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Uma semana depois.

Alguns dias se passaram desde que cheguei no Brasil e me instalei em um apartamento localizado no centro da cidade, perto o suficiente do local que vai acontecer a exposição dentro de alguns dias.

Nesse meio tempo visitei o orfanato e notei que a situação é bem pior do que eu pensava, mas espero que futuramente isso vá mudar. A minha maior preocupação nesse momento seria me decidir se avisava ao meu pai que estava aqui. Que havia voltado, mas que não pretendo ficar. Que havia descoberto o que ele fez.

Porém, a raiva, o rancor e o passado martelam na minha mente. A morte da minha mãe desde que fui embora, nunca realmente foi uma morte, ela sempre esteve viva aqui dentro e isso me perturba todas as vezes que penso nele. Que penso no que aconteceu e vi naquela noite. Nunca consegui perdoa-lo de verdade.

Instantâneamente fecho os olhos e como um raio rápido revivo tudo novamente e em questões de segundos estou no passado:

Onze anos atrás, segunda-feira.

23:59h:

Como se as nuvens escuras soubesse que uma garota de pernas finas, alta e cabelos teimosos, queimados como o sol, chorava em cima do túmulo da mãe, gotas d'agua caem do céu, chorando junto a ela.

- Mamãe... - a voz da menina era trêmula e frágil, embargada de lágrimas. Suas mãos pequenas agarravam fortemente o corpo da mãe gelado, como se a mulher fosse levantar e retribuir o seu último abraço. - Por favor, volta. - implorou com o rosto enterrado no pescoço da cadáver. - Não me deixa aqui... - chorou mais alto, comovendo as poucas pessoas que estavam presentes naquele momento.

- Joyce, querida... - o homem mais velho se aproxima da garota, mesmo com o coração em pedaços e tenta distanciar seu corpo quente da mulher que um dia já amou. - Não torne as coisas mais difíceis...- tentou ser gentil e compreensível, mas a garotinha foi relutante e continuou agarrada na mulher.

E pela primeira vez o rosto da menina se afastou do pescoço da mulher, apenas para encarar o rosto fofo e pálido. Suas mãos pequenas tocou cada canto, parecendo não acreditar que seria possível que essa seria a última vez que iria vê-la.

- Se a senhora se levantar... - uma lágrima diferente das outras, mais pesada e dolorosa caiu dos olhos inchados da menina. - Eu prometo que vou ser uma boa garota. Vou tirar notas boas e vou obedecer... - sussurrou, chorando cada vez mais. Seu pai tocou novamente o seu ombro e seu rosto voltou a se fundar no pescoço da mãe morta. - Por favor, mamãe... Por favor, só dessa vez...

Algumas crianças que estavam presentes, um pouco distante, não aguentaram ver a melhor amiga deles chorando sozinha e então, se juntaram a ela, lhe abraçando fortemente, fazendo com que a menina solte da mãe e os agarre, retribuindo o abraço entre lágrimas e soluços alto. Um trovão alto ecoou por todo o céu, com raios que iluminou a escuridão, garantindo que aquele dia todos choravam.

03:45AM

O corpo da menina encolhido se tremia mesmo de baixo do cobertor grosso e quente, ela sentia tudo ao mesmo tempo que chorava sem parar. Ainda estava inconformada e o seu corpo começava a adoecer. Como um instinto de proteção a garota pensou no seu pai para refugia-la, para dormir com ela aquela noite, como a mãe fazia sempre que estava com medo.

Até Que o Sol Não Nasça Mais Onde histórias criam vida. Descubra agora