Vênus e a pressa de viver.

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Dia 7

Do que é que a gente tem tanta pressa?

Pergunto-me assim que acordo assustada, minhas vestes eram como um vestido de seda abotoado, atordoado feito meu coração, amontoado nas cobertas pedindo por compaixão.

DO QUE É QUE A GENTE TEM TANTA PRESSA?
Grito me afundando no colchão. Sequer temos tempo de comer, beber, fumar e até mesmo piscar. E num piscar de olhos tudo se vai e se torna passado se torna história para contar, algo para recordar.

E me pergunto, do que é que a gente tem tanta pressa?

Pressa de viver? de crescer? de amar? de morrer? não creio que queiramos morrer. A vida passa por nossos olhos num piscar e não temos tempo sequer de escutar.

"Escutar o que?" uma voz vem ao longe.

- Quem está ai? - pergunto, se estou sozinha não devia ouvir ninguém falar.

"Escutar o que?" diz a voz como um suspiro e num vislumbre de luz consigo enxergar, consigo alcançar, contemplar...

Plácida em minha frente estaria a mulher mais deslumbrante que já havia visto. Podia sentir o vazio e o tremor, a vida e o pesar, o amor e a dor, a cor, o desespero... já não sei mais o que sentir se são tantos sentimentos acumulados em um só. Teus cabelos tão negros quanto a escuridão, teus olhos cor de céu salpicado de estrelas, a pele tão macia e a cor? Eu não sabia dizer, era como tudo e nada, sua pele brilhava.


"Oras, vais dizer-me o que tenho de escutar ou não?" disse pela última vez. Engulo a incerteza.

- não sei em que momento passamos a não escutar, não ouvir. Hoje sequer ouviu algo além dos próprios pensamentos, dos próprios medos, da própria vida?

Assim que pergunto, meu quarto já não é mais meu quarto, as luzes já não estão acesas, a escuridão da noite me engole com destreza levando embora o alvorecer que antes mantinha o ambiente. Agora me encontro deitada na grama de lugar nenhum, observando as estrelas pela visão de outro planeta, a moça que mais parecia Vênus encarnada - não ousou dizer-me o nome teu - deitada ao meu lado como se tivesse algo a contemplar em meio a tantas estrelas, tantos universos e planetas e contelações e... Tudo que meus olhos alcançam no céu. a pergunta ressoava em minha cabeça como uma sirene, como uma musica alta, uma voz que se sobressai no meio a tantas outras. Pressa. Pressa. Pressa. Pressa. Pressa . Pressa. Pressa. Pressa. Pressa...

Então, como se me ouvisse, me escutasse. Me escutasse de verdade. Ela me respondeu. Mas sequer mecheu os labios, sua voz ressoava como um vinho suave em minha cabeça, algum tipo de laço.

"Temos pressa do que é novo, do que é diferente, estamos tão ocupados pensando em nós mesmos que esquecemos que existem outras pessoas no mundo, outros ares, lugares, outras idas e vindas, temos tanto pra ver tanto para experimentar que esquecemos sequer de qual era o verdadeiro querer, o verdadeiro objetivo inicial de fato."

- Penso que - complemento me sentando na grama ilusória do que quer que seja isto - não há nada mais sincero que ser escutado de fato, o ato de ouvir alguém parece tão banal, mas é algo tão singelo. Não entendo porque tudo tem que ser tão rápido, as conversas, os filmes, as músicas, tudo tem que ser em questão de segundos e de repente não aproveitamos mais o que de fato foi feito pra apreciar.

Ninguém ta afim de ouvir o que temos a dizer depois de 8 palavras ou duas frases, ninguém quer ler nossos versos, cantarolar conosco nossas melodias mais profundas e nos aproveitar, ninguém quer dançar minha dança num ritmo engraçado e fulgás nem lambuzar-se de meus prazeres e quereres e tudo que tenho a dizer a mais do que só 15 segundos de conversa paralela, eu tenho mais a dizer, coisas pra tagarelar e me faltam pessoas pra ouvir. Todos tem pressa de ouvir o que toca minh'alma, mas almejam por quem escute o som da própria.

Temos tanta pressa de viver que esquecemos de viver de fato, esquecemos qual o sentido disso tudo, de estar aqui e simplesmente, escutar... Temos tanta pressa e com tanta pressa nem nos escutamos mais.

E temos tanta pressa, e pressa, e pressa, e pressa, e pressa, e pressa, e pressa...

A senhorita Vênus me abraça, um toque suave como se me dissesse "eu te escuto" num tom baixinho, minha alma se silencia ao sentir a reciprocidade, o afeto, o cuidado.

"Eu tenho pressa, tenho pressa de conhecer os mais belos planetas, brincar com as mais risonhas estrelas e me sentir acolhida em algum universo.

"Tenho pressa de viver e ser amada e de almejar aproveitar minha própria vida cheia de infinidades. Eu tenho a eternidade, e isso me faz parar no tempo, me faz questionar se de fato valha a pena ter tanta pressa se tenho o infinito, se tudo uma hora chega e o tempo seja quem sabe meu eterno amigo, trazendo pra mim uma constelação de grandes possibilidades.

Eu tenho pressa. Eu tenho pressa. Eu tinha. Eu tinha pressa."

"Não tenha pressa Lina, não se acabe em desespero por não ter tudo a todo momento, não se jogue no abismo das mais diversas dúvidas e ambições de ter tudo, e de querer tudo agora, nesse momento. Não se destrua tentando alcançar o tempo que você não tem.

O seu tempo chega, a sua vida acaba e o que resta? Memórias, vivência, um universo de coisas que você desconhece na ponta de seus dedos para você aproveitar. Aproveite o tempo que lhe foi dado, não tenha pressa de viver o que lhe foi predestinado, o que é seu virá, como o vento aos mares. E o depois? é só depois."

Lágrimas escorrem por meu rosto, não entendo porque estou chorando mas a cada pranto vou sentindo o toque ser mais distante, a luz que nos iluminava se apagar e a brisa fresca do espaço se dissipar como num passe de mágica.

Como num sonho. Sonho. Sonho... Vênus havia sido um sonho. Minha memória inconsolável de algo que sequer existiu de fato.

Agora, me resta não ter pressa de esperá-la voltar.

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