✩‧₊ nove.

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Henrique.

— Quando é que você ia me contar que tá namorando? — Quando o questionamento do meu pai alcança meus ouvidos, interrompe quaisquer que sejam as minhas intenções no momento.

É uma manhã tipicamente quente no Tocantins. Antes da sete, eu já estou despido da cintura para cima, tratando de carregar sacos de ração que estavam empilhados dentro do galpão para o curral, porque o atraso na entrega da mercadoria provocou uma reação em cadeia. Isso até que Edson apareça no meu campo de visão, adentrando o ambiente com o celular em mãos e os olhos fixamente presos a tela.

— Como o senhor sabe?

— Uai, pelo visto até o Léo Dias soube antes de mim.

Não preciso pedir que ele me explique; meu pai vira a tela no aparelho e eu solto o saco de ração sobre o chão, endireitando a coluna para crescer meus olhos até a imagem. Na página, a manchete diz "Cantor Henrique, da dupla Henrique e Juliano, é visto em clima de romance com nova namorada". Abaixo, há fotos de pouca qualidade do suposto encontro.

Reconheço alguns dos momentos. Em muitas delas, Estela aparece gesticulando ao me dizer coisas banais — e eu, como sempre, tenho os olhos vidrados nela. Em outras, eu estou com a mão na perna dela, sussurrando frases idiotas no seu ouvido apenas para que ela solte um sorriso espontâneo.

Tudo bem, ao que parece esse é o momento de ser irracional e começar a mentir descaradamente. Sem pressão, me lembro ao me afastar da tela.

— Você tem alguma coisa a dizer? — Edson sugere. Quando torna a guardar o aparelho celular, me encara. Nesse momento, eu tenho uma certeza: melhor que seja ele do que a minha mãe. Maria certamente não seria tão pacífica ao cobrar por explicações.

Umedeço os lábios e encaro a feição sempre tranquila de meu pai. Apesar do teor da conversa, ele parece tranquilo.

— Eu queria ter contado antes. — Murmuro vagamente.

— Isso é sério pelo visto, então? — Ele repete a ideia. Parece pouco convencido.

Eu sei que a ideia deve soar estranha aos meus pais. Eu sempre tive liberdade de apresentar a eles qualquer uma das mulheres com que me relacionei, estando em um relacionamento ou não, e eu nunca fui exatamente discreto — o que talvez tenha sido um defeito. É a primeira vez, em teoria, que eu não apresento uma namorada a eles antes de se tornar algo público.

— É. É recente, pai. — Afirmo. Vejo um sorriso levantar os cantos da sua boca enquanto dou as costas para ajeitar o saco de ração mal apoiado sobre o chão. — E, apesar de tudo, a Estela é tímida.

— Você tá com medo dela conhecer a sua família. — Ele supõe. E, apesar de nunca ter sido um problema, a ideia me assombra pela primeira vez.

Talvez.

— Henrique. — Ele me repreende. Em resposta, dou de ombros, sentindo o suor crescer pelo meu corpo. — Você nunca foi disso. Sempre trouxe mulher para dentro de casa, até mesmo quando não devia.

A ideia me faz rir por um momento, enquanto contemplo seu semblante descontraído. Meus pais nunca se queixaram de nada disso. Eles sempre souberam que o julgamento deles é parte importante na minha vida, e que se eu vou me relacionar com alguém, então essa pessoa precisa ter um bom vínculo com ele. Mas, nunca pensei que um dia estaríamos discutindo a situação porque eu deixei de fazer.

— O que ela tem de diferente das outras? — Acenando com a cabeça, Edson me pressiona a dizer. Eu abandono o peso do saco apoiando-o sobre a parede, e estranho o teor da sua pergunta:

Imprevisivelmente, seu | Ricelly HenriqueOnde histórias criam vida. Descubra agora