As horas naquele quarto nunca demoraram tanto pra passar.
Ela se deitou e passou seus cremes no corpo. Stenio sentou na cama, com as costas apoiadas no batente. Ligou a televisão e ficou balançando os pés agitado enquanto roía as unhas.
— Pega um copo de água pra mim? — Ela pediu. — Estão melecadas de creme. — Ela se justificou mostrando as mãos, indo em direção ao banheiro deles para lavá-las enquanto Stenio saía.
Buscou uma garrafa d'água e o copo favorito dela e o encheu deixando no móvel de cabeceira ao lado dela.
Voltou para a mesma posição.
Balançando a perna.
Roendo as unhas.Heloísa encarou o homem com óculos de grau "assistindo" ao filme enquanto lavava as mãos e as secada na toalha. Foi até a sacada e a fechou, ligando o ar. Era uma noite muito quente e ela estava a ponto de derreter.
Tomou sua água e se deitou. Stenio continuava emburrado e ansioso daquele jeito que ela conhecia.
Heloísa apagou a luz e se aconchegou debaixo do lençol, jogando o cabelo para trás. Fechou os olhos. Continuou ouvindo o barulho.
— Porra, eu vou ter que dormir na sala? — Ela ameaçou e Stenio olhou para ela, assustado.
— Desculpa. — Ele notou que a estava incomodando e cruzou os braços. Permaneceu na mesma posição, agora com as pernas cruzadas, assistindo ao filme. Emburrado.
Heloísa suspirou e desligou a televisão.
— Ow ow, que isso? — Stenio levantou os braços, estranhando. — Não posso mais ver filme enquanto você dorme?
— Fala logo o que tá na sua cabeça porque eu te conheço e sei que você não vai dormir enquanto não conversarmos.
Ele ficou quieto e balançou a cabeça negativamente.
Estava completamente pilhado e Heloísa sentiu em seu coração um desconforto em vê-lo assim. Tudo bem estar com o coração partido mas não queria fazer mal a ele também.
Então o advogado a esposa subir ao colo dele e enlaçar os braços no pescoço dele.
— Diz pra mim. — Ela sussurrou. O sotaque carioca o ganhava em poucos segundos. Ele finalmente parou com a inquietação e respirou relaxado pelo contato dela com o corpo dele.
— Não gostei que o cara tentou te beijar. Você devia ter me contado e..
— Você teria me contado sobre a Juliana se não tivesse sido pego?
Ele bufou.
Merda.
Tinha razão.— Vamos fazer um combinado de agora em diante? Quando acontecer de novo, a gente conta um pro outro. — A delegada sugeriu.
— Não é pra acontecer de novo. — Ele a encarou.
— Sim. Só.. To falando hipoteticamente. Obrigada por tirar ela do seu setor. — Heloísa agradeceu com dificuldade. — Isso ajudou muito.
— De nada. — Ele suspirou. — Era o mínimo que eu poderia fazer. Posso fazer mais alguma coisa pra gente ficar bem?
— O tempo conserta as coisas, Stenio. — Ela murmurou. — O tempo vai passar e logo a gente supera. A gente já superou tanta coisa. — Ela deu de ombros ignorando toda sua dor.
Ela tentou sair do colo dele, mas Stenio apertou a cintura com força.
— Não deixa ninguém te beijar. — Ele pediu. — Nunca. Nem abrir sequer um botão. — Implorou.
Heloísa riu baixo.
— Você ainda tá pensando nisso?
— Sim. Quantos botões ele conseguiu abrir?
Heloísa sentia o coração dele acelerado, pois estava com a mão descansando em seu peitoral.
— Uns três. Deixa isso pra lá, Stenio. Já passou. — Ela pediu.
Ele assentiu, ainda emburrado.
— Eu só.. Quero consertar tudo. Me diz o que mais eu posso fazer pra gente ficar bem. — Soava agoniado.
Heloísa deu um suspiro e olhou para baixo, mexendo na aliança.
— Não tem o que fazer, Stenio. — Ela deu de ombros, não olhava para ele. Sentia a lágrima escorrer. — Você não tem noção de como doeu perceber que sua cabeça, seu coração.. estavam em outro lugar. Achar que eu ia te perder.. Da uma coisa ruim assim que eu não sei por em palavras. — Heloísa passou a mão pelo peitoral tentando explicar que sentia dor física em seu coração.
— Mas eu amo você. — Ele fazia questão de repetir.
— Eu sei disso. Mas ela te encantou. E ela ter tido sequer um segundo da sua atenção me dói. — Ela admitiu e finalmente olhou para ele.
Stenio congelou e ficou com as mãos na coxa dela, ouvindo.
— Não tem mais o que fazer, o tempo cura tudo. Eu só não consigo fingir que eu não tô machucada agora, porque eu estou. Muito.
Stenio assentiu.
— Eu tento amenizar pensando que o mesmo já aconteceu comigo, mas mesmo assim fico enciumada. Mesmo assim, sinto uma insegurança sabe? Uma coisa ruim. Como se a qualquer momento você pudesse conhecer o amor da sua vida e essa pudesse não ser eu.
Stenio riu leve secando as lágrimas dela com o polegar.
— Eu vou te amar muito, até você mudar de ideia e se lembrar de que o amor da minha vida foi você, é você e não tem jeito de ser outra pessoa senão você. Que essas coisas que aconteceram com a gente foram distrações.. Porque somos opostos em certas coisas e em certos momentos ficamos com raiva. Mas quando a gente tem algo em comum.. É mais forte do que qualquer outra coisa.
Heloísa suspirou, se recuperando do choro.
— Me deixa te amar? — Ele perguntou num sussurro, aproximando o rosto ao dela. Roçou os narizes, ameaçando beijar a boca dela, mas nunca o fazia. — Te cuidar, te mimar. Te dar flores, chocolates. Te levar pros nossos encontros surpresas como eu sempre fiz. Eu vou te amar até você não aguentar mais e reclamar: "chega Stenio, eu já entendi que você é só meu agora sai do meu pé!"
Ela deu uma risadinha fraca em meio as lágrimas que escorriam.
Ela falaria assim mesmo.— Queria que tivesse um jeito de você prometer que nunca mais vai se apaixonar por outra pessoa, por mais que eu seja brava e que a gente brigue e que nosso casamento dê errado.. Às vezes.
— Amor, a gente já fez essa promessa. Quantas vezes nos separamos e quantas vezes voltamos um pro outro? Você já namorou outros homens, eu já namorei outras mulheres. Você já pensou estar apaixonada por outra pessoa enquanto estava casada comigo, eu fiz o mesmo. E no final de tudo olha só pra gente. — Stenio fez um gesto mostrando ao redor. — No final das contas é sempre eu e você nesse quarto. E é só isso que importa. — Ele explicou como se fosse simples.
Heloísa respirou fundo, assentindo.
— Deixa eu te amar? — Ele perguntou num sussurro fazendo carinho no pescoço dela.
Heloísa fechou os olhos com o toque, se deliciando com o carinho depois de tanto tempo.
— Diz sim pra mim, amor. — Ele sussurrou dando selinhos nos lábios dela, os quais ela demorou para corresponder.
Algumas lágrimas ainda escapavam dos olhos de sua esposa, mesmo que estivesse com os olhos fechados, ele pôde notar.
Insistiu, no entanto, entrando com os dedos pelo cabelo da nuca dela, aprofundando o beijo.
Ao qual ela correspondeu com intensidade.