Joseph Descamps
A manhã do dia primeiro de novembro se inicia fria e nublada. Assim como grande parte dos franceses, meus pais passariam o dia prestando suas homenagens e lembrando de parentes que faleceram. Por sorte, a minha companhia é completamente descartada desse dia e, para mim, é como qualquer outro feriado aleatório. Costumo acordar tarde e fazer nada o dia todo. Porém, para o dia de hoje eu tinha planos.
Certa vez, numa conversa que tive com meu pai, ele me disse que, quando meu coração fosse conquistado por alguma mulher, eu simplesmente mudaria. Eu seria quem ela quisesse que eu fosse. Aos poucos, eu faria tudo para agradá-la. No início, eu não notaria, pois a mudança seria gradual, mas eu me tornaria uma pessoa diferente da qual estava acostumado a ser. Na época, eu não tinha interesse algum no assunto e, obviamente, não dei credibilidade ao meu velho. Porém, ao pensar em minhas ações de hoje e de semanas atrás, eu posso ver a verdade sendo arremessada com toda a força em cima do meu orgulho.
- Se cuida, meu menino. Eu te amo - Minha mãe, sempre tão doce, se despede antes de sair. Eu pulo da cama, me sentindo empolgado para o restante do dia.
Meu banho de banheira é longo e regado a, pelo menos, três cigarros. A água quente banha meu corpo de maneira a acalmar meus ânimos, porque a ansiedade insiste em fazer morada em mim. A calça marrom grossa e pesada fica levemente larga nas pernas e cintura. Nada que um cinto não resolva. O suéter de cor café se ajusta bem no meu tronco, e combina com a jaqueta de couro da mesma cor. O tapa-olho sempre presente, quase como parte do meu corpo, já não era tão estranho agora.
Ainda com os cabelos úmidos, pedalei até a casa de Michéle, ainda com a ansiedade incômoda em meu peito. O que há afinal? Já fiz o mesmo caminho algumas vezes. Talvez a noção de que eu pudesse estar envolto numa paixão ardente adolescente, da qual tanto ouvi falar, tivesse me deixado realmente hesitante. Era recíproco, afinal. Se não fosse, a loira atrevida teria me colocado para correr como o “cão sarnento” que ela insiste em dizer que sou. Ao que parece, ela resolveu adotar e alimentar esse vira-lata e eu não sou louco de reclamar.
Escondo a bicicleta atrás da casa e volto para bater na porta. É tarde o bastante para sua família ter saído de casa. Tenho certeza disso quando uma loira, com olhos estonteantemente verdes abre a porta da frente com um sorriso enorme no rosto, capaz de fazer meu corpo se acalmar em questão de segundos.
- Decan! - Ela diz, de forma animada. Ela está de pijama rosa, bordado com flores brancas. Não conheço bem espécies de flores, porém pareciam tulipas. Ela me abraça, e eu agarro sua cintura, descansando meu rosto em seu ombro, sentindo o cheiro gostoso que vinha de seus cabelos longos.
- Bom dia, querida - Ela me puxou para entrar em sua casa.
Não consegui reparar bem no local, pois eu seguia Michéle focado e vidrado, como filhote de pato seguindo seus irmãos em fila linear. As escadas de madeira rangiam enquanto nós subíamos e eu sabia que estávamos indo para seu quarto. E, apesar de já ter estado lá antes, senti que dessa vez havia algo de diferente. Eu sabia que Michéle sentia o mesmo, pois me olhava com certa timidez e expectativa.
A janela estava aberta, fazendo o ambiente ficar mais frio que o comum. A garota deitou-se em sua cama de maneira preguiçosa, espreguiçando-se como um gato que acabou de acordar de um longo cochilo.
- Vem aqui - E eu vou como um cachorrinho, fazendo o que ela pediu.
Tirei os sapatos de qualquer maneira e me deitei ao lado dela. A franja estava bagunçada de uma maneira adorável e seus olhos me observavam atentos.
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Mixte 1963
FanficO Instituto Voltaire antes somente para meninos aderiu uma nova política de admissão: agora tornaria-se um colégio misto, forçando garotos acostumados a lidarem apenas com o mundo masculino, de repente, estarem rodeados de saias, laços e atrevimento...