Capítulo 7 - Bons sonhos, querida.

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Como ele pôde me dizer todas aquelas coisas sem que sequer ficasse ruborizado? Ele realmente não possuía nenhuma vergonha na cara, diferente de mim, que só conseguia pensar em me enterrar num esconderijo e não precisar sair de lá nunca mais.

Minha mente só conseguia pensar em “ele viu aquilo! ele te viu fazendo aquilo na corda!” e isso estava me matando. Ele contaria a alguém? As pessoas acreditariam nele caso contasse? Certamente eu iria negar tudo até a morte.

Rodopiando em minha cama, eu levantei em um sobressalto quando ouvi um barulho vindo diretamente da minha janela, que estava devidamente fechada pelo frio que fazia. Fiquei atenta por alguns segundos, a fim de averiguar se o barulho se repetiria e, quando ouvi novamente, me levantei andando até a beirada da janela para verificar o lado de fora.

Uma pedra de tamanho médio atingiu o vidro, me fazendo abrir para dar uma bronca em quem quer que fosse. Talvez algum grupo de pirralhos sem mais o que fazer.

Reconheci imediatamente Decan com seu inconfundível tapa-olho marrom e suas roupas em tons de marrom e verde musgo. Por Deus, por que ele parecia tão bem assim?

- Oi, querida - Ele saudou, como se fôssemos melhores amigos e eu nunca estive tão confusa como agora.

- O que você pensa que está fazendo? Como você sabe onde eu moro? Seu perseguidor, eu vou gritar! - Ameaçá-lo virou meu novo hobbie, ao que parecia.

- Seus pais têm um comércio conhecido, querida. Eu quero subir aí. Você deixa?

- O quê?! Você não pode estar falando sério - Estava prestes a fechar a janela e ignorar a existência de Joseph, quando o vi escalar as paredes de tijolos com tamanha facilidade, que me fez refletir sobre a possibilidade dele ser realmente um perseguidor experiente.

- Nem pense em entrar no meu quarto, cachorro sarnento. Pode parar aí! Que droga você está fazendo aqui? Isso é muito estranho - Tentei fechar a janela, mas Joseph já tinha descansado a bunda no batente, me encarando com um sorrisinho alegre demais para o meu gosto.

Ele estava drogado? Claro, ele devia usar droga, eu não ficaria surpresa.

- Faça silêncio, loirinha. Não queremos que seus pais acordem e pensem que você convidou um garoto às escondidas para o seu quarto, certo? - O sarnento estava querendo me ferrar, de fato.

- Fala logo o que você quer! - Ele se manteve sentado em minha janela, recostando o corpo na lateral dela.

O observei com o cenho franzido esperando por alguma explicação, mas somente pude vê-lo levar a mão até o bolso do casaco, retirando um cigarro solitário dali. Do bolso da frente de sua calça, ele tirou um isqueiro.

Seu rosto se contorceu em um alívio instantâneo quando tragou a nicotina e respirou fundo, sentindo a fumaça se espalhar por seu interior. Ele tombou a cabeça, aproveitando o vento frio, que trouxe a fumaça de sua droga até mim.

- A porra da minha tia Sarah foi em casa hoje - Iniciou um desabafo sem pé nem cabeça e eu, confusa, apenas esperei por mais informações.

- A mulher não parava de me apertar, me beijar e passar a mão no meu cabelo. Quantos anos eu pareço ter afinal? Sem falar que acabou com a dispensa da minha casa em uma hora de estadia - Ele tragou novamente, tirando o excesso de cinzas acumuladas na ponta do cigarro.

- Nada disso explica você estar na janela do meu quarto agora.

- Ah, isso. Bem, eu  não aguentava mais ser incomodado, então resolvi incomodar você.

Eu não respondi, me limitando a encarar o objeto queimando entre seus dedos indicador e médio, com certa curiosidade. Não era nada novo um adolescente fumante na França, mas ainda assim, de alguma forma, a coisa mais simples que o envolvia poderia me instigar facilmente.

Mixte 1963Onde histórias criam vida. Descubra agora