Prólogo

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A chuva que caía lá fora se assemelhava às tempestades de inverno que costumavam assolar as ruas e avenidas de Londres, deixando-as excessivamente escorregadias e perigosas.

Protegido pelas paredes de sua casa, o Conde Walter, andava de um lado para o outro, incapaz de conter seu nervosismo, enquanto o tique taque do relógio no corredor de entrada parecia marcar a cada minuto o seu desespero.

Sua esposa, Bertha, estava em trabalho de parto, o que pareciam horas, e de onde ele estava, podia ouvir seus gemidos de dor entre as contrações que castigavam seu corpo franzino, fazendo com que o Conde apertasse os punhos, sentindo uma impotência dentro de si, por não poder ajudá-la a passar por aquele momento de forma menos sofrida.

Sua mente voou longe dali, em uma tentativa de bloquear seus sentimentos angustiantes, forçando-o a se lembrar do dia que conhecera Bertha.

O casamento fora arranjado por seus pais, que encontraram na garota ruiva e de personalidade marcante, a escolha perfeita para o filho tímido e com o nariz sempre enfiado nos livros.

Walter já estava na idade de se casar e dar a continuidade a linhagem de sua família, mas seus pais temiam que ele acabasse fazendo uma escolha ruim, ou nenhuma escolha, pois sua  vida em sociedade era quase nula. Não tinha interesse por festas, não fazia amigos com facilidade e quando era apresentado a uma garota, mal trocava duas palavras com ela, e depois se fechava em um mutismo total.

Entretanto,  quando conhecera Bertha, Walter se apaixonara imediatamente, porque ela se mostrara especialmente simpática com ele, permitindo que ele a visse como de fato era. Após alguns encontros supervisionados por sua dama de companhia, ele percebera,  que aquela garota de beleza delicada, era a mulher que desejava para ser sua esposa.

Assim, nos cinco anos em que viveram juntos, ele realmente fora feliz, pois Bertha fizera de seus dias uma sucessão de momentos incríveis que jamais esqueceria enquanto estivesse vivo naquele mundo.

 Então,  quando pensara que já tinha tudo o que precisava, Bertha lhe contara que estava grávida.   E após alguns meses terem  se passado, o médico lhes dissera, que tudo indicava que teriam filhos gêmeos, e foi nesse instante que Walter entendera, que sua felicidade estava completa.

Afastando os pensamentos do passado, o rapaz concentrou seu olhar na chuva que continuava a cair, enquanto sua esposa permanecia lutando para que seus filhos viessem ao mundo sadios.

Seu coração se apertava a cada novo gemido, e o jovem Conde rezava para que aquilo terminasse logo,  e ele pudesse ter Bertha sorrindo novamente, enquanto lhe apresentava os filhos, a quem estava ansioso para conhecer.

O silêncio o pegou de repente, pois quando percebeu, não ouvia mais os ruídos que vinham do quarto anteriormente e um pânico súbito o acometeu. Ele estava quase arrombando a porta do quarto e ver o que estava acontecendo, quando a enfermeira apareceu e lhe disse sorrindo:

— Sr. Conde, suas filhas acabaram de nascer. Venha conhecê-las, são lindas.

— Então, são meninas? - Ele perguntou, emocionado, ao se lembrar que duas garotinhas era o que Bertha mais desejava.

— Sim, são duas garotinhas perfeitas. -  A enfermeira concordou.

— Ah, Meu Deus! - Ele disse quase chorando, e quando entrou no quarto, a moça que ajudara o médico no parto lhe entregou os dois bebês, enrolados em um cobertor branco.

Olhando para suas duas filhas, ele não pôde deixar de sorrir ao ver a penugem ruiva que enfeitavam as suas cabecinhas. Elas seriam tão lindas quanto a mãe só por conta daquela cor de cabelo maravilhosa.

Após observar todos os detalhes das garotinhas, Walter se aproximou da cama de sua esposa com as meninas nos braços, mas notou que ela continuava com os olhos fechados e uma palidez excessiva. Preocupado, o rapaz olhou para o médico que estava parado ao lado da cama e perguntou:

— Doutor, o que houve com minha esposa?

— Sinto muito. - O médico disse, balançando a cabeça. - A Condessa se foi.

Um terremoto interno tomou conta de Walter, que sentiu seu mundo girar em uma órbita louca. Ele nem sequer ouviu a explicação do médico, que lhe contava sobre a hemorragia que Bertha sofrera ao dar à luz.

Tudo o que conseguia sentir era uma escuridão imensa, tragando sua vida e sua felicidade, deixando no lugar um buraco imenso que nunca mais seria preenchido.

Então, algo se rompeu dentro dele e uma dor terrível o atingiu, e ele gritou de uma forma animalesca, ecoando pela casa toda como se nunca mais fosse parar. Minutos depois, Walter caiu de joelhos e ali ele ficou olhando para as filhas desesperado, sentindo que o buraco dentro dele aumentara, o engolindo por inteiro.

Dois lados da mesma moedaOnde histórias criam vida. Descubra agora