O relógio de parede marcava meia- noite e a casa dos Shirleys estava em um completo breu. Anne ainda estava acordada, seus olhos pregados no teto, analisando sem grande interesse as formas que a pouca luz de fora desenhava ali.
Seu pensamento estava longe, flutuando para além do oceano, onde imaginava que Amybeth deveria estar.
Ela se virou de lado e colocou a mão sobre o coração. Doía exatamente ali, e a cada dia um pouco mais, pois estar longe de sua irmã era como sentir que uma parte sua tinha sido arrancada, sem anestesia nenhuma.
Fazia um mês que ela tinha viajado, mas pela maneira como Anne contara cada dia em sua mente, parecia bem mais. Sua ligação com Amybeth era forte, e tinha todo um quadro genético para comprovar. Por isso, viver esperando por notícias dela era um tormento sem fim.
Anne também estava preocupada consigo mesma. Quando aceitara ser a noiva do rapaz para ajudar a irmã, não pensara com clareza e nem em tudo o que implicaria tal compromisso. Ela estava realmente preparada para ser esposa do duque?
Em casamentos arranjados, os sentimentos do casal envolvido nunca eram levados em conta, o que prevalecia eram as vantagens que ambas as famílias teriam, mas esperava-se que com o tempo, eles desenvolvessem sentimentos um pelo outro.
Anne sempre soubera que um dia, seu pai escolheria o homem com quem ela iria se casar, mas a ruivinha esperava ter tempo para conhecer seu pretendente antes de assumir um compromisso tão sério. Entretanto, ela não pensara que o noivo destinado à sua irmã seria na verdade o seu.
Estava vivendo uma mentira e não se sentia confortável naquela situação. Gilbert era um homem muito interessante, respeitador e inteligente acima da média. Não seria difícil se apaixonar por ele, principalmente porque tinha dentro de si um romantismo exacerbado. Era fácil pintá-lo em sua mente como um herói que salvaria a princesa de apuros, contudo tinha que ser realista.
Estava vivendo uma vida que não era a sua, se apoderando do lugar de sua irmã de forma vergonhosa, mesmo que Amybeth tivesse lhe pedido isso, ela sabia que não era certo.
Com certo desconforto, Anne pensou na noite de núpcias. Ela sabia o que acontecia entre um homem e uma mulher entre quatro paredes. Felizmente, Diana tinha uma tia que explicara para ambas sobre esse detalhe.
Tia Josephine era uma mulher do mundo. Casara-se cedo e ficara viúva cedo também. A boa senhora tinha uma personalidade forte. Não deixava que as regras da sociedade moldassem sua vida. Ela tinha uma mente aberta e aceitava o amor de todas as formas possíveis e o praticava também.
A primeira vez que Anne conversara com ela, não pôde deixar de ficar chocada com sua visão do mundo, como também não pudera deixar de admirar sua franqueza crua. Ela tinha dezesseis anos na ocasião, mas Tia Josephine abrira seus olhos para muita coisa.
Com palavras simples, mas diretas, a tia de Diana explicara com detalhes o que aconteceria na primeira noite de casada de uma mulher, e por isso, Anne era extremamente grata.
Não tivera uma mãe para vê-la crescer e se tornar adulta para direcioná-la como Tia Josephine tinha feito. Ela também lhe afirmara que poderia ser agradável ou não, dependendo de como a mulher e o homem se sentissem confortáveis um com o outro. Mas enfatizara que, apesar de a sociedade afirmar que o homem era responsável por conduzir tal ato, a mulher podia e deveria participar do momento, fazendo o que lhe agradasse e dizendo não ao que não a deixasse segura.
O ato de amor era também um ato de comunhão, não só do corpo, mas da alma e mente também. Era um momento íntimo, onde duas pessoas estavam dispostas a se conhecer por inteiro. Por isso, não podia ser dividido e sim compartilhado
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Dois lados da mesma moeda
FanfictionDuas irmãs gêmeas, idênticas em aparência, mas completamente distintas em personalidade. Tímida e sonhadora, Anne é como um amanhecer calmo e tranquilo, enquanto Amybeth é inconstante como uma tempestade de verão. Filha de um Conde de saúde fragiliz...