Pilar

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Nossa vida é regida por cinco pilares, que com mais frequencia que não, se encontram e entrelaçam, e na maior parte das vezes, caem.

Nos resta então três possibilidades, fingir que aquele pilar não faz falta e seguir em desequilíbrio, deixar a queda de um pilar na nossa vida se tornar um obstáculo em nossa jornada e simplesmente desistir de caminhar, ou reconstruí-lo pouco a pouco.

A maior parte das pessoas optam sempre pelo primeiro, fingir sempre vai ser mais fácil do que enfrentar, embora doa muito mais.

Existem também as pessoas que preferem parar, chorando para sempre o fim de uma estrutura que um dia esteve de pé, e tal como um jardineiro deixando de cuidar de todo um jardim por conta da morte de uma única flor, com o tempo todas morrem.

Reconstruir, porém, leva tempo, esforço, coragem.

Nem todos podem fazê-lo e a maioria sequer tenta, pois o medo de ver algo pelo qual lutamos dar errado é muito maior do que a eterna insatisfação de ter um pilar faltando em nossa construção que é a vida.

Escolhas estão presentes na nossa vida desde muito, muito cedo. Algumas delas são feitas por nós, outras são apenas colocadas em nossa frente e não temos opções a não ser aceitá-las.

Existem as verdades que nós descobrimos da pior maneira, e também as verdades que nunca fizeram questão de nos esconder, e tanto escolhas quanto verdades se encontram num ponto em comum, que é o terceiro pilar para a maioria das pessoas, consequências.

Nossas escolhas e nossas verdades sempre e para sempre terão um impacto na nossa vida e na vida de todos ao nosso redor, não importa o quanto corra, se esconda, se prive... As consequências sempre hão de vir, e dela, o rumo das vidas alterados mais uma vez.

***

"Delegacia de Nova Primavera, Marino falando." Estava tarde, ele estava cansado, mas os problemas não paravam de chegar, já havia até avisado Lucinda que iria demorar pra chegar em casa. "Boa noite, Junqueira, escuta, da uma checada nos hospitais aí da capital, tô com um caso de desaparecimento em Florbela, morador daqui, sumiu lá, sem documentos. Mas sei que ele é pequeno e branco"

Havia pouco mais de duas horas desde que Ramiro entrou na delegacia quebrando tudo, gritando, sem controle, sem amarras. Marino já tinha visto o rapaz em fúria antes, diversas vezes, era familiarizado com o temperamento de Ramiro, mas nunca havia visto o preto daquele jeito.

Na verdade, em tanto tempo na polícia, ele nunca tinha visto alguém tão desesperado, tão cheio de raiva, tão possesso, não sabe nem se conseguiria enfrentar o ex peão se precisasse, tamanho era o descontrole de Ramiro que Marino não pôde fazer nada além de ouvir.

Kelvin foi sequestrado em Florbela, e Ramiro tinha recebido uma informação de que o rapaz estava em algum lugar perto de Campo Grande, pelo menos foi o que ele entendeu dentre tantos gritos e socos nas mesas.

Ramiro mal conseguia respirar, tinha medo que ele caísse duro no meio da delegacia, chegou a oferecer uma água para ele mas não foi aceita, a única coisa clara e alta que Marino e todos da delegacia conseguiram ouvir de Ramiro foi a ameaça que ele fez antes de sair, sem direção.

"Si o Kevin morrê, oceis tudo há de conhecer o inferno"

E agora, lá estava ele, na quarta xícara de café, conversando com cada delegado das cidades redores, procurando por algum sinal de Kelvin, e pra piorar a situação, o rapaz estava sem documentos, sem celular. Seria basicamente impossível encontrá-lo.

"Olha, faz assim, pesquisa no seu computador Kelvin Star, é esse o cara." Simples, tão mais simples. "É urgente Junqueira."

Mas, como era de se esperar, casos como o de Kelvin não são tratados com a atenção necessária, e mesmo que Marino estivesse a dois passos de encontrar o rapaz, o sistema falho para qual trabalhava e defendia com tanta garra se mantia no caminho, e como era de se esperar, o delegado não fazia questão de dedicar nenhum minuto além do necessário naquela situação.

Sweet HomeOnde histórias criam vida. Descubra agora