6 - Neurose e preocupação

199 20 6
                                    

Payú

Tô estressado pra caralho, o peso das responsabilidades nos meus ombros enquanto eu comando a favela no lugar do meu pai e isso tá me deixando maluco. Cada decisão que tomo, tem que ser pensada com sagacidade e é uma pressão constante.

O controle do tráfico é apenas uma parte do que eu faço. Também tenho que tentar, na medida do possível, manter a comunidade unida, garantir que as necessidades básicas sejam atendidas. Confiança é algo difícil de ganhar, mas muito fácil de perder, é preciso ter a comunidade do nosso lado pra não ter problemas futuros e embora muita coisa o Brand resolva antes mesmo de chegar até mim, as vezes é inevitável, então quando eu tenho que resolver, é pica das brabas.

Daqui dois dias chega uma carga grande e é sempre um momento de redobrar a atenção, sem falar nessa parada do meu pai que eu tô desembolsando uma nota com o escritório de advocacia. São três advogados cuidando do caso dele que já me mandaram a real, dizendo que vai ser bem difícil tirar ele de lá, afinal, meu pai há muitos anos é um velho conhecido da justiça, tem diversos crimes nas costas. Mas eu também preciso relaxar um pouco, T5 tá na área pra gravar um clipe aqui, fortalecendo a comunidade, assim como a gente fortaleceu ele no começo da carreira. Gratidão recíproca é um lance de gente leal e eu sou, ele também é, então tem meu prestígio.

A comunidade aparecendo no clipe dele na internet, traz visibilidade positiva pra favela e traz atenção de quem nunca frequentou uma favela e acha que aqui só tem coisa ruim, então esse clipe vai mostrar que aqui vivem pessoas de bem e honestas, mas é óbvio que nem eu e nem ninguém do meu bonde pode aparecer nas imagens, tudo no esquema sempre, nosso contato com o T5 é totalmente no off. Sempre que ele tá na comunidade é agitação e alegria total, ele é moleque puro e simples que não tem vergonha das suas raízes e a comunidade vai à loucura com ele.

Dia de baile, pagode ou alguma outra comemoração é sempre uma agitação positiva na comunidade e hoje mais ainda, já que é gravação de clipe, o segundo que ele grava aqui, inclusive. Porém o outro foi no início da carreira dele, então não estourou, mas sempre que ele está por aqui, os moradores vão a loucura, tentam tirar foto ou ter algum contato com ele, o cara é cria daqui, tá famosão e segue na humildade, nesse pique ele vai mais longe ainda.

Depois do clipe, rolou aquela resenha de lei, com muito beck, bebida e mulher à vontade, aliás, piranha nunca falta, nessas festinhas elas se jogam, fumam, cheiram, dançam até o chão esfregando a bunda na cara de quem quiser pegar, tudo interesseira do caralho. Eu pego, como e é isso, segue o fluxo, mas ultimamente tô preferindo pagar uma profissional, assim não tenho dor de cabeça. Odeio mulher no meu cangote e relacionamento não é pra mim, passo longe. Não sou como o Brand que fica pagando de bandido pegador, mas tá sempre atrás daquela mina que ele pega e fica na neurose de ciúmes, passo longe disso.

O Brand tá todo apegado naquela mina, tava quase surtando porque ela tava no meio da galera na gravação, dançando até o chão. Aliás, vi que ela tava com uma garota que nunca vi por aqui, mas que roubou a cena, gata pra caralho, deve ser aquele tipo piranha também, mas ainda assim muito linda.

Brand

O T5 tirou onda no clipe e deu tudo certo na gravação, os moradores vieram em peso assistir e foram à loucura com as músicas e a humildade de sempre dele. A divulgação traz uma boa visibilidade, porque assim mostra pra quem não mora aqui, que em favela tem muitas coisas boas também, que não é só tráfico e morte, como é mostrado na imprensa que adora aumentar ou inventar umas paradas que não conferem.

A Fabi apareceu na gravação e eu já tive que dar uma enquadrada nela, tava toda animadinha usando uma blusa decotada e um short curto do caralho, enquanto os machos ficam todos de olho no que é meu, parece que ela gosta de me provocar, papo reto.

