Capítulo XVI

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Uma breve baixa de pressão quase me engoliu, minhas mãos tremiam. Eu havia lido, e ele estava ali, sempre me perseguindo, sendo quase impossível de fugir de seus medos. Edgar me acolheu com os olhos assustados, e eu já percebi uma mudança sutil no seu olhar porque era óbvio que ocorreria. Você está conhecendo uma pessoa e recebe uma carta passiva agressiva? Porque todas as palavras foram assim, meio que encaminhadas na sutileza de afetar a mim mas de atrapalhar o meu novo relacionamento, e ela chegar exatamente no momento em que ele estava comigo de um jeito dramático no meio da noite. Ricardo estava incomodado mas ele não perderia, ele iria incomodar mais.

- Edgar, eu sinto muito por esta carta, posso te explicar sobre algumas coisas que aconteceram e tudo mais, não se assuste...

-Ei, Edgar chamou minha atenção com a voz preocupada, eu me desatava a falar com medo de tudo- Você está bem? Não se preocupe comigo, você vai ter tempo para me explicar.

Eu o olho.

Meu desespero é perde-lo sem ter a chance de realmente o ter.

- Você conhece Alicia Querez?

Eu pergunto para tentar situar o quanto ele saberia sobre minha família.

- A influencer digital? Sim...

-Bom, ela é minha irmã.

A reação dele é de surpresa e ele rapidamente me pergunta.

- Mas não é ela que é a filha de uma das famílias mais ricas do país? O pai dela aparece em jornais e tudo isso.

- Sim, ela é minha família, ele é meu pai, o que me inclui no meio mais corrupto e sujo de todo o país, eu cresci nessa família. Eu vivi nessa vida de socialite todos esses anos, mas eu nunca me adaptei muito bem.

- Mas o que isso liga a essa carta que recebeu?

Os olhos dele estavam tão confusos. A vontade de falar tudo rápido para que acabasse e soubesse o que ele iria fazer vinha em seguida.

- A família Querez que é a minha, é muito ligada a família Valentim. Por causa de todos esses eventos, negócios, eles fazem tudo um pelo outro. Ricardo me viu nascer e disse que se apaixonou por mim quando eu era uma criança... bom, eu não sei como explicar, mas começamos um relacionamento...

-ESPERA. Como assim?

Edgar perguntou incrédulo.

- Isso, eu virei amante dele.

Respondi com pressa, fala acelerada e mãos tremendo. Edgar estreitava os olhos parecendo ligar e se importar com outra informação indiferente a essa.

- Quantos anos você tinha?

-Eu não sei, ele começou a fazer coisas quando eu tinha uns 7 mas de fato o relacionamento aos 13 ou 14.

Edgar parecia apavorado.

- Dora, eu não sei se você já ouviu isso que vou te contar, mas você não começou um relacionamento: você era uma criança, você foi abusada. Ele abusou de uma criança. - Lágrimas escorreram pelo meu rosto. Eu poderia até acreditar mas eu fiquei com ele adulta, nunca consegui me desligar. Eu tinha culpa. Sua voz interrompe meu pensamento- E ele voltou agora?

- Não, ficamos juntos até pouco tempo atrás... Eu me mudei para fugir dele e da minha família. Mas ele não aceita que terminamos.

Edgar segurou minhas mãos, olhou para o teto pelo que pareceu serem minutos com uma expressão de preocupação. Olhou para mim novamente. Sabe quando você sente que ta prestes a perder algo que você acabou de ganhar? Aquele momento em que o sorvete cai da casquinha e você não pode fazer nada? Era assim que eu me sentia. Havia também o medo, Ricardo estava na cidade? Ele mandou alguém me vigiar? Como as coisas estavam? Minha mente perturbada em mil questões que eu achei que nunca mais precisaria lidar

- Não temos forças contra uma pessoa dessas, todo o poder que ele tem, mas eu vou permanecer junto de você. Não estou assustado com nada além do fato de você ter que passar por esse sofrimento ou ele te fizer algo... Você acha que ele seria capaz de te machucar?

Eu não sabia responder essa pergunta honestamente.

-Eu acho que não.

- Vamos permanecer juntos e tentar entender o que ele quer, as vezes são só provocações vazias. Eu estou contigo, Dora.

Meu coração acalmou pela primeira vez desde que aquela carta chegou. Eu realmente não esperava nada muito grave de Ricardo, e eu estava com Edgar, ele disse que estava comigo. Pela primeira vez na vida, eu não estava completamente sozinha e as lágrimas não deixaram de vir. Edgar me abraçou e eu podia ouvi-lo dizer algumas repetidas vezes que iria estar comigo, que iria me conhecer, que ambos saberíamos e viveríamos um a história do outro. A honestidade que caminhava até a mim nas formas das palavras mais genuínas de Edgar encantavam meu coração e se deixava nutrir de uma esperança tão viva que eu me aconcheguei nele. Lembrei do que ele havia dito mais cedo sobre não existir quantidade de tempo necessária para admirar alguém e entendi: de fato, consegui entender porque era exatamente como eu me sentia ao vê-lo tão puro na minha frente. Não era sobre o tempo e sim sobre a conexão que eu poderia viver com Edgar naquele momento. Julgo, nunca ter vivido algo igual ou semelhante ao que eu estava sentindo com ele.

O toque das suas mãos ou seu corpo geravam faíscas quase que o tempo todo sobre mim, como se meu corpo tivesse se tornado eletricidade e ele fosse um rio de água passando por mim. Querer o tempo todo. Ter medo o tempo todo, como eu conduzia isso? Edgar apareceu na minha vida sem eu estar preparada para negar nem oferecer nada, foi tudo tão espontâneo. Tudo que eu tinha para oferecer do meu melhor, eu tinha certeza que o faria, custasse o que custasse. Isso era estar apaixonada então? Eu não tinha certeza ainda, mas amava e odiava aquela sensação de descontrole.

A partir do momento em que Edgar entrou na minha vida eu não tinha controle sobre meus sentimentos porque eu queria estar com ele. E isso tão rápido. Como um conto de fadas, Ricardo vinha para atrapalhar e desconcertar as coisas mas parecia que aos olhos do meu amado poderíamos enfrentar isso juntos.

Eu gostei muito da ideia de enfrentarmos juntos.

Sempre fui para a linha de frente sozinha, mas agora, alguém segurou minha mão.






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