele gravava sem camisa, a mulherada, incluindo nós, ficava em êxtase, afinal, ele é lindo.

A equipe de produção se movia freneticamente por todos os lados, ajustando cada detalhe para capturar a essência da comunidade em cada cena e para que os muitos homens armados que estavam por toda a parte, não aparecessem nas imagens. Essa questão de pessoas altamente armadas em diversos cantos da comunidade, me assustava muito no início, mas agora já estou começando a me acostumar. Mas é claro que tendo um famoso aqui, todo cuidado era redobrado e eu observei que nessa parte mais alta da comunidade, há muito mais desses homens armados do que lá embaixo.

Doce pecado do morroOnde histórias criam vida. Descubra agora