Capítulo 12

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— Espera... Ele é... Seu pai? Tô muito confuso.
— Ele foi embora, Miguel. É egoísta demais, mas calma que eu vou te explicar.
— Certo.
— O nome dele é Marco. Anos depois da minha mãe ter ido embora, ele acabou conhecendo uma mulher de outra cidade em um aplicativo de encontros, se casando novamente e deixando meu avô, que já era diabético tipo 2 e necessitava de cuidados, em um lar de idosos. Eu tava na metade da faculdade, não iria conseguir conciliar e cuidar do vovô. Quase abandonei pra me dedicar 100% a ele, mas foi um pedido dele próprio que eu não me preocupasse, que estaria em boas mãos e que era pra eu seguir o sonho de nós dois. Meu avô era o dono, porém meu pai, vendo que ele não tinha mais condições, tomou a frente do negócio, deixando claro que seria tudo meu no futuro, mas ele não cumpriu a promessa. Queria vender e eu jamais iria deixar de cumprir o legado da família.

2014

— Rafael, você ainda não entendeu que eu vou embora? Eu estou casado novamente e preciso me dedicar a minha esposa.
— Mas e o meu avô? Vai deixar ele mesmo em um asilo? Pelos cuidados dos outros? Depois de tudo que ele fez por nós dois? E o Calzone? Como fica? Agora você é dono de metade do local.
— Eu disse que iria ficar pra você, eu sei, mas vou vender.
— Como é? Vender? Não. Não vai. Por causa de uma mulher qualquer? Não.
— Não é uma mulher qualquer e a culpa é toda da sua mãe. Ela foi embora sem olhar para trás e me deixou cuidando do seu avô e de você sozinho.
— Tá mais pro meu avô falar isso. Dizer que ele que cuidou de nós dois e não você. De qualquer forma, não vou te deixar fazer isso.
— Lógico que vai e você não tem nenhum poder sobre o Calzone.
— Você só pode vender se meu avô entregar a parte dele e ele não vai fazer isso.
— Eu não teria tanta certeza.
— Esse é o legado dele e não o seu. Tudo o que ele conquistou e você se aproveitou. Não é justo.

ATUALMENTE

— Meu avô o convenceu a não vender no final das contas e ele abriu uma filial onde mora agora. Eu sei que o Calzone atualmente é um dos restaurantes mais chiques e sofisticados de todo o Rio de Janeiro, mas você precisa entender que nós nunca fomos ricos. Foi tudo sendo construído de acordo com o tempo e com os anos. O nome acabou sendo Calzone porque logo quando se formou esse prato era o carro chefe dele e acabou ficando por isso mesmo.
— Então é por isso que uma vez eu tava cuidando dele e ele disse que...

Logo, Miguel relembrou:
— Oh, que falta viu, Miguel, que ela me faz? Saudade da minha velhinha. Me sinto tão sozinho aqui...
— Mas Rafael não vem lhe visitar?
— Ah, sim... Verdade, o meu netinho! Ele é ótimo para mim. Acho que ainda é o único que se importa comigo, porque o resto quer nem saber, viu? Só você vendo.

Rafael, ao escutar isso o que o avô disse ao enfermeiro, comentou:
— É sério? Que ele disse isso?
— Lógico.
— Minha avó, Helena, morreu quando eu ainda estava no ensino médio de câncer de cólon. Ela era bem presente na minha vida também, mas nunca soube a minha sexualidade. Eu me sentia culpado às vezes, mas ele tentava fazer de tudo para me fazer esquecer desse tipo de coisa quando tocava nesse tipo de assunto. Meu pai gostava muito dela também e ficou bem triste, mas era mais próximo ao meu avô. O querido Marco depois que foi embora, nunca mais o viu e só veio para o velório e sepultamento com a nova família. Nem falou comigo e quase não conseguia olhar na minha cara. Eu, por outro lado, continuei visitando meu velhinho dia após dia e noite após noite e fazia de tudo para ele não se sentir sozinho.
— Meu Deus, que lindo. Você é muito mais forte do que eu pensava.

Ao escutar o desabafo de Rafael, Miguel o abraçou enquanto ele chorava emocionado relembrando seu passado.
— Eu nunca tive um namoro duradouro com ninguém, pra ser bem sincero. Nunca me via tendo um futuro com ninguém e não queria passar por tudo que vi meu avô e, apesar de ter feito o que fez, o meu pai passou. Não podia estar na pele da pessoa que é abandonada e se sentindo culpada por amar, vendo a pessoa que eu amo me deixar e ir embora em um piscar de olhos. Mas quando eu te conheci, foi diferente. Meu avô não sei como, mas acho que ele sabia que alguma coisa poderia acontecer e poderíamos dar certo e eu acho isso também. Você é diferente de tudo com o que eu já convivi antes.
— Não sabia que você era tão romântico assim.
— E eu não sou. Ops, não. Sério demais. Quer dizer... Oh, Miguel, você descobriu meu segredo mais profundo! Só não conte pra ninguém, ou minha reputação vai por água abaixo!
— Você é insuportável.
— Eu sei.
Rafael sorriu e o beijou.

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