Prólogo

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Era o dia do baile de verão na minha escola, marcando a inauguração do novo ano letivo e servindo como uma forma de boas-vindas a todos os alunos e professores. Por algum motivo, minha amiga conseguiu me convencer a ir, e meus pais gostaram da ideia, já que eu tinha passado as férias trancada no quarto, lendo ou desenhando, e eles acreditavam que eu deveria interagir mais com os colegas.

Então, acordei cedo e com a ajuda de uma amiga da minha mãe, fiquei realmente linda. Ela fez um coque em meus cabelos pretos e uma maquiagem simples, além de fazer minha mãe alugar um vestido caro de cor turquesa, comprido e com uma fenda na perna. Achei que estava extravagante demais, mas eu era quase invisível na escola, quem iria notar?

Às seis horas, fiquei em frente de casa esperando por minha amiga e sua mãe, que nos levaria até a escola e, posteriormente, nos buscaria. Quando deu seis e quatro, as duas chegaram e eu corri até o carro para entrar.

"Oi Silvia, oi Clara", eu disse sorrindo.

"Não acredito que a amiga da sua mãe conseguiu tirar toda a sua essência nerdola, você está sexy!" Clara, minha amiga, disse alegre.

"Filha, a Estela pode ser sexy e nerd ao mesmo tempo, não é proibido."

"Ai mãe, essas duas coisas nunca combinaram, e estou me baseando em fatos." Clara virou para me encarar mais uma vez. "Realmente linda."

"Você também está linda, Clara." Eu disse e era verdade, ela estava deslumbrante, seus cabelos castanhos estavam soltos em forma de grandes cachos, sua pele negra estava realçada por um iluminador e ela usava um vestido vermelho que ia até o joelho.

"Estou começando a achar isso mesmo, é o que todos estão dizendo." Ela sorriu.

Silvia nos deixou no portão da escola, e entramos diretamente no ginásio. Meu coração estava um pouco acelerado. Sempre fui uma pessoa introvertida, nunca fui de interagir muito, embora fosse comunicativa, e não sabia se estar em uma festa cheia de alunos inconsequentes ia me fazer bem.

Entramos discretamente, já que todos estavam vidrados na música e nas bebidas. Olhei em volta e me deu vontade de voltar para casa. Festas sempre faziam com que eu me alienasse e saísse de mim, era como se roubassem minha alma e deixassem apenas a carcaça.

"Estela, eu já volto!" Clara se misturou no meio da multidão, e eu sabia que ela não ia voltar tão cedo. Nos tornamos amigas por acaso, uma professora nos juntou para fazer um trabalho e tiramos nota máxima. Desde então, ela tem estado comigo, mas não sou tola de não perceber que ela anda comigo apenas para conseguir tirar notas boas.

Me sentei na arquibancada e fiquei observando o movimento. Não era ruim observar as pessoas, mas era frustrante perceber que elas não me notavam.

"Oi, gata." Um menino de origem asiática se aproximou de mim, ele cheirava a cigarro e bebida alcoólica, e estava segurando um copo vermelho descartável nas mãos.

"Oi", eu disse desconfiada. "O que quer?"

"Nossa, não precisa ser rude. Só vim te oferecer uma bebida." Ele me ofereceu o copo, mas eu não peguei.

"Muito obrigada, mas não quero."

"Ah, não seja boba." Ele se aproximou mais de mim. "É gostoso, experimenta."

"É sério, garoto. Me deixa em paz." Me levantei, mas ele segurou meu braço.

"Jaime! Por que está incomodando a Estella?" Clara surgiu do meio da multidão, seus lábios estavam inchados e seus cabelos arrepiados.

"Não é nada demais, sua amiga bobinha não quer beber uma cervejinha."

"Ah, Estela. Bebe um pouco, você precisa relaxar, precisa curtir mais a vida." Clara disse.

"É, Estela. Isso não mata." Jaime sorriu com deboche. Eles estavam duvidando de mim, duvidando da minha capacidade de ser como eles, então peguei o copo e entornei a bebida toda na minha garganta. Eu quis vomitar, mas para não pagar de idiota, tomei tudo e coloquei a mão na boca para não vomitar a bebida. Minha cabeça começou a girar e eu me sentei de novo. Clara e Jaime estavam rindo, e não sei por quê, também comecei a rir.

"Não tem algo mais forte?" Eu disse, me sentindo aérea.

"Ah, tem sim!" Jaime saiu correndo e voltou com mais um copo descartável, a bebida era verde, quase fluorescente, e me senti atraída a beber aquilo. Peguei o copo e entornei como o outro, dessa vez me senti menos bamba e comecei a rir de novo. Tudo parecia diferente, Jaime e Clara saíram rindo e eu me levantei cambaleando em direção à multidão. "Only Girl" da Rihanna começou a tocar, e eu deixei a música me levar; dancei como todos, me senti como todos, pelo primeiro dia na vida. Da criança prodígio estranha até a adolescente nerd solitária, me senti como qualquer um.

Quando a música acabou, eu estava cansada de tanto dançar. Virei novamente para voltar à arquibancada, mas alguém pegou na minha cintura. Senti um calafrio na minha coluna, mesmo com a visão trêmula, eu conseguia ver claramente quem era: Matias, o garoto mais popular da escola, o atacante do time de futebol da cidade. Ele era da minha altura, sua pele era quase do mesmo tom de branco que a minha e seus cabelos escuros estavam jogados de lado. Era para ser charmoso? Porque estava ridículo. Tive vontade de dizer, mas fiquei quieta, apenas observando.

"Sabia que você é linda?" Ele disse e desceu as mãos para o meu quadril. Eu o empurrei, mas ele nem se mexeu. Se eu estivesse sóbria conseguiria correr, mas fiquei paralisada, sentindo meu corpo bambo.

"Sei sim. Me deixa em paz, por favor", disse com a voz embolada.

"Não tão cedo." Matias me puxou para mais perto e me olhou nos olhos. "Não sem um beijo." Ele me beijou e senti sua língua roçar na minha; no impulso, eu a mordi e ele me empurrou com força, caí no chão, sentindo o gosto do sangue dele na minha boca. A música não parou e eu fiquei no chão sob o olhar de todos; não era bom ser notada dessa forma, quase todos estavam rindo de mim. Me levantei depressa, sentindo minhas bochechas queimarem, olhei em volta desesperada à procura de Clara, mas ela também estava rindo, como todos. Corri o mais rápido que pude, mas não tão rápido o suficiente para não ver que Caroline, namorada de Matias, me encarava com um olhar carregado de ódio.

Voltei para a entrada correndo e liguei para minha mãe, ela disse que meu pai não ia demorar, então tudo o que me restou foi esperar e torcer para que ninguém viesse atrás de mim. Sentei debaixo de uma árvore perto do pátio, senti a grama molhar meu vestido, mas ignorei. O que seria molhar um vestido caro perto de ser humilhada na frente de toda a escola? Minha cabeça ainda estava rodando um pouco, as lágrimas começaram a surgir nos meus olhos e só senti ódio de todos e de mim. Por ter confiado em Clara, por ter vindo, por ter bebido, por ter beijado o namorado da líder de torcida mais bonita da escola... todos diziam que o primeiro beijo deveria ser com alguém especial, mas o meu foi com a pessoa que eu mais sentia repúdio na vida, e além disso, eu também sentia o sangue dele na minha boca.

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