Sombras do Passado

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As crianças recebiam uma quantidade insuficiente de comida. Todos estavam famintos, com pouca vitalidade, como se a morte estivesse à espreita, esperando-os. Passaram-se quatro dias com apenas uma refeição por dia, e suas barrigas doíam de fome.

Naquele dia, já passara do horário habitual, e ninguém havia trazido comida para eles. Ansiosos, eles aguardavam, olhando para a porta, com as bocas secas e o medo permeando a sala.

De repente, uma batida na porta seguida de passos alertavam a todos. Uma sombra se projetava sob a porta, e alguém jogava apenas um prato de comida antes de se pronunciar.

"Só tem um prato de comida pra todos vocês, é bom fazer valer apena" alerta o homen, com uma voz que coloca medo em seus corações.

As crianças, já exaustas, parecem perder o resto de esperança que tinha, se é que tinham. Algumas parecem só esperar a hora da morte, outras desejam do fundo do seu coração que aquilo fosse só um pesadelo.

Como poderia existir homens tão cruéis, o que elas fizeram para eles? Em nenhum momento elas pediram pra ser levadas por eles, por que só não libertam ela, por que aquilo tudo?!

Aos poucos, o medo e a desesperança perdia o espaço em sua mente, e a fome falava cada vez mais alto, a vontade era de saltar naquele único prato, mas seus olhos também iam em direção um do outro, olhares suspeito e desafiadores eram trocados.

Porém, no meio daqueles olhos maliciosos, um pessoa passar por todos eles, sem trocar um olhar com alguém, com nariz baixo, ia em direção da comida, suas pernas desmontaram sua franqueza, mal podia se manter em pé. Aquilo chamava atenção de todos.

Sophia, com sua expressão abatida, sugeriu timidamente: "Poderíamos dividir, deve ser o suficiente se cada um comer um pouco." Ela tentava forçar uma esperança falsa, tanto para os outros quanto para si mesma.

Todos ali parece não confiar naquelas palavras, a fome era tanto, que mesmo que qualquer um comesse dois pratos daquele, ainda estaria famintos.

No entanto, antes que alguém pudesse responder, um empurrão vindo de trás atingiu-a violentamente, jogando-a contra a parede. O som do impacto ecoou pela sala, deixando todos atordoados, olhando em direção de seu agressor.

Um menino avança em direção à comida, gritando para o resto da sala: "É minha comida, minha! Eu vou comer, vocês só sabem choramingar. Eu vou comer tudo, eu vou..."

Seu gritos mostram sua determinação, sua raiva, ele não se importava com nada e passaria por cima de todos se possível, a atitude dele deixa o resto das outras crianças mais apavoradas.

Então sua voz é abruptamente interrompida, como se ele estivesse sufocando. Ele tenta continuar a falar, mas apenas sangue jorra de sua boca, voando em todas as direções. Os presentes na sala observam aterrorizados, enquanto o menino cai no chão, tremendo e continuando a sangrar.

Atrás dele, Annie surge com um pedaço de vidro, seu rosto manchado pelo sangue. Ela havia acertado seu pescoço. Todos ali a encaram, sentindo medo, mas a fome que os consumia era ainda mais poderosa.

Annie estava aprovada pelo que tinha acabado de fazer, sua mãos tremem, o que ela tinha feito? Seus olhos transbordando, implorando pra que ninguém mais siga seu exemplo, que a violência acaba ali.

Mas a fome gritava cada vez mais alto, um dor que parecia ser eterna. Suas bocas salivam, seus dentes rangem, seus olhos imploram por qualquer coisa que possa saciar sua fome, eles não tem nada a perder.

Outra garota se aproxima dela, mas Annie corta rapidamente seu rosto e desfere um golpe que a incapacita. A garota cai no chão sem vida. Agora, apenas duas restavam.

Em meio ao caos, Annie lutava para se defender, sua mente oscilando entre a culpa e a necessidade de sobreviver. Cada golpe era uma batalha entre sua humanidade e a fera faminta que ameaçava consumi-la.

Elas se encaram enquanto Annie recua, pega o prato do chão e o arremessa na direção de uma delas que avançava em sua direção, deixando-a atordoada.

Em seguida, ela utiliza o pedaço de vidro para se defender, causando um ferimento na barriga da segunda garota. O impacto do golpe é evidente.

Antes de se virar, Annie recebe um golpe na costa com força, machucando-a. No entanto, ela ignora a dor. A adrenalina a mantém focada. Ela se abaixa e acerta a perna da última pessoa, que se abaixa de dor, e então é golpeada no pescoço.

Ela se ajoelha sobre o corpo, desferindo vários e vários golpes na pessoa, a mão pesava toneladas, ela não conseguia parar.

Annie puxa o caco de vidro, fazendo o sangue jorrar em seu rosto. Todos ali estavam mortos.

Coberta de sangue, sentindo uma dor excruciante do golpe que recebeu. Sua mão sangrava, cortada pela própria arma que usou. Tremendo, ela usa a camisa de um dos corpos para cobrir a ferida e dá um nó com força, tremendo toda.

Caminhando pela sala, seus olhos se fixam no corpo de Sophia, caída no chão, já morta. As lágrimas começam a escorrer pelo rosto de Annie, enquanto um grito de desespero rasga o silêncio. Raiva, medo e culpa se misturam dentro dela, mas a fome a consome.

Ela se arrasta até a comida no chão e devora tudo vorazmente, suas lágrimas e o sangue que cobre seu corpo temperam a refeição. Era uma maneira de garantir mais alguns dias de sobrevivência, mesmo que à custa de tudo o mais.

O chão se tingia com uma nova cor enquanto ela se alimentava, determinada a fazer o que fosse necessário para continuar vivendo. Annie sabia que agora era uma batalha pela própria vida, e estava disposta a enfrentar o mundo inteiro se fosse preciso.

Sobreviventes: Entre As SombrasOnde histórias criam vida. Descubra agora