II 2.8 Fantasma

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Christine chegou a Adij Rariff tão afobada que quase atropelou a Sra. Fidelma com o trote rápido do seu cavalo.

A senhora emitiu um berro quando o corcel de Damien quase a derrubou, mas ela apenas gritou um pedido de desculpas e seguiu para as cocheiras, abandonando o cavalo exausto aos cuidados de Dario.

Minutos depois, já subia a escadaria do vitral de Bahija. Projetando a sua energia, procurou por Rael, mas encontrou apenas rastros de sua presença. Não estava na fortaleza.

Serena veio ao seu encontro e ela teve apenas o tempo de tirar a capa. A outra já a puxava para as masmorras. As duas desceram as escadarias, encarando o ar frio e úmido dos corredores que levavam às celas. A escada em espiral descia cada vez mais e os guardas se afastaram para deixar a regente passar.

Com frases apressadas, Christine contou o que ouvira sobre a diáspora dos filhos e o temor de Heralis sobre o que estava escondido na nova cidade, Bahadum.

Ao som daquele nome – Bahadum – Serena parou abruptamente, elevando a cabeça para encará-la do degrau logo abaixo. Christine viu, pela primeira vez em anos, que seus olhos se reviravam, suas mãos tremiam, seus pés perdiam o equilíbrio no meio da escadaria íngreme. Chris não via aquilo desde a queda da Torre do Arzhel, mas ainda conseguia identificar os sinais: uma visão chegava e seria arrebatadora.

Seu estômago se contorceu em antecipação.

Uma visão de Serena era tudo o que ela precisava!

Estava exausta de tentar encontrar respostas sozinha quando tinha ao seu alcance a maior ghaya já tocada por Alim desde os tempos de Merab... Mas os dedos de Serena seguraram firmemente seu pulso e, logo, seus olhos estavam normais, determinados.

Serena a mirou ofegante.

– O que você viu? – questionou Christine com urgência.

– Nada – a antiga ghaya mentiu.

– Serena...

– Foi apenas um momento de fraqueza.

– Por favor, Serena, você pode não acreditar, mas não nos prive da sua visão!

– Não é visão, é loucura!
– Amadam não me dá mesmo um minuto de paz! Agora que sou a Qayid a maior ghaya da Ilha resolve que não vai mais cooperar! Diga logo o que você viu! — irritou-se Chris.

– Um fantasma – cantarolou uma voz antiga. – Ou um novo Raj. Não foi isso que viu, criança?

Os lábios de Serena se crisparam: – Não sou criança. E fantasmas não existem.

– Concordo. Fantasmas não existem. Resta a outra alternativa – a voz veio sorrateira, deslizando entre as grades da última cela como uma cobra.

As duas terminaram de descer as escadas e se viram diante da escuridão em que a velha ghaya vivia. Christine acendeu uma chama na palma da mão. Olhos ametistas e cansados brilharam na escuridão.

– Saia da minha mente – cuspiu Serena.

– Ora, ora... Que visitas mal-criadas... Seus pais não lhe deram modos? – a velha riu, batendo a bengala contra a pedra. – Creio que não.

Christine tentou conter a raiva. Rowena Gwenaël zombava delas, sabia muito bem quanto a infância das duas não havia sido privilegiada com amor e cuidados.

– Rowena – chamou Christine. – Conte-nos sobre Judicaël.

– Tão mandona... Que tal começar me chamando de titia?

– Titia... – Christine revirou os olhos, mas repetiu a palavra, surpreendendo Serena. O que antes lhe custava tanto, agora ela passava por cima sem ao menos pestanejar. Esse era o tamanho do seu empenho em salvar a Ilha. A amiga sentiu orgulho da nova Qayid. – A senhora está de bom humor para quem apodrece há anos nesta cela.

O Portal IV - Fios de Alim - Degustação Onde histórias criam vida. Descubra agora