Eu curto a Fabi a vera mesmo, esse nosso lance tem mais de dois anos já, ela sabe que não é nada sério, mas ela é a minha primeira opção sempre, só não deixo ela saber disso, senão fica muito marrenta, e nesse pique estamos aí, há um tempão já.

— Qual foi, Fabi? Cadê a postura? Já deu tua hora, vai pra casa! — falei assim que consegui chamar ela de canto e a amiga ficou olhando em nossa direção com cara de apavorada.

A Fabi já tava sendo escoltada desde que saiu de casa, eu sabia que ela ia querer vir assistir o T5 e não posso dar mole.

— Que que é, hein Brand? Dançar e curtir uma gravação de clipe é falta de postura? — ela pergunta toda petulante.

— Os machos aí tudo babando, não tinha outra roupa pra vir, não?

— Deixa que olhem, afinal, para os outros a gente não tem nada mesmo! — sua resposta atrevida tem um certo ar de cobrança que não me agrada nenhum pouco.

— Não é assim, não! E você fala direito comigo! — falei firme. Meu rádio tocou e eu tive que ir resolver uma parada. — Fica esperta aí que eu tô de olho!
— Não me trava, não, Brand!

— Não esquece, tô de olho! — falei no ouvido dela. Agarrei e beijei antes de sair dali porque ela me estressa legal, mas eu tenho um tesão fudid* nela. A amiga dela que eu não sei direito quem é, me olhava de um jeito que parecia nem respirar, mas se eu não cuidar do que é meu, qualquer pau no cu cai matando em cima.

A Fabi é linda de um jeito que não se vê todo dia. Um sorriso lindo, um corpo cheio de curvas deliciosas e ainda fod£ pra caralho. Ela tem um gênio terrível, não aceita ordens de ninguém e parece que só consegue me dizer “sim” quando é para me desafiar e ainda assim, sou amarradão nela.

Já peguei muita mulher nesse morro, muita mesmo, mas são todas Maria fuzil emocionadas que gostam de moleque com porte de bandido e fuzil nas costas, essas não me fazem mais a cabeça. Mas a Fabi não, ela fica comigo no sigilo e acha que eu pego várias ainda, não nego pra ela, porque daí vai achar que me colocou na coleira e não é assim que funciona, sem falar que ela sabe me tontear legal, tava na gravação vestida de um jeito que me deixa louco, toda linda e gostosa cheia de olhos em cima dela, descendo até o chão, porque se tem uma coisa que ela sabe, é dançar funk como ninguém.

Nem pude curtir muito a gravação, meu corre é sempre grande por essa favela em horário de trabalho, tenho que estar sempre atento a tudo em dias normais, quando tem evento então, a atenção tem que ser redobrada, afinal, se alguém gravar ou fotografar o que não deve, tem que ser cobrado. Mesmo o PH estando no privado, a disciplina continua. As vendas estão bombando, o fornecedor continua trazendo produto de ótima qualidade e a grana entrando aos montes, é só progresso, o Payú segue a linha do pai dele, fazendo um ótimo comando e tem que continuar assim.

Depois do clipe, rolou uma festinha privê na casa do Tielo, bebida e mulher a rodo. O T5 ficou só um pouco e depois teve que ir porque tinha um show pra fazer, mas a festa ia rolar até de madrugada e eu ia participar também, mas acabei só dando uma passada mesmo e logo fui pra casa.

Acordo no outro dia e vejo no meu celular, três mensagens da Fabi e numa delas, ela me pedia uma grana. Eu dou muitos presentes pra Fabi, incluindo dinheiro, não dou mais porque ela não quer que a mãe dela saiba, a coroa é toda cheia dos princípios, sem falar que não vai muito com a minha cara. Mas a Fabi nunca pede dinheiro, sempre dou espontaneamente, então achei estranho e liguei pra ela que demorou a atender.

— Oi Brand! — Ela quase sussurrou.

— Tá falando baixinho assim, por quê? — pergunto cheio de neurose.

— Porque estou num hospital! — Ela seguia sussurrando. — E para de ser neurótico!

— Num hospital? O que aconteceu?

— Não é comigo, não! Mas você consegue o dinheiro pra mim? É urgente.

Doce pecado do morroOnde histórias criam vida. Descubra agora